Relações internacionais: Sebrae suspende uma missão a Portugal e gera crise

Relações internacionais: projeto idealizado pela Câmara de Comércio, Indústria e Turismo Brasil-Portugal para estimular negócios no Polo de Confecções do Agreste teve o financiamento cancelado sem aviso prévio pelo Sebrae-PE e caso evolui para crise diplomática
Relações internacionais entre o Brasil e Portugal, para Antonio Mario, serão comprometidas pelo cancelamento dos recursos do Sebrae-PE
Relações internacionais entre o Brasil e Portugal, na visão do presidente da CCBP, Antonio Mário, serão afetadas pela decisão unilateral do Sebrae-PE de abortar missão comercial às vésperas da realização/Foto: CCBP (Divulgação)

As relações internacionais entre Pernambuco e o mercado português sofrem duro golpe com um episódio protagonizado pela Câmara de Comércio, Indústria e Turismo Brasil-Portugal (CCBP), a superintendência do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas em Pernambuco e a Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco (Adepe).

O incidente, que vem provocando mal-estar diplomático, é o cancelamento, pelo Sebrae-PE, do financiamento a uma missão idealizada pela câmara para estimular negócios bilaterais no Polo de Confecções do Agreste.

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A briga deve evoluir para uma ação judicial da instituição luso-brasileira contra a entidade nacional de fomento às MPEs. O presidente da CCBP, Antonio Mário de Abreu Pinto, afirma que o distrato aconteceu de forma unilateral, sem aviso prévio, semanas após a assinatura do contrato e às vésperas da realização da iniciativa. A missão comercial inédita seria realizada entre os dias 9 e 14 deste mês, com recursos do Sebrae-PE e apoio institucional da Adepe.

O objetivo da parceria seria beneficiar empresas de pequeno e médio portes do polo, cujas principais cidades são Caruaru, Santa Cruz do Capibaribe e Toritama, no Agreste pernambucano. O polo é constituído por cerca de duas mil empresas formais, movimenta por ano R$ 5 bilhões com a produção de 50 milhões de peças, exporta em torno de US$ 1 bilhão e gera 100 mil empregos, entre diretos e indiretos.

Esse cluster nasceu nos anos 1980, a partir da antiga Feira da Sulanca, em Caruaru, e ao longo das décadas se transformou num ecossistema que se estende por 15 municípios e engloba até cidades de estados vizinhos, como Paraíba e Alagoas, o que o configura como um dos mais importantes centros da cadeia têxtil/confecções no Brasil.

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Relações internacionais: Polo do Agreste sofre golpe na internacionalização num cenário em que precisa reagir ao início da produção da Shein no Brasil
Relações internacionais: Polo de Confecções do Agreste sofre duro golpe em internacionalização num momento em que a cadeia têxtil do Brasil precisa reagir ao início da produção das plataformas chinesas no país/Foto: Moda Center (Divulgação)

Relações internacionais: qual a programação do fórum em Portugal?

A missão do polo têxtil envolvia capacitação para exportações, rodadas de negócios, visitas a indústrias e palestras promovidas em cooperação com o governo português. O roteiro incluía as cidades de Lisboa, Porto e Vila Nova de Famalicão, onde se concentra o distrito industrial de confecções em Portugal.

Todas as agendas contavam com a articulação da Associação Empresarial de Portugal (AEP), maior entidade empresarial do país, em funcionamento desde o século 19 e responsável por fomentar o mercado têxtil em terras lusas.

Relações internacionais: entenda o imbróglio Pernambuco-Portugal

Denominada de Fórum Bilateral do Setor Têxtil e de Confecções, a missão cancelada seria correalizada pelos parceiros brasileiros com a Enterprise Europe Network (EEN) e a Agência para a Competitividade e Inovação de Portugal (IAPMEI), instituições que integram a network da CCBP.

A EEN é a maior rede de internacionalização de pequenas e médias empresas do mundo, atua em mais de 60 países e é cofinanciada pela União Europeia. Já o IAPMEI é o Sebrae do governo de Portugal.

Firmados os acordos entre todos os stakeholders brasileiros e europeus, o programa abriu 20 vagas para empresários pernambucanos, que seriam preenchidas conforme seleção pública lançada pelo Sebrae em 30 de agosto. Mas, quando só faltavam vinte dias para a realização do evento, o presidente da câmara afirma que foi surpreendido pelo cancelamento unilateral do projeto, “sem qualquer justificativa formal”.

Segundo Antônio Mário, o Sebrae decidiu por cancelar o financiamento, pouco antes da assinatura de um termo aditivo que detalharia o cronograma de desembolsos. O dirigente ressalta que a entidade se mostrou irredutível, apesar da câmara ter tentado estabelecer um canal de negociação por meio do Governo de Pernambuco, para cumprir eventuais exigências do processo que não tivessem sido atendidas e solucionar o conflito.

“Como qualquer programa internacional, nosso fórum foi precificado em moeda estrangeira e usamos como base o modelo de gestão de orçamento de projetos da Comissão Europeia, que é pré-aprovado por eles. Ações como estas envolvem um esforço de meses de articulação com órgãos internacionais e uma governança sólida, que o Sebrae parece desconsiderar”, acrescenta a superintendente da câmara, Daniela Freire.

