Os juízes do Tribunal Distrital de Roterdã, na Holanda, definiram o dia 21 de setembro de 2022 para anunciar se o processo contra a Braskem será julgado naquele país. A decisão saiu hoje, após quatro horas e meia de audiência, que contou com depoimentos de três moradores de Maceió (AL) que foram ao tribunal holandês. Eles e outros 55 mil habitantes foram removidos de suas casas, danificadas por conta da mineração de sal-gema feita pela Braskem.
A ação pleiteia indenizações integrais pelos danos morais e materiais sofridos, e é movida pelo escritório de advocacia internacional PGMBM em parceria com os escritórios brasileiros Araújo Advogados Associados e Omena Advocacia. Os moradores saíram otimistas da audiência realizada na manhã desta terça-feira.
A expectativa é de um processo judicial mais rápido e compensações mais justas aos atingidos se a jurisdição holandesa for aceita. “No Brasil, a Braskem oferece indenizações por danos morais de valor fixo por núcleo familiar e não para cada indivíduo afetado”, diz Martins. Para ele, a Braskem não assume sua responsabilidade pelo desastre. “Este é mais um caso de grandes empresas que não têm consideração pelas pessoas que vivem nos locais onde suas atividades são desenvolvidas, nem pelo meio ambiente, que está sendo prejudicado”, afirma.
Única esperança para moradores
A situação enfrentada pelos moradores de Maceió é considerada pelo Observatório da Mineração como “o maior desastre geológico em área urbana em andamento” no mundo”. Em maio de 2019, relatório produzido pelo Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil responsabilizou a mineração de sal-gema feita pela petroquímica (controlada pelo grupo baiano Odebrecht, agora “Novonor”) pelos danos à integridade estrutural de propriedades na capital alagoana.
Em consequência da mineração de sal-gema, bairros inteiros de Maceió foram destruídos e forçaram mais de 55 mil pessoas a deixarem suas residências. Representantes dos atingidos pelo desastre ambiental acompanharam a audiência em Rotterdam. Para os moradores que movem a ação contra a empresa, levar o caso àquele país é um caminho para se obter justiça.
Emoção
José Fernando Lima Silva, 58 anos, é proprietário de uma empresa provedora de internet que atendia residentes do Bairro Bom Parto, que faz parte da área afetada pelo colapso das minas. “O desastre causou a perda de 60% dos meus clientes. Perdi renda e lucro. Eu agora tenho uma ansiedade muito grande e problemas para dormir devido à incerteza de saber se serei capaz de manter meu negócio, pagar meus funcionários e continuar a pagar minhas contas.”, afirma. “Até hoje eu tenho muito medo de um novo desastre acontecer, já que eu ainda vivo no bairro Bom Parto. Se eu ouço um barulho, eu fico com medo. Eu não vejo nenhuma solução justa oferecida pela Braskem, até agora, para os danos que causou ao meu negócio e para toda a comunidade. Além disso, o valor oferecido por eles é inaceitável.”
Maria Rosângela Ferreira da Silva, 58, nascida e criada no bairro Pinheiro, relatou os graves impactos a sua saúde causados pelo desastre. “Eu tenho alguns problemas de saúde. Antes eu tinha fácil acesso aos postos de atendimento e hospitais onde eu morava, o que não é mais uma realidade, porque onde eu moro hoje, após ser forçada a sair da minha antiga casa, é longe de tudo. Eu perdi contato com vários amigos do bairro Pinheiro, onde nós costumávamos viver como uma comunidade. O dano causado pela Braskem também afetou minha saúde mental. Logo depois dos primeiros tremores, eu estava em pânico e comecei a morar com outros familiares. Nós revezávamos turnos dormindo, com medo de que a terra fosse afundar a qualquer momento e nós teríamos de fugir. Hoje ainda vivo com ansiedade, não consigo dormir e estou constantemente com medo de que algo similar aconteça novamente.”
José Ricardo Batista, 56, líder comunitário da associação de bairro da Gruta do Padre, ressaltou para a corte que os danos vão muito além dos materiais: “Eu era respeitado e conhecia todo mundo lá, mas a Braskem tirou tudo isso de mim, já que agora meu único envolvimento com a comunidade é para lidar com os problemas causados pelo desastre. Eu perdi contato com meus velhos amigos e vizinhos, que eram como uma família. Eu também fiquei muito triste em descobrir que a casa da minha finada mãe, que era no local do acidente, não existe mais. Eu perdi todas as memórias da minha família com a casa. Por causa da Braskem, fui forçado a mudar para outra casa e outro bairro e agora vivo num lugar onde eu não me sinto feliz ou seguro. Devido a tudo que eu tive de suportar, hoje eu sou uma pessoa ansiosa e temerosa, com minha saúde física e mental deteriorada. A Braskem também destruiu minha família; minha esposa, por causa do desastre, passou a sofrer de problemas mentais severos e ver o sofrimento dela me afetou profundamente. Minha vida nunca mais vai ser a mesma novamente e a quantia oferecida pela Braskem a título de indenização é desrespeitosa a mim e à minha família”.
Leia mais: Audiência do caso Braskem acontece hoje na Holanda para decidir jurisdição do processo