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A nova realidade econômica da América Latina e seus reflexos para o Brasil

Bruno Nespoli Damasceno* Se há algo certo no cenário econômico atual, é a incerteza. Em 2024, o índice global de Incerteza na Política Comercial (Trade Policy Uncertainty – TPU) mais do que dobrou, passando de 71,5 no primeiro trimestre para 237,4 no final do ano. O aumento reflete a intensificação das tensões geopolíticas, revisões de acordos comerciais e […]
Bruno

Bruno Nespoli Damasceno*

Se há algo certo no cenário econômico atual, é a incerteza. Em 2024, o índice global de Incerteza na Política Comercial (Trade Policy Uncertainty – TPU) mais do que dobrou, passando de 71,5 no primeiro trimestre para 237,4 no final do ano. O aumento reflete a intensificação das tensões geopolíticas, revisões de acordos comerciais e avanços de políticas protecionistas, que afetam cadeias produtivas em escala global.

Fontes: Baker, Bloom, e Davis 2016; Caldara e outros 2020; Refinitiv Eikon; e cálculos do time FMI. Nota: As medidas de incerteza são calculadas com base na frequência de notícias que abordam determinado tema, sendo que um valor de 100 corresponde a 1% dos artigos que fazem referência ao problema. No painel 1, os dados da área do euro e o restante do mundo são baseados em indicadores extraídos de reuniões com investidores (earnings calls), representando a proporção de empresas que mencionam a incerteza da política comercial (TPU) nesses encontros. Essa medida reflete as preocupações das empresas em relação à TPU, com base no dicionário desenvolvido por Caldara e outros (2020, https://doi.org/10.1016/j.jmoneco.2019.11.002). O termo ‘Resto do Mundo (%)´ abrange 22 países, incluindo os EUA.

A América Latina não está imune a esse fenômeno. Pelo contrário, a região enfrenta uma dupla incerteza: além do ambiente externo volátil, há desafios estruturais internos, incluindo dificuldades na integração econômica e na coordenação de políticas entre os países. O Mercosul, que já teve o potencial de ser um bloco econômico mais forte, perdeu espaço na agenda política, deixando um vácuo na evolução da cooperação regional.

Crescimento Econômico Ainda Abaixo da Média Global

O crescimento da América Latina segue abaixo da média global. Enquanto a economia mundial deve avançar 3,2% em 2025, a América Latina e o Caribe têm uma projeção de apenas 2,1%. O Brasil apresenta um ritmo um pouco melhor, com estimativa de 2,2%, mas outras economias relevantes, como o México, devem estagnar (0,0%), enquanto Chile e Colômbia avançam lentamente.

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PIB (%)202320242025 (projeção)
Mundo3,2%3,2%3,2%
EUA2,9%2,8%2,0%
Zona do Euro0,4%0,8%0,8%
China5,2%5,0%4,5%
América Latina e Caribe2,2%2,3%2,1%
Brasil3,2%3,4%2,2%
Argentina-1,6%-1,8%4,5%
México3,3%1,5%0,0%
Colômbia0,7%1,7%2,3%
Chile0,2%2,5%2,3%
Peru-0,6%3,3%2,8%
Elaboração feita pelo autor.
Fonte: ItauBBA – Cenário Macro Global (disponibilizado em 17/março/2025)

México e Argentina: dois casos opostos

O impacto dessas incertezas varia entre os países latino-americanos. O México, tradicionalmente apontado como um dos principais beneficiários do nearshoring – processo de relocação da produção para países próximos aos grandes mercados consumidores — deveria estar colhendo os frutos de sua proximidade com os Estados Unidos. No entanto, as incertezas políticas no país vizinho e a desaceleração das exportações levaram a um rebaixamento do PIB mexicano para 0,0% em 2025, demonstrando um enfraquecimento econômico inesperado.

Já a Argentina, historicamente marcada por turbulências econômicas, projeta um crescimento de 4,5% em 2025, impulsionado por um possível acordo com o FMI e pela esperada recuperação dos salários reais. O grande desafio será manter essa trajetória sem novas instabilidades políticas e monetárias nos próximos anos.

O Brasil no meio do tabuleiro

Para o Brasil, o cenário na América Latina traz tanto desafios quanto oportunidades. A região continua sendo um dos principais destinos das exportações brasileiras, especialmente nos setores de manufaturas e bens intermediários. No entanto, o enfraquecimento da demanda mexicana e as oscilações da economia argentina representam riscos para empresas brasileiras com atuação internacional.

Além disso, a falta de avanços significativos na integração regional e na modernização de acordos comerciais limita a competitividade da América Latina como um todo. Diferentemente da Europa, onde as cadeias produtivas são altamente integradas, a região ainda carece de uma infraestrutura de comércio eficiente e de políticas coordenadas entre os países.

O que isso significa para CFOs?

Para os CFOs brasileiros, esse cenário exige uma gestão financeira ainda mais estratégica, com foco em três pilares principais:

  1. Hedge Cambial e Riscos de Crédito:
    • Diante da volatilidade na América Latina, os CFOs devem reforçar políticas de proteção cambial e reavaliar a exposição a clientes e fornecedores na região.
  2. Diversificação e Resiliência na Tesouraria:
    • Estratégias de funding (captação de recursos) precisam levar em conta os riscos políticos e as mudanças nos fluxos de investimento estrangeiro, que podem afetar a liquidez disponível no mercado.
  3. Revisão da Estratégia de Expansão:
    • Empresas que planejam crescer na América Latina devem considerar os riscos regulatórios e de demanda, reavaliando a viabilidade de operações em mercados de maior instabilidade.

Um novo normal para a América Latina

A incerteza comercial global, somada aos desafios internos da América Latina, reforça a necessidade de adaptação e resiliência para as empresas brasileiras que atuam na região. O atraso na integração regional pode ter consequências difíceis de reverter, exigindo uma abordagem cada vez mais estratégica para enfrentar esse cenário.

Se antes a pergunta era “quando” a América Latina se tornaria uma potência econômica integrada, hoje a questão que se impõe é “como” as empresas podem prosperar apesar dos desafios que a região ainda enfrenta.

*Bruno Nespoli Damasceno é Líder da Comissão de Tesouraria e Risco do IBEF-SP (Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças), além de líder de soluções de financiamento na Corteva Agriscience.

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