Para a dirigente, o Sebrae também parece desconhecer a história da câmara em Pernambuco, fundada em 1912 e a segunda mais antiga do gênero em atividade no país, atrás apenas da que existe no Rio de Janeiro. “Em todo o Brasil, somos 18 câmaras portuguesas, que juntas integram uma federação com mais de 2,5 mil associados. Trabalhamos há mais de um século com o propósito de fomentar o ambiente de negócios entre os dois países”, frisa.

Fique por dentro do cronograma da crise diplomática

A apresentação do projeto do Fórum Bilateral do Setor Têxtil e de Confecções foi feita, no dia 10 de julho passado, pelo board da CCBP, diretamente ao superintendente estadual do Sebrae Pernambuco, Murilo Guerra. O presidente Antonio Mário relata que, “desde então, o Sebrae manifestou o interesse de ser o principal patrocinador da missão empresarial e, a partir daí, encabeçou a engenharia financeira”.

Ao todo, as instituições trabalharam conjuntamente com os parceiros europeus durante 72 dias, tempo, na visão da CCBP, “suficiente para conhecer a dinâmica das agendas, os parceiros comerciais e o conteúdo detalhado do programa de capacitação”.

“No entanto, o Sebrae, concluídas quase na integralidade as etapas do processo, comunicou o cancelamento, alegando que contrataria outra organizadora para assumir nosso projeto”, conta Antonio Mario.

Desde então – segundo ele – “pedidos de acesso a documentos de propriedade dos organizadores do fórum, planilhas de despesas operacionais e contato direto com fornecedores de serviços em Portugal foram feitos sem razão aparente pelo financiador, comportamento atípico em relações de cooperação internacional”.

Relações internacionais: câmara vê impactos negativos na rota de negócios Brasil-Portugal

A superintendente Daniela Freire afirma que a quebra de contrato gerou prejuízo para as relações internacionais de Pernambuco, especialmente no que se refere à aproximação do polo de confecções com o mercado português, e acabou respingando de forma mais ampla no relacionamento comercial entre o Brasil e Portugal.

“Foi uma tragédia para as relações interinstitucionais das entidades luso-brasileiras envolvidas, também tínhamos agenda com o embaixador do Brasil em Portugal e tivemos que cancelar. O Sebrae provocou um retrocesso sem precedentes nos esforços de internacionalização de uma das principais cadeias econômicas do Agreste, prejudicando um setor que estava prestes a iniciar sua capacitação para alcançar o mercado europeu”, sustenta.

Para a executiva, o cancelamento a poucos dias da ação colocou em xeque a capacidade das instituições de Pernambuco de participar de programas oficiais de cooperação internacional.

 “Sofremos um desgaste de imagem que atinge todas as instituições do estado, sobretudo neste momento, em que o setor têxtil e de confecções no país se une para conquistar mercados e manter a competitividade ante as importações chinesas e a decisão de plataformas da China de produzirem no Brasil”, avalia.

Conselheiro de Negócios Internacionais da Enterprise Europe Network (EEN) e chefe de Departamento no IAPMEI, Jorge Manuel Duque, reforça as críticas ao Sebrae local. O executivo informou, em comunicado, que precisaria reportar à rede global “que o tempo de trabalho envolvido na missão teria resultado zero”.

Também classificou a situação como “insólita” e “completamente imprevisível”, “com impactos em intenções futuras de parceria com Pernambuco e com o Sebrae em nível nacional”. “Lamento este comportamento nada respeitador, nem aderente a entidades com a responsabilidades públicas e internacionais”, destacou.

Das relações internacionais para os tribunais

Devido ao prejuízo provocado pelo distrato, a câmara, segundo Daniela Freire, vai notificar o Sebrae judicialmente por “suspensão às vésperas do evento sem embasamento legal plausível” e “intenção de utilizar indevidamente o programa através de outra organizadora, conforme nota no site da própria entidade”.

O diretor Jurídico da Câmara de Comércio Brasil-Portugal, Raif Daher, sustenta que “a conduta do Sebrae Pernambuco é contrária ao princípio jurídico da boa-fé objetiva e ao princípio administrativo da proteção da confiança, pois além de celebrar acordo de cooperação com a entidade, realizou diversas reuniões e se portou de modo a fazer as instituições portuguesas e brasileiras criarem expectativas juridicamente tuteladas de que o evento seria realizado com o seu financiamento”.

Daher complementa que a desistência foi feita, sem direito a defesa, após inúmeras solicitações, por parte da entidade, para alinhamento do processo de contratação junto ao Jurídico do Sebrae, uma vez que as questões estavam sendo tratadas diretamente e apenas com assessores da superintendência.

Fórum de relações bilaterais no setor têxtil fica para 2024

Apesar do baque provocado por esta crise, a Câmara de Comércio Brasil-Portugal mantém o projeto do Fórum Bilateral do Setor Têxtil e de Confecções e se mobiliza para realizar o programa em fevereiro de 2024.

A ideia da instituição é que o evento aconteça durante o Modtissimo – o mais antigo salão de moda da Península Ibérica, realizado desde 1992 em Portugal. A exemplo da Rodada de Negócios da Moda Pernambucana, o evento é dirigido a empresas e ocorre duas vezes por ano, na cidade do Porto.

O que diz o Sebra-PE sobre essa crise nas relações internacionais?

A reportagem contactou o Sebrae-PE para saber o motivo da retirada do apoio do Sebrae à missão, por que a decisão só foi tomada em agosto e se confere a informação de que a instituição se apropriou do projeto da CCBP. Aguardamos o posicionamento da entidade para atualização deste conteúdo.

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