Por Fernando Ítalo e Paulo Goethe, com agências
Depois de 1 ano e meio desde o início do Governo Lula 3, a promessa de retomada de encomendas de grandes embarcações pela Transpetro começa finalmente a ser cumprida, pelo menos em parte. A iniciativa vinha sendo aguardada particularmente pelos dois maiores estaleiros do Brasil: Atlântico Sul Heavy Industry Solutions (PE) e Enseada (BA).
Diante dessa expectativa que não é só das plantas navais da região, mas de todo o Brasil, o braço logístico da Petrobras anunciou nesta segunda-feira (8) um programa para contratação de 4 navios da classe Handy, de 15 a 18 mil toneladas de porte bruto (TPB).
O modelo será diferente do extinto Promef, executado nos governos Lula e Dilma, entre os anos 2000 e 2010. Dessa vez, o processo será de licitação pública internacional.
Estão previstas condições para favorecer a indústria naval brasileira, mas sem a reserva de mercado para estaleiros nacionais, como no programa anterior. As plantas navais instaladas no Brasil não comentaram a mudança.
Essas encomendas integram o TP 25 da Transpetro, programa de renovação e ampliação da frota do Sistema Petrobras, e, de acordo com a empresa de logística da holding, “podem gerar novas oportunidades para a indústria naval brasileira.”
Quantas embarcações serão encomendadas?
Esse primeiro pacote integra um total de 16 navios de cabotagem (navegação costa a costa no litoral brasileiro) previstos no TP 25, programa que faz parte do Plano Estratégico 2024-2028 da Petrobras.
Segundo a petrolífera, “o objetivo é atender às demandas de transporte de produtos com embarcações que contemplam soluções para maior eficiência energética e menor emissão de gases de efeito estufa.”
De acordo com a presidente da Petrobras, Magda Chambriard, “esse programa vai dar mais capacidade à nossa logística de petróleo e derivados”.
“Vamos ficar menos expostos a oscilações de fretes e reduzir os custos com afretamentos de embarcações. É um marco do início de contratações que vão contribuir para fortalecimento da indústria naval e offshore nacional”, defende.
Transpetro comemora encomenda de embarcações
O presidente da Transpetro, Sérgio Bacci, diz que “o lançamento do edital marca o fortalecimento da companhia em um setor que possui grande importância para o Sistema Petrobras e para todo o Brasil”.
“Com essas embarcações, iniciamos o Programa de Renovação e Ampliação da frota própria, incorporando unidades consideradas estratégicas na operação logística de cabotagem. Já temos previstas 16 embarcações, entre gaseiros e navios de médio porte e outras estão em estudo”, acrescenta.
Como vai funcionar encomenda de embarcações?
O edital dessas primeiras encomendas no modelo de licitação internacional aberta já está publicado no portal Petronec. Esse formato permite a participação de qualquer estaleiro – estrangeiro ou brasileiro – que atenda aos requisitos técnicos e econômicos previstos.
O cronograma divulgado determina que as empresas interessadas têm 90 dias para apresentar suas propostas. A previsão de divulgação do estaleiro vencedor e assinatura do contrato é dezembro próximo.
Já o lançamento do primeiro navio Handy é estimado para o primeiro semestre de 2026. O lançamento, no setor naval, é a etapa em que, concluída a construção do casco, a embarcação flutua, sendo transferida do dique seco (ou estrutura equivalente) para o cais de acabamento. Nessa cerimônia, o produto também é “batizado”.
Depois da entrega desse navio, os demais deverão sair dos estaleiros contratados, a cada seis meses, até 2028, quando está programado o recebimento do último dessa série.
Transpetro quer embarcações sustentáveis
Além da abertura à participação de empresas de fora do Brasil, outra mudança no programa atual é a inclusão, nos navios, de especificações técnicas relacionada à sustentabilidade.
Há exigência de pacotes de equipamentos que garantam maior eficiência (com menor consumo de consumo de combustíveis). Também existe a possibilidade de adoção de novas tecnologias, que utilizem motores alternativos aos atuais, a combustão.
O objetivo desses requisitos ambientais é reduzir a pegada de carbono da Transpetro, em atendimento às determinações da Organização Marítima Mundial (IMO). Em 2023, o corte nas emissões da frota da companhia foi de 8%.
Embarcações servem de alento na crise do setor
Esse novo programa da Transpetro, embora esteja longe de representar uma solução para a crise que os estaleiros brasileiros enfrentam, é uma luz no fim do túnel.
Um estudo divulgado em março passado pelo Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP) concluiu que dos 48 estaleiros brasileiros, seis estão fechados e apenas nove funcionam prestando serviços diversos, mas sem encomendas de novas embarcações.
No caso dos dois gigantes localizados no Nordeste – EAS Heavy Industry Solutions e Enseada – a subutilização tem um grande impacto para o setor, pois as duas empresas representam 40% da capacidade instalada dessa indústria no Brasil. As plantas duas plantas podem processar juntas até 200 mil toneladas de aço por ano.
Esse cenário, até o momento melancólico, além da dimensão econômica, tem um aspecto simbólico importante, já que o EAS (Camargo Corrêa/Queiroz Galvão) e Enseada (Novonor) foram marcos do ressurgimento da construção naval no Brasil, nos anos 2000 e 2010.
Esses empreendimentos receberam investimentos na casa dos R$ 5 a 6 bilhões, foram financiados, em parte, com dinheiro público, e chegaram a gerar, no auge das contratações, 18.500 empregos – em torno de 11,5 mil no EAS e 7,5 mil no estaleiro baiano.
O final da saga, no entanto, foi triste. Na crise da Petrobras, no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, esses negócios acabaram naufragando com efeitos econômicos e sociais desastrosos.
Entraram em colapso da mesma forma grandiosa com que emergiram, incentivados por programas governamentais pretensiosos. Programas pouco responsáveis sob a ótica da sustentabilidade financeira a longo prazo e guiados por interesses mais relacionados aos fins imediatos da política eleitoral que ao fortalecimento da indústria nacional.
Que dessa vez, com um Promef menos espetacular e voltado de fato para o desenvolvimento do setor, a história não se repita.
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