Estudo é importante para garantir a preservação das espécies marinhas, como cetáceos, uma das principais atrações turísticas, e que ajudam a sustentar economicamente a ilha
Agência Brasil
O uso da ferramenta da bioacústica para conservação da biodiversidade marinha é a proposta da equipe de pesquisadores, coordenada pelo professor de medicina veterinária da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Raul Rio, que iniciou o trabalho pela ilha oceânica de mais fácil logística, que é a Ilha de Fernando de Noronha. O arquipélago vulcânico está situado a cerca de 350 quilômetros ao largo da costa nordeste do Brasil.
O projeto usa a bioacústica para avaliar o comportamento dos cetáceos que se abrigam nas ilhas oceânicas. “Quando a gente fala em cetáceos, estamos falando de baleias, golfinhos, inclusive de botos, nas quatro ilhas oceânicas que são Fernando de Noronha, o Arquipélago de São Pedro e São Paulo (pertencente a Pernambuco), Atol das Rocas (agrupamento de ilhas vinculadas ao estado do Rio Grande do Norte), e Trindade e Martins Vaz (arquipélago localizado no Oceano Atlântico, na costa do Espírito Santo)”, disse o professor da UFJF.
Nessas ilhas, o grupo já tem estrutura montada e autorizações do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para realizar os estudos. Rio é também presidente da organização não governamental (ONG) Ocean Sound, que reúne pesquisadores nacionais e estrangeiros que utilizam a bioacústica em pesquisas científicas.
Impacto acústico
O pesquisador informou que a escolha de Fernando de Noronha para dar partida aos trabalhos se deu também pelo impacto acústico muito grande que o crescimento da atividade turística gera para os golfinhos, seja pelas embarcações, pelas canoas havaianas, pelos barcos de observação. “É uma coisa que nos preocupa muito. Tudo isso tem impactado muito o comportamento dos golfinhos em Noronha, que já mudou muito nos últimos anos”.
O professor explicou que os golfinhos costumavam ficar no local conhecido como Baía dos Golfinhos, onde foi instalado um hidrofone,para captação de sons no oceano. “Mas a gente já observa, nos últimos anos, que eles estão se distribuindo para vários pontos da ilha e, curiosamente, um dos pontos é o porto, onde existe grande número de embarcações”. Ele afirmou que essa relação paradoxal do impacto do ruído antropogênico com a aproximação dos animais das áreas mais habitadas é uma incógnita que os pesquisadores querem entender melhor.
A equipe em Fernando de Noronha é integrada por sete pesquisadores. A pesquisa é importante também porque os golfinhos habitam a ilha. Pela manhã, eles buscam abrigos em águas transparentes onde podem descansar, socializar, cuidar dos filhotes e se reproduzir. À noite, eles deixam a ilha para se alimentarem de lulas, camarões e peixes que afloram em superfícies de mais fácil acesso no oceano. A população de golfinhos de Fernando de Noronha é estimada em torno de 2,7 mil animais, à média de 250 a 300 por dia.
Preservação
“Esse é um dos atrativos de Noronha”, disse Raul Rio. Por isso, ele defende a importância da preservação da espécie para garantir sua qualidade de vida e também para sustentar economicamente a ilha. “A gente quer utilizar a ciência, a pesquisa científica, para dar subsídio para que os gestores possam utilizar essas informações para gerar políticas públicas que permitam o equilíbrio sustentável entre turismo e conservação”. Destacou ainda a necessidade da educação ambiental para os visitantes. “É uma questão multidisciplinar, de educação ambiental, que passa pelos turistas, pelos moradores e autoridades da ilha. É necessário que todos tenham essa consciência de longo prazo”.
O trabalho em Fernando de Noronha tem prazo mínimo previsto de execução de cinco anos. “É um projeto de longo prazo, que chamamos monitoramento acústico de longo prazo”. O pesquisador e a ONG Ocean Sound estão buscando parcerias para ajudar na compra dos equipamentos, que são muito caros.
No início de 2022, a pesquisa de bioacústica se estenderá até a Ilha São Pedro e São Paulo; chegará ao Atol das Rocas no final desse ano ou começo de 2023; e a partir daí abrangerá Trindade e Martins Vaz. “Uma vez a pesquisa iniciada, ela não para. Continua. A gente vai somando as outras ilhas oceânicas a esse nosso calendário até ter, daqui a quatro anos, o monitoramento completo e contínuo das quatro ilhas oceânicas”, disse o pesquisador e professor da UFJF.