
Pernambuco, Maranhão e Alagoas foram os estados nordestinos que tiveram alta nas exportações de carne bovina nos primeiros dois meses de 2025, segundo aponta análise elaborada pelo Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (Etene), do Banco do Nordeste (BNB). Em um cenário aquecido, o agronegócio no Nordeste tem perspectiva de manter o crescimento das exportações ao longo do ano, que pode ser favorecido pela gripe aviária que ronda o mercado em decorrência dos embargos às exportações brasileiras.
Segundo a publicação Caderno Setorial Carne Bovina, a Bahia liderou o volume exportado, com 1.574,76 toneladas, um crescimento de 66,23% em relação ao mesmo período de 2024. Pernambuco apresentou o maior crescimento proporcional, com aumento de 375,85%, passando de 13,6 toneladas para 64,6 toneladas. O Maranhão ampliou os embarques em 91,28%, com 40 toneladas no período, enquanto Alagoas teve incremento de 30%, com exportações de 4,3 toneladas, arrecadando US$ 34 mil.
O Nordeste obteve aumento de 65,51% nas vendas da carne bovina e de 77,88% nos valores das exportações. O comércio exterior da região para esse produto acontece com 49 países, a maior parte na América do Sul, principalmente Uruguai, e para a Ásia, com destaque para Hong Kong.
Segundo Luciano Ximenes, doutor em Zootecnia e um dos responsáveis pela elaboração da análise, a geografia da produção de insumos importantes para a atividade, como o milho e a soja, contribui significativamente com a produção de proteína animal no Nordeste.
“No caso da pecuária bovina de corte, houve melhora da competitividade na terminação, por exemplo. Da mesma forma, com relativas condições climáticas favoráveis em 2023 e 2024, a oferta de carne aumentou notadamente”, avaliou.
Segundo Kamilla Ribas, Zootecnista e gerente de Produtos e Serviços do Etene – ela também assina a análise com Luciano – Pernambuco tem crescido expressivamente nas exportações devido a presença e habilitação de plantas frigoríficas para exportação. “Existe uma estrutura montada que vem crescendo. Então, pontualmente houve a expansão dos abates no estado de Pernambuco pela habilitação de plantas frigoríficas e estruturação dessa cadeia voltada para exportação, que está focada num produto diferenciado que atende o mercado internacional”, explicou.

O Maranhão conseguiu aumentar suas exportações por uma combinação de fatores. O estado está em uma região estratégica próxima da pré amazônia e inserido no MATOPIBA, que favorece o acesso a grãos para alimentação do rebanho. Há ainda um esforço do governo estadual em realizar uma verticalização da cadeia produtiva, que tem contribuído para profissionalizar a produção e favorecer o fluxo de produção.
“Então o Maranhão tem reserva de alimento, facilidade mesmo em períodos intermitentes de seca, e como eles têm boi verde, a maior parte boi verde, que é um produto que é muito competitivo no mercado exterior por causa do custo de produção que é mais baixo, isso facilita as exportações porque a carne sai com preço competitivo”, explicou.
A Bahia segundo destaca Kamilla, é o estado que, tradicionalmente, possui a maior produção de carne da região, o maior abate de cabeças e lidera as exportações e as ações de melhoramento genético de rebanho. “Os outros estados que estamos analisando aqui vem se destacando, avançando no engajamento do setor produtivo de carne bovina. Então, é muito interessante a gente apoiar, a gente dar importância a esse esforço para que todos os estados possam progredir em relação à sua capacidade produtiva e à sua contribuição econômica”, completou.
O Brasil, conforme análise do Etene, se solidificou como uma potência global no setor de agronegócio. Mesmo enfrentando desafios como déficits de infraestrutura, mudanças climáticas e complexidades regulatórias, os recursos naturais e as tecnologias agrícolas avançadas empregadas na pecuária têm oferecido oportunidade de crescimento para o setor. Isso contribui para o país ter uma vantagem competitiva tanto em eficiência de produção quanto em escala.
Segundo Kamilla, as fêmeas e bezerros, possuem papel importante neste ciclo positivo do agronegócio nordestino. Houve um crescimento no abate de fêmeas e baixos preços dos bezerros entre 2021 e 2024.
De acordo com os últimos dados disponibilizados pelo IBGE para 2025, o abate de fêmeas no quarto trimestre de 2024 começou a declinar -9,82% em relação ao terceiro trimestre do ano passado. Ela chama atenção também para os investimentos em Alagoas em melhoramento genético, o que tem feito do estado uma referência em inseminação artificial, o que contribui com a produtividade e eficiência na produção pecuária.

“Com a liquidação do estoque de fêmeas, a oferta de bezerros está pressionada e o bezerro segue valorizado no mercado. Quem está neste mercado de reposição estão em boa fase. Por outro lado, mesmo com pequenas oscilações, o preço da arroba está valorizado, o que estimula a exportação”, destacou Kamilla.
O estudo do Etene cita ainda projeções do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), que considerando um novo ciclo, os produtores provavelmente começarão a reter animais do mercado, elevando os preços dos bezerros. As exportações de carne bovina deverão crescer neste ano, impulsionados pela forte demanda externa, pelo Real em queda e por desafios enfrentados pelos concorrentes estrangeiros.
Por outro lado, de acordo com a avaliação do USDA, o consumo doméstico deverá diminuir em 2% em relação a 2024, baseado na redução da disponibilidade de carne bovina no mercado interno, em consequência do início previsto da reversão do ciclo pecuário, da priorização das exportações e da piora no cenário doméstico devido ao aumento da inflação sobre as carnes.
Investimentos da Masterboi impulsionam exportações do NE
O diretor de comércio exterior da Masterboi, Márcio Rodrigues, avalia que o Nordeste manterá o crescimento das exportações.
“Um dos requisitos básicos para poder comercializar carne com outros países é o frigorífico ter o selo de inspeção federal e nossa planta inaugurada em 2022 em Pernambuco já estava certificada desde o início. É natural vermos este crescimento exponencial das exportações nos primeiros anos de atuação, pois saímos do zero para alcançar os números que temos hoje. Mas ainda existe muito espaço para crescer no mercado internacional, já que no ano passado apenas 7,4% da nossa produção foi exportada e este ano já foram 18,63%, ainda abaixo da média nacional de 27%. Boa parte da produção pernambucana abasteceu o mercado interno”, explicou Márcio.

