Por João Valença*
Nos últimos anos, o crescimento das apostas online no Brasil trouxe desafios significativos no campo regulatório. O governo, por meio da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), adotou medidas para bloquear sites de apostas que operam sem licença no país, afetando cerca de 600 plataformas. Essa decisão, anunciada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em setembro de 2024, visa proteger os consumidores e assegurar a arrecadação de impostos que essas empresas, em grande parte estrangeiras, não pagam.
O marco regulatório das apostas no Brasil, ainda em desenvolvimento, enfrenta obstáculos pela ausência de uma regulamentação clara. A Lei 13.756/2018 permitiu a legalização das apostas esportivas de quota fixa, mas a falta de um decreto presidencial deixou brechas que possibilitaram a operação irregular de empresas. Com o avanço da tecnologia, o mercado de apostas se digitalizou, abrindo espaço para empresas em paraísos fiscais captarem o público brasileiro sem garantir a proteção do consumidor.
A ANATEL, em conjunto com o Ministério da Fazenda, tem o poder de bloquear esses sites através do mecanismo de bloqueio de DNS. Além disso, o governo restringiu o uso de cartões de crédito e benefícios sociais, como o Bolsa Família, para realizar apostas, medida que visa proteger o consumidor e evitar a utilização indevida de recursos públicos.
Uma questão crítica que surgiu com o bloqueio é a situação dos fundos dos apostadores depositados nessas plataformas. O ministro recomendou a retirada dos fundos antes do bloqueio, mas a localização dessas empresas no exterior pode dificultar o reembolso, criando um cenário de incerteza para os consumidores.
O impacto econômico e fiscal dessas ações é notável. As empresas que operam sem licença não contribuem com tributos, o que resulta em perdas para os cofres públicos. A estimativa é de que a regularização completa do setor possa gerar bilhões de reais em impostos, que poderiam ser destinados a áreas essenciais como saúde e educação.
No entanto, o bloqueio também pode alimentar o mercado clandestino de apostas, onde a fiscalização é ainda mais desafiadora. O futuro da regulação aponta para um processo mais rigoroso a partir de 2025, com a exigência de que empresas solicitem licenças para operar legalmente no Brasil, adotando práticas de transparência, prevenindo a lavagem de dinheiro e promovendo políticas de jogo responsável.
A iniciativa de bloquear sites de apostas representa um marco importante na regulação dos jogos de azar no Brasil, mas também traz desafios jurídicos, como o direito ao livre acesso à internet e a interferência na livre concorrência. A expectativa é de que o governo consiga equilibrar a necessidade de controle com o desenvolvimento de um mercado regulado, transparente e sustentável.
*João Valença é advogado e cofundador do VLV Advogados, referência nacional em Direito Regulatório
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