Projeto com impacto de R$ 1 bi vira jogo de manobras regimentais na Alepe

Projeto prevê a extinção das faixas salariais de policiais e bombeiros militares de Pernambuco.
Alepe
Alepe/Foto: divulgação

A extinção das faixas salariais de policiais e bombeiros militares de Pernambuco, vistas como uma distorção pela categoria por deixar servidores de mesma graduação com remunerações diferentes, virou uma disputa de manobras regimentais no Legislativo estadual. Parlamentares ligados à corporação defendem que o atual modelo acabe de forma escalonada ainda este ano. Já o Governo alega que a medida impactará o orçamento em R$ 1 bilhão e propõe a extinção gradativa até 2026.

O Projeto de Lei Complementar 1671/2024, de autoria do Poder Executivo, começou a tramitar na Assembleia Legislativa (Alepe) no dia 4 de março. Foi uma resposta da governadora Raquel Lyra (PSDB) a uma queixa feita pelos militares desde 2017, quando o modelo de faixas salariais foi implantado, ainda na gestão do ex-governador Paulo Câmara, então no PSB. O formato foi a saída adotada na época para evitar uma greve da Polícia Militar (PM), mas sofreu críticas por ser uma proposta oriunda dos comandantes da corporação e do Corpo de Bombeiros, sem participação de representações dos praças.

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O projeto apresentado agora em 2024 pelo Governo de Pernambuco prevê a extinção progressiva das faixas entre junho de 2024 e junho de 2026, fazendo com que o soldo inicial para soldados da faixa A passe de R$ 3.419,88 para R$ 4.406,41. No fim da transição, em 2026, esses mesmos servidores em início de carreira passarão a receber R$ 5.617,92. “Trabalhamos muito para chegar a essa definição. É importante dizer que a pauta da segurança pública é prioritária para a nossa gestão”, afirmou a governadora Raquel Lyra (PSDB), ao anunciar o envio do projeto de lei à Alepe, no início do mês.

Fim das faixas salariais em 2024

No dia seguinte à chegada do projeto ao Legislativo, porém, teve início uma batalha de narrativas. O deputado Joel da Harpa (PL), um dos líderes da greve da PM deflagrada em 2014, durante o governo de João Lyra Neto, pai da atual governadora, apresentou emenda ao projeto do Executivo para que a extinção das faixas salariais seja feita trimestralmente a partir de junho, acabando ainda em 2024. Ele argumenta que emendas apresentadas ao Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) em 2023 garantiram recursos para acabar com o modelo atual de remuneração da PM ainda neste exercício.

“Com a proposta da emenda, seria perfeitamente possível a extinção das faixas salariais a vigorar a partir de 1º de junho deste ano, e, depois, trimestralmente, sem criação de novas despesas no orçamento do Estado”, afirmou, na época, o deputado, que é avaliado como parceiro do Governo em outras pautas, mas tem feito cobranças na segurança pública.

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A extinção das faixas salariais de policiais e bombeiros militares de Pernambuco, vistas como uma distorção pela categoria por deixar servidores de mesma graduação com remunerações diferentes/Foto: SAD-PE/Divulgação

Do mesmo partido, mas considerado opositor à gestão estadual desde seu início, o deputado Coronel Alberto Feitosa (PL) foi o proponente de uma audiência pública realizada no último dia 20, na Alepe. Na ocasião, disse que o Governo só vai dar 3% de aumento para a categoria em 2024, ante “uma inflação de quase 5%”. “Nós garantimos, para ajudar o Governo do Estado, R$ 114 milhões para aplicar na extinção das faixas salariais já em 2024. E eu pergunto: cadê esse dinheiro?”, questionou.