A Masterboi também ampliou os mercados compradores da carne bovina de Pernambuco. Em 2023 foram cinco países, no ano seguinte foram 14 e este ano já são 16. Entre os principais países para onde a carne é exportada estão Cingapura, Filipinas, Azerbaijão, Angola, Bahamas, Costa do Marfim, Gana, Uzbequistão, Líbia, Coreia do Sul e Israel.
“Desde antes da inauguração da planta em Pernambuco a Masterboi já trabalhava no desenvolvimento da pecuária nos estados vizinhos a Pernambuco, onde também já atuamos, para fomentar entre os produtores segurança e demonstrar que a empresa oferece um ambiente ideal para ele abater sua produção e conseguir vender no mercado. A Masterboi tem como estratégia ampliar sua presença no mercado interno e externo”, destacou.
Rodrigues avalia ainda que as novas certificações que o Brasil deve receber, a exemplo de ser considerado zona livre da aftosa em necessidade de vacinas, vão oferecer mais oportunidade para que a carne bovina brasileira chegue a cada vez mais mercados internacionais.

Financiamentos para pecuária crescem no Nordeste
Entre 2018 e 2024, o Banco do Nordeste investiu quase R$ 20,32 bilhões na bovinocultura de corte, sendo R$ 5,73 bilhões apenas em 2024. O Maranhão, a Bahia e Minas Gerais lideraram as contratações, com participações de 29,07%, 23,60% e 13,94%, respectivamente, no total dos investimentos do setor.
Segundo dados do BNB, Alagoas apresentou um crescimento de 33% nos financiamentos voltados para a atividade pecuária. De acordo com o superintendente estadual do BNB em Alagoas, Sidinei Reis, o estado vem se desenvolvendo na pecuária de corte e conta com o apoio do banco com o crédito para impulsionar o setor.
“A demanda por financiamentos para a atividade vem crescendo no estado, o que demonstra o interesse por mais investimentos voltados à bovinocultura de corte em Alagoas. Ano passado, foram R$ 303 milhões em créditos para o segmento contratados com o BNB, um aumento de 33% em relação a 2023. Esses recursos foram destinados a mais de 14 mil operações de crédito, contra 8 mil realizadas no ano anterior”, afirmou Reis.
Gripe aviária vai impactar exportações bovinas e mercado interno?
Kamilla e Luciano avaliam com cautela o cenário de exportações da carne bovina nordestina e os reflexos de preços no mercado interno, decorrente dos possíveis impactos que os casos de gripe aviária em investigação no Brasil podem causar.
Atualmente, o país tem dois casos confirmados e seis sob investigação, sendo que duas ocorrências foram em granjas comerciais, no Rio Grande do Sul.
Segundo avaliação de Luciano Ximenes, o comércio global de carnes está diante de um cenário complexo, com destaque para os focos de gripe aviária, incluindo as situações doméstica e norte-americana.
Outros fatores como a baixa volatilidade das moedas brasileiras e americanas no país, a manutenção da taxa Selic no patamar de 14,75% por um período mais longo, com possibilidade de aumento de 0,25%, e questões geopolíticas podem impactar de forma positiva ou negativa o comércio internacional de carnes do Brasil.

“De um lado temos um importante concorrente e de outro o principal destino das comodities. Apesar disso, o contexto da nova política de tarifas dos EUA ainda não permite um posicionamento acurado, com vistas à pressão inflacionária, a possível retração da atividade de 2,6% em 2024 para 1,0% em 2025 e, assim, sobre a magnitude de suas exportações. A China estima discreta variação trimestral do PIB de 5,4% (2024) para 4,7% (2025), então a ressalva é em relação a duração do embargo chinês”, avaliou Ximenes.
Kamilla alerta que, apesar dos embargos à carne de frango brasileira imposta por outros países por conta dos casos sob investigação de gripe aviária, uma diminuição dos preços no mercado interno e uma competividade com a carne bovina precisa ser analisado com cautela, já que a tendência, neste primeiro momento, é de ocorrer estoque do produto, devido a uma capacidade do mercado produtor brasileiro.
“Se a gripe aviária realmente for controlada no prazo que o Ministério da Agricultura deseja e trabalha para isso, provavelmente o excedente será pequeno. E esse consumo a gente sentirá isso de uma maneira muito suave. Agora se a gripe crescer no país, aí teremos que trabalhar com um controle de mitigação mais demorado, então neste cenário os embargos irão perdurar por mais tempo e com estoques excedentes, o mercado interno acabará abarcando todo esse produto”, analisou.
“Então, nesse caso, a gente vai perceber de maneira mais moderada a competição com a carne bovina, porque a carne de frango é mais competitiva, ela é um produto mais barato, mais acessível e isso realmente vai se instalar de uma forma natural. Mas isso a gente precisa guardar para entendermos como que serão os desdobramentos da gripe aviária aqui no país”, completou Kamilla.
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