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Ariston Flávio*
A recente discussão no Tribunal Superior do Trabalho (TST) sobre a limitação do uso do banheiro pelo trabalhador e seu impacto nos programas de incentivo revelam uma estrutura organizacional pautada no controle absoluto da força de trabalho. Mostra um trabalho subordinado à modernidade.
A questão é que o impacto da restrição ao uso do banheiro não se limita a um desconforto pontual. Reflete sim um mecanismo estrutural de controle, que condiciona a permanência no emprego ao cumprimento de metas baseadas na obediência e no desgaste físico e mental.
A Teoria Organizacional Crítica, conforme o professor Everaldo Gaspar abordada no artigo “O Diálogo do Direito do Trabalho com a Teoria Organizacional”, destaca que a subordinação no trabalho é um elemento estruturante das relações laborais contemporâneas.
Fazendo análise sob a ótica desta teoria, é possível observar a maneira como as organizações hipermodernas estabelecem o controle sobre os braços, a mente e a alma dos trabalhadores, bem como são capazes de impor-lhes sofrimentos ainda mais cruéis do que aqueles vivenciados no início da era moderna.
No caso dos trabalhadores de teleatendimento, a lógica organizacional impõe rituais de sofrimento e restrição do controle corporal, exemplificando o que o artigo chama de “mortes lentas” no contexto do trabalho contemporâneo.
Do ponto de vista jurídico, a legislação trabalhista estabelece parâmetros para contratos, mas o verdadeiro desafio está na interpretação constitucional do princípio da dignidade da pessoa humana e sua aplicação nas relações de trabalho.
A possibilidade de se reconhecer dano moral presumido nesse contexto indica um avanço na proteção da dignidade do trabalhador. Evidencia também a persistência de modelos organizacionais ultrapassados, que privilegiam a maximização da produtividade em detrimento do bem-estar humano.
Sendo assim, a decisão a ser tomada pelo TST não trata apenas da legalidade do controle sobre o uso do banheiro, mas questiona o modelo de gestão que prioriza o lucro em detrimento da dignidade humana. Em favor da presunção do dano moral, representaria um marco na superação do paradigma clássico da relação de emprego, abrindo espaço para uma maior valorização da saúde e do bem-estar do trabalhador.
Como aponta a crítica filosófica da modernidade, a subordinação no trabalho jamais será eliminada enquanto a força de trabalho estiver aprisionada a modelos organizacionais que legitimam a exploração sob o pretexto da eficiência. A verdadeira mudança exige um reconhecimento mais amplo das patologias sociais geradas por esse modelo, de modo que o Direito do Trabalho possa superar sua visão tradicional e adotar uma abordagem mais crítica e humanizada.
*Ariston Flávio é Doutor em Direito (UFPE), Membro da Academia Pernambucana de Direito do Trabalho e professor do Centro Universitário Tiradentes (Unit-PE)