Sua fonte de informação sobre os negócios do Nordeste

Sua fonte de informação sobre os negócios do Nordeste

José Carlos Cavalcanti: A “Estagnação Secular” está ultrapassada ou não (final)?

"Talvez tenhamos entrado em um período de alto crescimento da Produtividade Total dos Fatores – PTF (componente crucial do crescimento econômico) devido a tecnologias como Inteligência Artificial e outras."
José Carlos Cavalcanti
José Carlos Cavalcanti

Por José Carlos Cavalcanti*

O termo “estagnação secular” se refere a um estado de pouco ou nenhum crescimento econômico, ou seja, um ambiente onde a economia está essencialmente estagnada.  No primeiro artigo apontamos para um recente debate sobre “estagnação secular” entre duas feras da Economia contemporânea: o Prof. Olivier Blanchard (Professor de Economia do MIT/EUA, foi economista-chefe do FMI e hoje faz parte do Peterson Institute of International Economics – PIIE) e Prof. Lawrence H. Summers (Professor da Universidade de Harvard/EUA, foi Secretário do Tesouro dos EUA no governo Bill Clinton).

Para o Prof. Blanchard, uma vez que os bancos centrais tenham vencido a atual luta contra a inflação, que eles certamente irão (na opinião dele), “nós iremos muito provavelmente retornar a um ambiente macroeconômico não dramaticamente diferente, pelo menos neste respeito, daquele antes da COVID”; ou seja, retornaremos a um ambiente de baixas taxas de juros tal como vínhamos presenciando desde os anos 1980s. Em outras palavras, continuaremos num estado de “estagnação secular”!

Em todo caso, o Prof. Blanchard elencou três razões pelas quais o investimento daqui para frente pode ser maior, e se ocorrer, poderá representar um potencial de reversão da “estagnação secular”.  A primeira é que talvez tenhamos entrado em um período de alto crescimento da Produtividade Total dos Fatores – PTF (componente crucial do crescimento econômico) devido a tecnologias como Inteligência Artificial e outras.  Isto levaria a mais (r => taxa de juros real) e mais (g => taxa de crescimento) (variáveis vistas na newsletter passada), sem uma certeza se seria (r) menos (g), mas pode ser uma mudança a ocorrer. A segunda razão tem a ver com reshoring, ou seja, repatriar plantas fabris que estavam em outros territórios. E finalmente, gastos com Defesa (exemplo da guerra da Ucrânia) e “green investiment” (investimento verde), se formos sérios na luta contra o aquecimento global.

Do outro lado do debate temos o Prof. Summers, que depois de quase dez anos sustentando que os EUA e economias do mundo industrial viviam uma “estagnação secular”, agora deixou de defender esta tese, ao afirmar, em encontro recente da American Economic Association (janeiro de 2023), que “nós não vamos retornar para a era da estagnação secular”, alterando sua visão anterior.

- Publicidade -

Durante dez anos o Prof. Summers sustentou que nós estávamos vivenciando uma “Era de Estagnação Secular” desde os anos 1980s, título de um artigo de 2016 para a revista Foreign Affairs.  Em suas palavras, estas economias sofriam de um desbalanço resultante da crescente propensão a poupar e a decrescente propensão a investir. O resultado era que a excessiva poupança agia como uma draga sobre a demanda, reduzindo crescimento e inflação, e o desbalanço entre poupança e investimento puxava as taxas de juros para baixo.

O Prof. Summers então sugeria dois enfoques para resolver o problema da estagnação secular, de forma a aumentar o lado da demanda da economia. O primeiro era uma política fiscal governamental que gastasse agressivamente, particularmente em infraestrutura e desenvolvimento de fontes alternativas de energia (*).  O segundo seria diminuir a regulação dos negócios como um meio para impulsionar a economia.

Mas qual é, de fato, o ponto de inflexão da posição do Prof. Summers?  Um primeiro aspecto que ele levanta em relação à narrativa do Prof. Blanchard diz respeito ao seguinte: as taxas de juros reais irão ser significativamente maiores do que a metade de um por cento, que o FED identificou presentemente como sendo a taxa de juros real neutra (**)?

Ele observa que mesmo que o FED tenha elevado a taxa de juros recentemente, a economia não diminuiu tanto quanto se esperava, o que poderia levar a considerar que a taxa de juros neutra seria maior temporariamente; mas não há razão para pensar que tudo é temporário, ou que a demanda é menos sensitiva aos juros. Logo, ele passa a pensar em outras questões.

As três questões para serem repensadas são: risk seeking (busca de risco), poupança e investimento.  Para ele o spread (diferença) entre a “earnings price ratio” (índice preço/lucro – métrica que compara o preço de uma ação de uma empresa aos seus lucros líquidos anuais) e as taxas de juros está num épico baixo, e que outras categorias de estimativas empíricas de “equity risk premium” (prêmio de risco de ações) estão abnormalmente baixas, e não altas. A mesma coisa é verdade com respeito aos spreads de crédito, e que a mesma coisa é verdade com respeito a múltiplos no estado real, sugerindo que o mercado está agindo como se existisse baixa aversão ao risco, e não alta aversão ao risco, o que, ceteris paribus (outras coisas permanecendo constantes) significa taxas seguras mais altas. Logo, como tais medidas são de longo prazo, e não de curto prazo, um julgamento a ser feito sobre prêmios de risco aponta em direção a altas taxas, e não baixas taxas.

Com relação à poupança, ele recorda que o Prof. Blanchard enfatiza que a expectativa de vida das pessoas está crescendo, o que. ceteris paribus, aumenta a poupança. No entanto, o Prof. Summers nota que a tendência em direção ao aumento da expectativa de vida diminuiu substantivamente, e que o que é relevante é a expectativa de vida relativa à idade de aposentadoria, e que depois de uma grande mudança, a participação da força de trabalho das pessoas mais velhas está tendendo para cima significativamente nos EUA.

Finalmente, no que diz respeito ao investimento, o Prof. Summers acredita que teremos mais “green investment”, e se não o tivermos, teremos mais “brown investment”.  Para ele a taxa de obsolescência do estoque de capital está crescendo por razões relacionadas com resiliência.  Logo, para ele o investimento não ficará baixo. Por estas razões ele acredita estar mais cético de que voltaremos ao estado de “estagnação secular”.

Concluindo, se a taxa de juros real nos EUA for para a faixa geral de 2% pela maioria do tempo como medida pela Fed Funds Rate, ele não chamaria isso de estagnação secular porque isso não seria tal como qualquer coisa que ele estava falando no período pré-pandemia.  Sendo assim, segundo suas palavras “o Prof. Blanchard diria que nós estaríamos num mundo de (r) perto de (g), um mundo (r) – (g)”.  Logo, ele não acha que seus desacordos com o Prof. Blanchard são terrivelmente fundamentais.

Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre estagnação secular, não hesite em nos contatar!

(*) Advogados da teoria da estagnação secular expressam pouca preocupação com o crescimento da dívida do governo.

(**) A taxa de juros real neutra é o nível da taxa de juros real em que a política monetária não é nem contracionista nem expansionista.

(Figura desenvolvida com a ajuda do Dall-E 2, um sistema de Inteligência Artificial que cria imagens realistas e arte a partir de uma descrição de linguagem natural)

*José Carlos Cavalcanti é economista e professor na Universidade Federal de Pernambuco

Leia também:

José Carlos Cavalcanti: A “Estagnação Secular” está ultrapassada ou não (1)?

José Carlos Cavalcanti: O papel do Banco Central

- Publicidade -
- Publicidade -

Mais Notícias

- Publicidade -