Duas grandes empresas do setor automotivo devem colocar Pernambuco no protagonismo da produção de carros elétricos no Brasil: a Stellantis, com sua montadora Jeep situada em Goiana, e o Grupo Moura, com suas baterias cada vez mais evoluídas tecnologicamente. É nesta direção convergente que ambas as empresas caminham. Um percurso que começou há mais de 40 anos.
O Grupo Moura, sediado em Belo Jardim, no Agreste pernambucano, foi o primeiro fornecedor de uma bateria específica para a Fiat, marca que hoje integra o portfólio do grupo Stellantis. Quando a montadora de Betim (MG) lançou o primeiro carro movido 100% a álcool do Brasil, o Fiat 147, em 1979, foi a Moura quem desenvolveu a bateria para o veículo.
“Naquela época, havia um problema a ser superado: a dificuldade de partida do motor. Desenvolvemos uma bateria que resolvia esse problema e entramos na Fiat por conta dessa inovação”, lembra Luiz Mello, Diretor-Geral Comercial de Baterias Industriais, Rede de Serviços, Lítio e Bess do Grupo Moura. Hoje, passadas mais de quatro décadas, 70% da produção da Moura vai para os carros da Stellantis fabricados em Goiana e Betim.
Ganhando escala
E, se a montadora Jeep já provoca alto impacto positivo na economia de Pernambuco, na era da eletrificação veicular isso tende a ganhar escala. “Quando olhamos para o futuro da eletrificação veicular, vemos que a bateria passará a ter uma importância muito maior do que tem hoje e é aí que a relação Moura-Stellantis tem tudo para tornar o Nordeste brasileiro uma referência na eletrificação veicular”, analisa Luiz Mello, lembrando que a região já é hoje destaque nacional em geração de energia solar e eólica.
O economista Jorge Jatobá, sócio na Ceplan Consultoria e um dos autores do estudo Principais Impactos dos Setores Automotivo e Autopeças no Estado de Pernambuco – que analisa o impacto positivo da montadora Jeep na economia pernambucana – pensa da mesma forma.
“Quando o Brasil começar a produzir carros elétricos, tudo aponta para o protagonismo de Pernambuco”, afirma Jatobá, com a segurança de quem analisou profundamente o cenário. Ele ressalta que a Moura tem desenvolvido uma série de pesquisas em torno da eletrificação veicular e, sendo fornecedora da Stellantis, contribuirá para que o polo automotivo de Goiana venha a ser placo de inovações capazes de colocar a economia de Pernambuco num outro patamar.
“Quando a Moura resolver o problema da autonomia dos veículos elétricos, a tendência é que ela se aproxime cada vez mais da Stellantis”, diz Ademilson Saraiva, outro economista que assina o estudo da Ceplan. “A Moura é uma indústria altamente intensiva em tecnologia. Teremos aqui, em breve, um polo ainda mais moderno do que o que já vemos hoje”, prevê Saraiva.
Já o diretor da Moura, Luiz Mello, ressalta que os reflexos serão tão grandes que transcenderão Pernambuco. De fato, analisando geograficamente o alcance da montadora, é possível perceber que, embora os maiores efeitos da unidade fabril da Jeep tenham recaído sobre o município de Goiana, reconfigurando sua economia, eles atingem Pernambuco e Paraíba no Litoral e no Agreste.
Isso porque boa parte dos funcionários da montadora de Goiana mora na grande João Pessoa. E na fábrica de baterias o fenômeno se repete: “Situada no Agreste, a Moura está numa região que se comunica com Campina Grande, cidade paraibana, também posicionada no Agreste. A maioria dos nossos engenheiros vêm da Universidade de Campina Grande”, relata Luiz Mello. O crescimento da Stellantis impulsionou o crescimento da Moura e teve efeito propagador.
“A economia da Paraíba se beneficia porque os empregos na indústria oferecem remunerações mais elevadas e os funcionários gastam seus salários por lá”, explica o economista Ademilson Saraiva.
Carros inteligentes
O que favorece é o contexto pernambucano, no qual a academia é muito forte, reunindo cursos e talentos de engenharia elétrica, mecânica, mecatrônica e tecnologia, por exemplo. Tem ainda o Porto Digital, com suas empresas voltadas para a produção de software. “Isso é importante porque os veículos elétricos terão uma quantidade muito maior de tecnologia embarcada. Serão muito diferentes dos carros tradicionais, quase como computadores”, completa Luiz Mello.
Um dos elos entre a Stellantis e a Moura é o Instituto de Tecnologia Edson Mororó Moura. “O que ele tem a ver com a Stellantis? Tudo! A Stellantis contratou diversos trabalhos de pesquisa com o instituto para chegarmos ao automóvel do futuro”, conta o diretor da Moura.
É curioso observar como o alcance da montadora se propaga pelo Agreste de Pernambuco. Além da cidade-polo de Belo Jardim, que reúne municípios como São Bento do Una e Tacaimbó, outra cidade sente os reflexos do crescimento do polo da Stellantis: Bonito. Foi ali que se instalou a fábrica de chicotes para veículos da japonesa Yazaki. Pouco mais de 100 quilômetros separam as duas localidades.
“A Yazaki veio para Pernambuco atendendo a um pedido da Stellantis”, revela Marcelo Gibin, gerente da fábrica. A unidade foi construída em uma área de 100 mil m², com investimentos de R$ 60 milhões. São 1.600 empregos diretos, o que corresponde a um terço da ocupação do município. A meta da Yazaki é atender a 100% dos projetos da Stellantis.
Assim como a Yazaki, outras indústrias estão por vir e vão se somar às 34 empresas que atendem à montadora – 16 delas instaladas no supplier park de Goiana.
Mas a evolução até o carro elétrico se dará em etapas. Tanto na Stellantis quanto na Moura há um processo evolutivo em andamento. Ambas as empresas pesquisam modelos de transição em que aparece o carro híbrido com etanol, por exemplo, até que se obtenha uma bateria que dê autonomia para longos percursos dos veículos 100% elétricos. Mas há outro ponto a se considerar, que são as soluções de abastecimento desses automóveis. Afinal, o próprio sistema elétrico precisa evoluir para atender aos carros do futuro.
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