“Não basta apenas decretar que não vai ter, é preciso dizer o que será feito pelo setor”, questiona Abeoc-PE sobre cancelamento de Carnaval
Por Patrícia Raposo e Juliana Albuquerque
As notícias de cancelamento do Carnaval em várias cidades no Brasil seguem repercutindo sobre diversos setores econômicos, que sentem o reflexo sobre contratos e encomendas.
Assim como o setor têxtil enfrenta aumento nos estoques pela falta de apetite por fantasias no varejo, o setor de eventos, um dos mais afetados pela pandemia, lamenta novamente o cancelamento das festas de rua, porque isso implica em menos contratos na prestação de serviços. Outro que também lamenta é o de bares e restaurantes.
Diante do cancelamento do Carnaval de Olinda, cidade que faz uma das maiores festas de rua do Brasil, de Jaboatão dos Guararapes e do Recife, outro grande polo carnavalesco do estado, a presidente da Associação Brasileira de Empresas de Eventos de Pernambuco (Abeoc-PE), Tatiana Marques, questiona o que será feito pelas lideranças municipais se todos as cidades optarem por cancelar o Carnaval em seus polos neste ano.
“Diferente do que aconteceu no ano passado, neste não seremos pegos de surpresa, portanto, não basta apenas dizer que não tem Carnaval, é preciso dizer o que será feito pelo setor se não houver de fato a festa. Acreditamos no bom senso dos governantes neste sentido, pois aguardamos que eles atentem para a sobrevivência do setor com algum plano que auxilie principalmente os pequenos produtores, fornecedores e artistas que têm no Carnaval uma fonte de renda para todo o ano”, argumenta Marques.
Em Olinda, o professor Lupércio (SD), prefeito da cidade, prometeu pagar auxílio, como fez no ano passado, para ajudar a quem poderia e não vai faturar com a festa. Serão contemplados ambulantes, entidades, grupos e artistas que representam a cultura popular.
Tatiana alerta, porém, que apenas dizer que vai pagar um auxílio não adianta. De acordo com ela, no ano passado, em muitos casos, a exemplo do que ocorreu na capital pernambucana e em Olinda, o pagamento além de excluir a grande maioria de quem trabalha indiretamente nos dias de folia, demorou a chegar.
“Apenas quem tinha cadastro no ano anterior como ambulante no Recife teve direito a receber o valor. Em Olinda, além de um valor mínimo, a demora para receber o auxílio dentro do período do Carnaval tornou praticamente sem efeito a ajuda. Como eu digo, neste ano, não há surpresa, por isso, acreditamos na sensatez dos governantes para solucionar o problema”, enfatizou Tatiana Marques.
“O impacto de não ter Carnaval é muito grande para o setor. O grande prejudicado são os pequenos fornecedores e profissionais e as cadeias econômicas que são interligadas ao Carnaval através deles. O catador de lata, de lixo, o cara que faz maquiagem nas ladeiras de Olinda; a pessoa que faz adereços baratos de Carnaval. Os pequenos fornecedores de show, de receptivo, ou seja, segmentos que não têm nem como comprovar de fato a sua contribuição e que, sem uma regra clara, serão mais uma vez excluídos de qualquer auxílio, caso o cancelamento, de fato, aconteça de maneira uniforme em todos os municípios de Pernambuco”, comenta a presidente da Abeoc-PE.
No Ceará, a preocupação com os pequenos é a mesma, principalmente, após a definição, ontem (5), sobre o cancelamento da festa de rua e aumento das restrições ainda vigentes no estado. Por lá, além de estar proibido o Carnaval, o setor de eventos segue afetado por novas reduções pelos próximos 30 dias, com autorização de eventos sociais restrita a 250 pessoas e os realizados em locais abertos limitados ao público de no máximo 500 pessoas.