Impacto no orçamento

No modelo proposto pelo Governo de Pernambuco, o impacto orçamentário-financeiro da extinção das faixas salariais de policiais e bombeiros militares será de R$ 97 milhões, em 2024, de R$ 293 milhões, em 2025, e de R$ 610 milhões, em 2026, totalizando R$ 1 bilhão em três anos. O secretário estadual de Planejamento, Gestão e Desenvolvimento Regional, Fabrício Marques, explicou que, se a proposta for atendida no formato defendido pelos parlamentares, todo esse impacto terá que ser absorvido já este ano, medida para a qual não há espaço fiscal.

“Esse projeto tem um impacto financeiro, ao final, que supera R$ 1 bilhão. Para suportar essa expansão de despesa e fazer reajustes é preciso fazer o escalonamento”, defendeu o gestor, acrescentando que o projeto encaminhado para a Alepe “foi o possível” mediante as limitações da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), uma vez que, como o portal Movimento Econômico mostrou no início do mês, Pernambuco está perto do limite prudencial de gastos com o funcionalismo público.

Joel da Harpa
Joel da Harpa/Foto: Nando Chiappetta/Alepe

Manobras regimentais

Após a audiência pública e a apresentação de emendas, o projeto deveria ter sido discutido na Comissão de Constituição, Legislação e Justiça (CCLJ) da Alepe na última terça-feira (26). A oposição, porém, formou um novo bloco composto pelo PSB, pelo PSOL e pelo Republicanos e, com isso, ampliou seu raio de influência sobre o assento do deputado William Brígido (Republicanos) na comissão. Alinhado à governadora Raquel Lyra, o parlamentar foi substituído pelo deputado de oposição Rodrigo Farias (PSB), o que garantiria mais um voto contra o projeto do Poder Executivo no colegiado.

Prevendo a possibilidade de derrota, o Governo se articulou com o presidente da CCLJ, deputado Antônio Moraes (PP), e com a deputada Débora Almeida (PSDB), correligionária da governadora e relatora da matéria. Ela decidiu retirar o projeto de pauta na reunião da última terça-feira, que acabou em protesto de policiais, bombeiros e deputados contrariados pelo desfecho.

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Retirada do projeto da pauta gerou tumulto na Alepe/Foto: Foto: Giovanni Costa/Alepe

Depois do episódio, que gerou, inclusive, questionamentos em plenário sobre a falta de segurança vivida pelos deputados no exercício de seu trabalho, os capítulos seguintes seguem tensos. Como revide à manobra da oposição, o líder do União Brasil na Alepe, deputado Romero Sales Filho, aliado do Governo, solicitou à presidência da Alepe a inclusão da também governista Socorro Pimentel (União Brasil) na CCLJ.

O pedido é para que ela substitua Romero Albuquerque (União Brasil). O parlamentar é da bancada independente, mas tem votado com a oposição em matérias polêmicas de autoria do Executivo. Na quinta-feira (28), ele emitiu nota classificando a decisão da liderança do União Brasil como “totalmente antidemocrática”.

Projeto volta à pauta nesta semana

O projeto deve voltar à pauta da CCLJ nesta terça-feira (2). Como Romero Albuquerque é vice-presidente da CCLJ, eleito por seus pares no início do ano passado, parlamentares avaliam que a substituição do deputado na comissão tende a não ocorrer, garantindo um placar de, no mínimo, 5 a 4 pela derrota do projeto. O ofício da liderança do União Brasil solicitando a saída do deputado e a entrada de Socorro Pimentel no colegiado ainda está sob análise da presidência da Alepe.

Em paralelo, outro artifício regimental está em andamento. O Diário Oficial do Poder Legislativo informou que o líder do bloco PSB-PSOL-Republicanos, deputado Rodrigo Farias (PSB), solicitou a revisão dos espaços dos partidos nas comissões da Alepe. Nos bastidores, o argumento é o de que, como o novo bloco conta com 15 deputados, tem preponderância numérica para ocupar mais um assento em algumas comissões, o que ajudaria a neutralizar placares favoráveis ao Governo em votações polêmicas como a da extinção das faixas salariais de policiais e bombeiros militares.

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