O mercado de trabalho brasileiro vem sendo fortemente afetado nos anos recentes, impactado pela crise econômica que eclode em 2015, ao mesmo tempo em que avançam os impactos de novos padrões técnicos de produção – em especial a aceleração da passagem para a era digital – e em que o mercado de trabalho passa a conviver com menos regulação, em especial como resultado da reforma trabalhista. Por sua vez, no início da atual década, a pandemia atinge fortemente os serviços, que respondem por 70% do PIB nacional e,, além do seu alto peso, é um forte empregador.
Pernambuco está inscrito neste contexto, onde os serviços representam 75% da sua economia. Mas os dados disponíveis chamam particular atenção para o que acontece no Estado, que passa a exibir um elevado índice de desemprego, situando-se bem acima da média nacional.
Uma pergunta, portanto, está nos instigando: o que ocorre no mercado de trabalho estadual que explicaria tal comportamento?
Neste primeiro quadrimestre de 2022, os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged), que registra o emprego formal, variável que vem mostrando tendência à recuperação no país após as ondas mais fortes da pandemia, revelaram um péssimo desempenho de Pernambuco. Como é um dado para um quadrimestre apenas, fica fácil explicar, por uma característica estrutural da economia estadual (que Alagoas também tem): a sazonalidade do emprego no complexo sucroenergético. Embora ele tenha perdido peso relativo no PIB e nas Exportações estaduais, se mantém como importante empregador, tanto na atividade agrícola quanto na industrial.
No quadrimestre inicial de 2022 foram queimados 18.812 postos de trabalho neste complexo econômico. O comércio varejista é o outro grande segmento que apresentou saldo negativo (3.804 postos a menos), o que é comum em começo de ano, por conta das contratações extras feitas para o período de vendas nas festas de final de ano. Além do que, esta atividade está com dificuldade de se recuperar do impacto negativo sofrido pela pandemia, exibindo taxas de crescimento abaixo da média nacional, sendo negativamente atingido pelo aumento da inflação e da queda do poder de compra da população. Os demais segmentos da economia estadual ampliaram o número de postos de trabalho (15.677 a mais).
O desafio maior é compreender o que vem ocorrendo no mercado de trabalho estadual nos anos recentes e especialmente, porque a taxa de desemprego se ampliou tanto no Estado, superando sempre a média nacional, como mostra o gráfico a seguir:
Brasil e Pernambuco: evolução da taxa (%) de desocupação das pessoas de 14 anos ou mais -1º trim. de 2012 ao 1º trim. de 2022
Uma primeira e importante constatação é a de que isso não se deve a uma deterioração da base econômica estadual, posto que a economia pernambucana vem exibindo capacidade de resistir melhor à crise que atinge o país, exibindo taxas superiores à média nacional, como expressa o gráfico da trajetória do comportamento da atividade econômica nacional e estadual (medida pelo PIB), vista a seguir.
Brasil e Pernambuco- evolução do comportamento do PIB – 2015 a 2021
Isso porque, sendo surpreendida na fase final de um excelente ciclo expansivo, vivenciado na primeira década dos anos 2000 e na primeira metade da segunda década, a economia local resiste bem.
Na fase imediatamente anterior, o Estado captou um bloco de investimentos muito grande e marchou na contramão de tendência nacional de desindustrialização, fortalecendo e renovando sua indústria de transformação ao mesmo tempo em que sua base agropecuária também se reorganizou positivamente e importantes polos de serviços se ampliaram e se fortaleceram, com destaque para a consolidação do Porto Digital (engate pernambucano nos novos tempos mundiais), da ampliação e interiorização dos polos de serviços comerciais, educacionais, de saúde e de logística – onde se destaca o papel de Suape, ao lado do avanço da produção dos Serviços Industriais de Utilidade Pública (SIUP) baseado na oferta de energias limpas e renováveis, como a eólica e solar, que contribuem para a transição energética mundial – para citar exemplos mais evidentes.
Numa próxima oportunidade, vamos procurar analisar com mais detalhe traços relevantes da dinâmica do nosso mercado de trabalho, para identificar elementos explicativos deste instigante comportamento da realidade pernambucana.
Para iniciar e estimular esta reflexão chama a atenção a estabilidade do volume da ocupação total nos últimos dez anos: entre 2012, ano anterior à crise nacional, e este início de 2022. Segundo o IBGE, Pernambuco somava 3,543 milhões de pessoas ocupadas (com carteira, sem carteira e trabalhando por conta própria) no inicio de 2012 e este é praticamente o mesmo volume registrado no primeiro trimestre de 2022 (3,531 milhões). Não se trata de queda no total dos ocupados!
Portanto, as principais dificuldades para entrar e permanecer no mercado de trabalho e a explicação mais precisa sobre o comportamento recente da desocupação precisam ser identificadas com um mergulho no interior do nosso mercado de trabalho. Nele, por exemplo, o emprego com carteira assinada recua ao mesmo tempoem em que avança o trabalho por conta própria, sobretudo nos anos da pandemia.
E o comportamento da renda do trabalho obtida pelas famílias é variável central para entender o “paradoxo” pernambucano recente.
Aprofundemos as análises nesta direção!
Tania Bacelar é economista, sócia-diretora da Ceplan Consultoria Econômica
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