“É preciso estabelecer se haverá um auxílio para as empresas e profissionais do setor de eventos, um setor que vinha em uma lenta retomada e que movimenta cerca de 52 segmentos econômicos diretamente. Isto sem contar quem trabalha de forma autônoma que, assim como os demais, precisa ter seu sustento garantido com a anulação da festa. Claro que existe a preocupação sanitária, que é válida, só que a renda também é vida e sobrevivência”, comenta Rafael Bezerra, produtor de eventos e vice-presidente da Abeoc-CE.
Diferente do que aconteceu em Pernambuco e no Ceará, cuja definição do cancelamento demorou a chegar, na Bahia, um dos principais destinos da folia de Momo do Brasil, amarga desde dezembro a certeza de que 2022 seria um outro ano perdido para a cadeia produtiva que contempla do catador de latinha a quase totalidade do setor cultural do Estado.
“Desde outubro a Abeoc-BA vem tentando um diálogo com a prefeitura de Salvador, nosso grande polo, e o governo do Estado, que desde esse tempo vem se posicionando contra a realização da festa na Bahia. Contudo, ainda nutríamos a esperança de que em Salvador a situação fosse diferente, o que terminou não sendo desde o fim do ano. Então, não adianta dizer que estamos sofrendo com a notícia agora, pois a desgraça do nosso setor já era mais que anunciada desde novembro, quando o governo se posicionou como se o setor de eventos pudesse ser o grande responsável pela disseminação de uma nova onda do vírus”, afirma Cinara Cardoso, presidente da Abeoc-BA.
Passaporte da vacina
Para a presidente da Abeoc Nacional, Fátima Facuri, embora o momento seja de apreensão, deve-se confiar no passaporte da vacina e permitir os eventos privados.
“Desde setembro temos feitos eventos e não vimos o índice de contaminação crescer em virtude deles. Com o passaporte, temos a garantia de que as pessoas que estão nas festas estão protegidas. E os eventos vão continuar seguindo os protocolos de segurança, com distanciamento, álcool e máscaras”, declarou.
Fatima Facuri não acredita que as pessoas vão se aglomerar nas festas, porque os organizadores vão seguir a limitação de público e porque já há uma consciência maior sobre a necessidade de seguir protocolos. “Eu participei de uma festa de réveillon e vi que as pessoas estão se cuidando. As pessoas evitam aglomerações. Havia distanciamento de mesas e uso de máscaras”, disse.
Segundo Facuri, no ano de 2020 muitos eventos foram perdidos, mas os que chegaram a ser realizados surpreenderam e demonstraram que há um interesse grande por eles. “As empresas precisam fazer o lançamento de seus produtos. As pessoas precisam fazer network”, ressalta.
Os eventos movimentam 52 setores que ainda não conseguiram recuperar as perdas que tiveram com a pandemia. “É sempre muito ruim para a economia e para quem depende dos eventos de rua quando eles não acontecem. Os eventos privados não podem ser cancelados”, apela a presidente da Abeoc.
Bares e restaurantes
O setor de alimentação fora do lar tem vários eixos e um dos principais são as opções de rua. “O Carnaval gera grande impulso no faturamento do setor, que chega a crescer até 25% no período”, diz o presidente de Abrasel-PE, André Araújo. Segundo ele, sem as festas de rua, as operações que estão nos corredores turísticos e nos shopping centers terão melhor desempenho.
A solução, segundo Araújo, pode ser a realização de promoções internas, caso sejam permitidos os eventos privados. “Os bares e restaurantes têm ambiente controlado e seguem os protocolos de segurança”, lembra o presidente da Abrasel-PE. Isso seria uma saída não só para atrair o público, mas também para gerar renda para os profissionais de eventos.
O presidente do Movimento Pró-Pernambuco (MPP), Avelar Loureiro Filho, concorda com o cancelamento do Carnaval de rua e onde não haja controle sanitário. “Esperamos um novo pico da variante ômicron para o fim de janeiro, mas com reflexos fortes ainda em fevereiro. Desta forma, espera-se que os entes governamentais busquem alternativas ou compensações para os setores diretamente envolvidos na realização desses eventos de rua”, disse.