No Nordeste, setor automotivo sai na frente na corrida pela neoindustrialização

Na neoindustrialização, os fornecedores precisam estar alinhados com a produção de bens com menor impacto ambiental.

Nesta segunda matéria da série O Desafio da Neoindustrialização, o Movimento Econômico mostra como a descarbonização no setor automotivo vai impactar a cadeia produtiva. No Nordeste, a Stellantis e a Baterias Moura avançam na mobilidade que busca emissões zero de CO2. A esse time se juntará a chinesa BYD. Enquanto isso, pesquisadores do IATI se debruçam sobre kits que possam adaptar os carros para o período de transição até os veículos 100% elétricos. Confira.

Stellatins setor automotivo

O parque de fornecedores da Stellantis, em Goiana, atende hoje quase 40% da necessidade da montadora, que completou recentemente oito anos de atividades em Pernambuco, ultrapassando a barreira de 1,5 milhão de veículos produzidos. O índice de produção local ideal desses fornecedores, no entanto, seria entre 60% e 70%. A montadora vem perseguindo esse percentual, mas a eletrificação veicular e o programa setorial Rota 2030 estão batendo na porta para exigir algo a mais: a neoindustrialização da cadeia de produção.

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Por esta razão, a Stellantis iniciou um trabalho de levantamento de fornecedores potenciais para seu novo momento produtivo. O novo ciclo de investimentos, que será anunciado em breve pela montadora para os próximos cinco anos, demandará componentes para carros híbridos a etanol e, numa fase posterior, para os 100% elétricos.

O desafio, portanto, não é só atrair fornecedores, mas encontrá-los no mercado. Na neoindustrialização, os fornecedores precisam estar alinhados com a produção de bens com menor impacto ambiental, ou seja, as indústrias precisam atuar em novas bases. Como tem dito o vice-presidente de República Geraldo Alckmin, que também é Ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, “estamos falando de uma mudança radical de paradigma tecnológico”.

Assim, a indústria brasileira precisará evoluir para entregar o que os novos veículos do futuro vão demandar. Não cabem os mesmos processos de décadas atrás. A indústria terá que entrar na era da descarbonização – em termos de processos e produtos – para estar alinhada com as necessidades das montadoras, e atender às regulações impostas pela Rota 2030. O programa vai entrar em nova fase no próximo ano, trazendo novas metas de eficiência energética e investimentos em tecnologia.

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Plano estratégico

No seu plano estratégico Dare Forward 2030, a Stellantis traçou como meta reduzir suas emissões em até 50% em 2030, tendo em seu mix 20% de carros elétricos no Brasil. Em 2038 a empresa espera ter zerado suas emissões globais. Para isso, tem uma jornada a ser perseguida, partindo dos veículos movidos a etanol, com baixa emissão de carbono, passando pelo híbrido elétrico a etanol até chegar ao 100% elétricos, com emissão zero de CO2.

Neste novo cenário, o processo de neoindustrialização precisa contar com a produção de vários itens. Eletrônicos são os mais proeminentes. São componentes que mesmo hoje em dia não contam com fornecedores locais e em geral são importados. Também haverá necessidade de pequenos estampados para os modernos modelos que virão pela frente, assim como sensores de todos os tipos.

“Nosso índice de localização é o maior dentro das montadoras do País. Mas vai cair, porque o peso desses novos componentes, diante do Marco Regulatório 2030 e das necessidades da eletrificação será muito grande”, analisa Juliano Alex de Almeida, vice-presidente de Compras da Stellantis para América do Sul.

Almeida explica que atualmente, os fornecedores do parque são, em sua grande maioria, fabricantes de estruturas como bancos, painéis, consoles, e suas produções não sofrerão grandes mudanças nesta etapa. Mas os modelos elétricos vão precisar de componentes que ainda não são produzidos no polo, e talvez nem no Brasil, e isso abre muitas oportunidades.

Há, porém, um desafio a ser superado: a escala. Para atrair novos fabricantes será preciso alcançar a produção de pelo menos 200 mil veículos. E para se chegar a esse número, a economia precisa ajudar, permitindo que as pessoas tenham poder de compra.

Novidade regional

Mas, há uma novidade regional que pode ajudar neste processo de neoindustrialização do setor automotivo regional: a chegada da montadora chinesa BYD ao polo de Camaçari, na Bahia. A empresa asiática vai produzir carros elétricos e deve seguir uma jornada semelhante à da Stellantis, começando pelos híbridos a etanol, como revelou ao Movimento Econômico, Alexandre Baldy de Sant’Anna Braga, chairman no Conselho de Administração da BYD.

