Etiene Ramos
A próxima temporada de plantio do cará no Agreste de Pernambuco, que começa a ser preparado em julho, já preocupa os pecuaristas. Eles esperam uma maior mobilização das autoridades para coibir o uso irregular da cama de aviário na adubação. O resíduo da avicultura é apontado como a causa dos surtos da mosca dos estábulos, que tem atacado rebanhos e se proliferado na zona rural de vários municípios do Agreste. A situação está perdendo o controle e, em algumas localidades, a masca tem chegado à zona urbana em grande volume e prejudicado o funcionamento de negócios, como bares e restaurantes.
A Agência de Defesa e Fiscalização Agropecuária de Pernambuco – Adagro, responsável pela certificação da produção no campo, orienta, fiscaliza e aplica multas em casos de irregularidades que podem chegar a R$ 62.240,14. Propriedades que, culposa ou dolosamente, contribuem para a disseminação de doenças que causam danos a atividades econômicas podem ser multadas com este valor. Porém, a conscientização sobre esta e outras multas ainda é limitada.
No ano passado, segundo a Adagro, órgão da secretaria de Desenvolvimento Agrário de Pernambuco, foram vistoriadas 54 propriedades nos nove municípios da região do Brejo pernambucano, onde há alta incidência da mosca dos estábulos, e cerca de 20% delas foram notificadas, principalmente no período do pico da infestação no segundo semestre.
“O problema da mosca dos estábulos não se resume ao momento do agricultor no campo, vem do processo de criação das galinhas de corte e poedeiras. Estamos fiscalizando granjas que são obrigadas a ter registro na Adagro. Nossos fiscais verificam se o tratamento sanitário da cama de aviário está sendo realizado antes do transporte que só pode ser feito com a documentação assinada pelo responsável técnico da propriedade. Em caso de irregularidades, elas são notificadas e é aberto um processo na Adagro”, afirma o presidente da entidade, Paulo Roberto Lima.
Na semana passada, o Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA), definiu para abril o início de uma pesquisa que será coordenada pela Secretaria de Desenvolvimento Agrário do Estado, com apoio de pecuaristas e avicultores para descobrir as causas dos surtos da mosca dos estábulos na região. “São várias possibilidades. Temos produtores de banana que também usam cama de aviário como adubo em São Vicente Férrer e Macaparana e precisamos entender a situação geral”, relata Lima.
Mais responsabilidade sobre a cama de aviário pode ser solução
Para o pecuarista Celso Muniz Filho, dono da Fazenda Várzea Alegre, na cidade de Barra de Guabiraba -maior produtora de cará de Pernambuco, as equipes de campo da Adagro estão empenhadas em resolver ou conter a infestação, orientando os agricultores a cobrirem bem a cama de aviário com terra – prática que minimiza o problema. Porém, segundo ele, a infraestrutura de fiscalização é precária, com restrições de equipamentos e até combustível. “Os fiscais são muito prestigiosos, têm boa vontade, mas deveriam ter acompanhamento policial nas vistorias”, sugere e lamenta falta de sensibilidade em relação aos prejuízos dos criadores e à economia local, desde 2015.
“Já perdi cerca de 300 bois e dez cavalos manga-larga marchador. Tinha planejado instalar um laticínio na fazenda mas tive que desistir por causa da mosca, estou só com gado de corte”, relata Muniz Filho, na expectativa de mais colaboração da Associação dos Avicultores de Pernambuco (Avipe) para a solução do problema. “Já conversamos com a Avipe mas eles não acreditam que são os causadores. Dizem que a mosca dos estábulos já estava na região. Mas porque ela só incomoda no período em que a cama de galinha está sendo usada no plantio do cará, banana e maracujá? Precisamos de uma resposta do governo. Não se pode mais postergar a pesquisa”, reforça.
O diretor jurídico da Avipe e vereador do Recife, Samuel Salazar, afirma que a entidade é parceira da busca pela solução e participou de um encontro promovido pela União Nordestina dos Agropecuaristas (UNA) com o IPA, Adagro, Universidade Federal Rural de Pernambuco e Ministério da Agricultura, no final de outubro de 2021, em Barra de Guabiraba para discutir a infestação da mosca dos estábulos.
“Foi num fim de semana logo após a audiência pública na Assembleia Legislativa de Pernambuco para debater o problema da mosca e a conclusão foi realizar o estudo. Oferecemos um computador e estamos contribuindo, somos parceiros”, declara Salazar, garantindo que todos os associados da Avipe cumprem a legislação. “Sempre fazemos cobranças aos nossos associados e não tenho a menor dúvida que as regras sanitárias estão sendo cumpridas. Mas sabemos que a falta de tratamento correto da terra e do armazenamento da cama de aviário geram a mosca”, observa, destacando a responsabilidade do plantador.
O problema pode estar na relação entre os grandes abatedouros avícolas, chamadas de integradores, quando terceirizam a criação de frangos para pequenas granjas, os integrados, que não fazem a esterilização da cama de aviário antes de vendê-la como adubo – em muitos casos por falta de dinheiro. “Existe uma corresponsabilidade legal nesta relação e o integrador pode estar deixando o tratamento e descarte do resíduo só para o integrado. Mas esse limão pode virar uma limonada. O tratamento é caro e algumas avícolas de porte de outros estados fizeram locais para a esterilização da cama de aviário que vem dos terceirizados, criando um novo nicho de negócio”, aponta o pecuarista, com o olhar de empresário que busca uma alternativa para solucionar o problema econômico e ambiental da mosca dos estábulos.
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