MP 1.052/21: uso de verbas dos fundos constitucionais em outras regiões abre polêmica

Por Patrícia Raposo* A Medida Provisória 1.052/21, que tramita no Congresso Federal, tem mobilizado empresários e políticos do Nordeste. A MP altera a Lei dos Fundos Constitucionais para modificar taxas e encargos devidos aos bancos administradores – Bando do Nordeste (BNB), no caso do Fundo de Financiamento do Nordeste (FNE); o Banco da Amazônia (Basa), […]
Etiene Ramos
Etiene Ramos
Jornalista

Por Patrícia Raposo*

Banco do Nordeste: taxa de administração em jogo

A Medida Provisória 1.052/21, que tramita no Congresso Federal, tem mobilizado empresários e políticos do Nordeste. A MP altera a Lei dos Fundos Constitucionais para modificar taxas e encargos devidos aos bancos administradores – Bando do Nordeste (BNB), no caso do Fundo de Financiamento do Nordeste (FNE); o Banco da Amazônia (Basa), no caso do Fundo de Financiamento do Norte (FNO); e o Banco do Brasil, no caso do FCO, o Fundo de Financiamento do Centro-Oeste.

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Máximo Cadorin: medida inconstitucional

A MP também direciona recursos do FNE, FNO e FCO para projetos voltados à Parceira Público Privada (PPP) em outras regiões do Brasil. Neste sentido, prevê um fundo para viabilizar concessões e PPPs para obras da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.

O novo fundo resultará de uma reestruturação no atual Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE), criado em 2014 para oferecer cobertura a quaisquer riscos relacionados à concessões. Atualmente, o FGIE conta com R$ 750 milhões. A MP autoriza a União a participar do fundo, que sucederá o FGIE, com até R$ 11 bilhões.

“O problema desta MP é que ela determina ao novo fundo a ‘preferência’ por projetos de concessões e PPPs nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Ou seja, os recursos que são destinados a essas regiões deixam de ser exclusivos a elas, podendo ser encaminhados a projetos nacionais e isso é muito ruim”, reclama Mássimo Cadorin, presidente do Centro das Indústrias de Pernambuco – Ciepe, ligado à Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco (Fiepe).

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Segundo o governo, o objetivo é dar apoio a investimentos em obras de saneamento básico, resíduos sólidos, iluminação pública, habitação social e segurança hídrica, via projetos de concessão e de PPPs; dar cobertura dos riscos, por meio de instrumentos garantidores; e viabilizar fundos de investimento em infraestrutura regulamentados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

“A MP tem um aspecto inconstitucional, já que os fundos constitucionais foram criados para diminuir as desigualdades regionais”, alerta Cadorin, para quem diminuir a taxa do BNB é bom. “Mas, mexer no dinheiro, não. Ele é a única fonte de financiamento de longo prazo na região. O banco conhece a região e fala a nossa língua”, diz.

O argumento do governo é de que ao diminuir a taxa de administração do banco sobrará mais recursos para linhas de financiamento. Estudos do Ministério do Desenvolvimento Regional apontam que a redução das taxas operacionais pagas aos bancos geraria uma economia de R$ 8,5 bilhões até 2024. “O problema é que a MP não garante a exclusividade da aplicação dos recursos na região”, reclama o empresário. “Não temos outro banco com decisão regional. O BNB, no começo da pandemia, foi o primeiro a jogar uma boia para salvar a atividade produtiva”, lembra.

Nem todos estão do mesmo lado

Ricardo Essinger, presidente da Fiepe, analisa que a redução da taxa de administração do banco vai aumentar a disponibilidade de recursos para financiamento. “Isso vai fazer com que o banco tenha mais eficiência nas suas operações. A taxa é relativamente alta”, analisa.

Ricardo Essinger: Fiepe está avaliando o impacto da medida

Essinger diz que, com relação à alteração na disponibilidade de recursos do Fundo de Investimentos do Nordeste (Finor), a Fiepe está avaliando o impacto da medida. “Temos informações de que há sobras de recursos, que ficam entesourados. Vamos conversar com o ministro Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional), para entender melhor. Sabemos que o  ministro não vai querer prejudicar o Nordeste, não vai deixar que se cometa um erro com a região”, explica, acrescentando que é preciso deixar o emocional de lado e “agir racionalmente”.

Eduardo Cavalcanti: Não pode faltar dinheiro no NE

Para o presidente estadual da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH-PE), Eduardo Cavalcanti, a MP 1.052/21 será positiva se, realmente, priorizar a construção de infraestrutura nos estados da área de atuação dos bancos regionais. “O Turismo depende muito de obras de infraestrutura, estradas e saneamento, sobretudo, que também atendem aos demais setores econômicos e às cidades como um todo”, afirma, ressaltando que a indústria hoteleira conta muito com os fundos constitucionais para financiar a construção de hotéis e outros equipamentos turísticos. “Não pode faltar dinheiro dos bancos regionais para os investimentos em hotelaria, incluindo bares e restaurantes da região”, completa.

BNB em alerta

No BNB, o clima é de preocupação. “Me parece que a motivação vem de uma necessidade por recursos no governo federal”, diz um funcionário de alto escalão do BNB, que por motivos óbvios não quer aparecer.

Em um paper interno que circulou no BNB, o corpo técnico da instituição ressalta que a taxa de administração do banco já vem sendo reduzida. “Ela era de 3% ao ano (a.a.) em 2018 e, pela Lei 13.862/2018, e vem recuando em 0,3 ponto percentual, de forma progressiva, até 2023, quando seria fixada em 1,5% a.a.”, diz o texto.  

“A remuneração sobre o saldo médio das disponibilidades do fundo é de 0,35% a. a.,  e  a del-credere (remuneração que o creditado se obriga a pagar ao banco, em função do risco por este assumido) sobre as operações com risco compartilhado é de 3% a.a., e de 6% a.a., sobre operações com  risco integral do banco. O banco recebe 3%, pois as operações são realizadas com risco compartilhado, sendo 50% para o BNB e 50% para o FNE”, diz o documento.

Diante disso, no entendimento dos gestores do BNB, as modificações introduzidas pela Lei 13.682/2018 já impactam significativamente a remuneração do banco relativa à taxa de administração em face da redefinição da base de cálculo.

“Há uma progressiva redução do percentual aplicável anualmente. E isso afetou inclusive a capacidade do banco de atender exigências de capital definido pelo Banco Central para o acordo de Basileia”, explica o funcionário graduado.

Segundo ele, a taxa de administração teve sua redução progressiva alterada radicalmente com impacto imediato no atual exercício, pois, a partir de julho, será reduzida de 2,1% a 1%, resultando em perda de receita no exercício de 2021. “Do jeito que vai, em cinco anos poderemos estar com sérias dificuldades operacionais, já que a partir de 2022, a redução passa a ser de 0,1 ponto percentual a cada exercício, alcançando 0,5% a.a. de 2026 em diante”, analisa.

*Colaborou Etiene Ramos

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