“A BYD vai contribuir para potencializarmos novos parceiros locais, ajudando a diluir os seus custos, já que será possível alcançar um volume de produção que justifique o investimento”, analisa vice-presidente de Compras da Stellantis.

Montadora chinesa BYD é aposta da Bahia para virar a página da Ford

E as conversas entre as duas montadoras já começaram, ainda que timidamente. “O mais importante é que os fornecedores estejam na região Nordeste. Porque atualmente trazemos peças do Sudeste por rodovias e, infelizmente, nossas rodovias não oferecem qualidade e segurança”, reflete Almeida, quando questionado se a BYD não poderia atrair parceiros que interessam estar no Supplier Park da Stellantis.

Movimento dos fornecedores

Mas como o mercado está se preparando para esse momento da indústria automotiva? A Moura Baterias, empresa global com sede em belo jardim (PE), integra um restrito time de indústrias brasileiras que andam na mesma velocidade das montadoras na direção da descarbonização. Mesmo assim, o empresário Paulo Sales, presidente executivo do Grupo Moura, entende que o governo precisa estimular a indústria a se atualizar, eliminando o risco de o Brasil se tornar um importador de carros elétricos. “Toda grande mudança de paradigmas, ainda mais no Brasil, que tem enorme dificuldade de financiamento, que convive com problemas de equacionamento fiscal, deixa o empresário temeroso de investir”, ressalta Paulo Sales.

Ele lembra que na Europa e na China houve estímulo ao consumo do carro elétrico. “E eles avançaram muito por lá. O Brasil também precisa de incentivos para o consumo e para achar a tecnologia certa. Não podemos ficar perdendo tempo e não tomar o rumo. Se a solução para o país é o carro híbrido a álcool, vamos avançar nisso, botar todas as fichas e fazer disso um diferencial do Brasil, como foi, na época, com o Proálcool”, disse Sales.

Paulo Sales
Paulo Sales, Grupo Moura

A Moura já fornece módulos de baterias de lítio para a Volkswagen Caminhões e Ônibus, para o caminhão e-Delivery, o primeiro veículo 100% elétrico projetado e produzido no País, lançado em 2021 e vem em entendimento com outros fabricantes para participar do desenvolvimento de modelos eletrificados que deverão ser produzidos no País.

O Luciano Tavares, coordenador de projetos do Instituto Avançado de Tecnologia e Inovação (IATI), com sede em Recife, também concorda com a necessidade de o governo dar estímulos. O entendimento no IATI é que no período de transição, é preciso se voltar para duas vertentes: a infraestrutura para anteder aos carros elétricos e a evolução dos veículos em si. Assim, essas são as linhas de pesquisa em curso na instituição.

“Na plena eletrificação, o consumo médio de energia das famílias vai subir 60% com os veículos elétricos. O setor elétrico precisa estar preparado para essa forte alta na demanda”, explica o coordenador de projetos do IATI.

IATI
Laboratório H2-IATI onde se desenvolvem kit para conversão veícular

Segundo Tavares, o IATI vem desenvolvendo pesquisas, que estão em estágios muito avançados, para criação de kits de conversão veicular. A ideia é atender ao período de transição entre os carros a combustão e 100% elétricos, criando um veículo híbrido a hidrogênio.

“Criamos um módulo que pode ser adicionado aos motores para aumentar a sua eficiência, reduzindo as emissões de CO2. Um carro híbrido a hidrogênio”, explica. Neste modelo, a energia do motor é usada para produzir hidrogênio através do processo de eletrólise. A solução aumenta em 14% a eficiência do motor e reduz os gases do efeito estufa em 10%.

 “Nossa preocupação é com o aspecto econômico. Entendemos que será necessário estímulo governamental para a população brasileira comprar carros elétricos e o Brasil bater sua meta de descarbonização. Até lá, haverá espaço para o surgimento de muitos kits como esses”, analisa Tavares.

Leia a série completa O Desafio da Neoindustrialização:

Neoindustrialização do Brasil vai passar pela energia renovável do Nordeste

No Nordeste, setor automotivo sai na frente na corrida pela neoindustrialização

Neoindustrialização abre passagem para o verde

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