Valdeci Monteiro: Nordeste 2022 – Guerra traz mais incertezas às expectativas de retomada

Valdeci Monteiro dos Santos* No ano de 2021 o Brasil registrou, segundo o IBGE, um crescimento de 4,6%, o melhor resultado desde 2010, quando a economia havia crescido 7,5%. No entanto, os analistas apontam que este desempenho ocorreu, em grande medida, devido à forte retração de -4,1% apresentada na economia em 2020, por conta dos […]
Etiene Ramos
Etiene Ramos
Jornalista

Valdeci Monteiro dos Santos*

No ano de 2021 o Brasil registrou, segundo o IBGE, um crescimento de 4,6%, o melhor resultado desde 2010, quando a economia havia crescido 7,5%. No entanto, os analistas apontam que este desempenho ocorreu, em grande medida, devido à forte retração de -4,1% apresentada na economia em 2020, por conta dos efeitos da pandemia da Covid-19.

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Valdeci Monteiro dos Santos, economista

Os economistas do Itaú, em nota lançada em fevereiro deste ano, projetaram uma ligeira contração do PIB em 2022, de -0,5%, e o consenso de mercado, apesar de mais otimista, nas análises do começo do ano, não foram além de 1,0%. A desaceleração prevista em relação a 2021, segundo os analistas, deve decorrer basicamente pelos efeitos do aperto monetário em curso, que apontam para elevação inflacionária e da taxa de juros, em contexto de crescimento global mais lento.

O advento da guerra da Rússia com a Ucrânia traz novos ingredientes para um ano difícil, e já  preconiza na economia brasileira  efeitos, como: (i) perspectiva de ampliação da inflação esperada, entre outros fatores, pelo aumento do preço dos combustíveis (e crescente risco de desancoragem das expectativas de inflação); (ii) maior taxa de juros, que deve retrair mais compras, por exemplo, de bens duráveis, e elevar níveis de endividamento de empresas e famílias; (iii) retração do nível de atividade esperado, com consequente tensão no nível de emprego; (iv) efeitos negativos, em especial nas importações (Rússia ocupa o sexto lugar no ranking dos países que importamos mais); e (v) maior incerteza quanto aos rumos gerais da economia mundial levando à dificuldade de visualizar as grandes tendências dos principais preços da economia.

Impactos para o Nordeste em 2022

E como podemos avaliar os impactos deste novo contexto de tensão na economia mundial para o Nordeste, sobretudo pensando em 2022?

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O Nordeste, da mesma forma que as demais regiões do país, também será afetado, sobretudo, pelas repercussões da guerra sobre a macroeconomia brasileira, como já foi citado anteriormente.

Considerando, por sua vez, as especificidades da economia regional, pode-se especular alguns outros possíveis efeitos do conflito.

Em termos setoriais, a atividade industrial nordestina, tende a acentuar o quadro recente de baixo dinamismo.  Segundo o boletim regional do Banco Central (fevereiro/2022), em 2021, a indústria do Nordeste registrou retração de 6,5% frente a expansão de 3,9% da atividade fabril do país. Mesmo considerando recuperação nos dois últimos trimestres (Pesquisa Industrial Mensal, PIM-IBGE), no quarto trimestre de 2021, apenas cinco das 15 atividades pesquisadas apresentaram crescimento, sobretudo influenciado pela recuperação do refino de petróleo.  

Vale lembrar que uma importante montadora foi desativada ano passado, na Bahia. Assim, é possível prever em 2022 mais dificuldades para o setor industrial regional no contexto da guerra, onde, além do já mencionado efeito de retração geral da economia, devem ocorrer pressões de preços de insumos importados.

O setor terciário que sinalizava recuperação em 2022 com o avanço da vacinação – especialmente em atividades que estavam significativamente deprimidas como os serviços prestados às famílias e o turismo – deve crescer num ritmo menor que o previsto. Além disso, é importante lembrar que o mercado de trabalho regional ainda está aquém do contexto pré-pandemia, tanto no que se refere à massa de rendimento do trabalho quanto à taxa de desocupação, segundo o IBGE.

Já o setor primário, que já sinalizava um desempenho melhor em 2022 da produção, deve ser beneficiado com um provável aumento das exportações, sobretudo de grãos, cuja previsão era de um incremento de 5,8% em relação à safra de 2021, segundo o Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA-IBGE), considerando, entre outros fatores, a tendência ao aumento dos preços das commodities. Mas a Agropecuária deve sentir efeitos negativos no aumento do preço dos fertilizantes.

No comércio exterior, a hipótese é que o Nordeste deva vivenciar este ano um curioso contexto: em que, de um lado, as exportações podem crescer mais que os 31,4% verificados em 2021, levando em conta, como referido anteriormente, o provável aumento das exportações de grãos. Do lado das importações, há uma tendência a aumentar ainda mais o valor importado, que no ano passado já vinha apresentando elevado crescimento (62,1%), devido, entre outros motivos, ao fato de que o principal item da pauta é a compra de combustíveis e lubrificantes, que já anunciam expansão de preços. Assim, provavelmente, deveremos ter um maior déficit na balança de pagamentos.

Por fim, quanto às finanças dos estados do Nordeste, que registraram uma média de 13,3% de incremento do ICMS em 2021, a hipótese é de diminuição deste patamar de crescimento, pelo efeito da retração que poderá ocorrer, sobretudo no comércio e serviços. Além disso, importante lembrar que se trata de ano de eleição, quando tradicionalmente se elevam os gastos públicos.

Num ambiente de grande incerteza econômica e instabilidade política nacional, agravado agora, pelo contexto de uma guerra cujos desdobramentos em escala global são imprevisíveis, inspira perspectiva de muita cautela para 2022.  O lado positivo é que a fase pior da pandemia está passando e a economia já vem apresentando gradual retomada, mas este quadro de grandes incertezas externas e internas e as evidências de indicadores macroeconômicos preocupantes, como taxas elevadas de inflação e de juros, de fato acendem um sinal amarelo para a economia brasileira e a nordestina.

 Vamos aguardar os próximos passos desta guerra e da evolução da macroeconomia brasileira ao longo deste ano, sem contar, claro, os desdobramentos das eleições. São muitas variáveis a considerar.  Não obstante, no caso do Nordeste, uma parte da solução pode e deve caber a nós nordestinos: governos estaduais e locais; empresariado e sociedade civil. 

*Valdeci Monteiro dos Santos é sócio-diretor da Ceplan Consultoria Econômica, professor de Economia e assessor de planejamento da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap)

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