De autoria do Senado e aprovado em julho pela Câmara dos Deputados, o Fundo de Investimento em Infraestrutura Social (FIIS) sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na última sexta-feira (2), em cerimônia no Porto de Pecém, no município cearense de São Gonçalo do Amarante, inclui mecanismo que pode destravar a ferrovia Transnordestina. A expectativa é de que o novo fundo arrecade cerca de R$ 10 bilhões, com R$ 3,6 bilhões previstos para serem aplicados na ferrovia.
“A Transnordestina é a maior obra de infraestrutura do Nordeste. E vamos fazer os três braços: Piauí, Ceará e Pernambuco. Integrar a região é um compromisso. O governo passado abandonou Pernambuco na estratégia de desenvolvimento, corrigimos esse equívoco. Com esse novo aporte, a gente prevê que até 2027 concluímos a obra, mas esse evento é um convite para concluir ainda neste mandato do presidente Lula”, disse o ministro dos Transportes, Renan Filho.
Essas obras devem ter início imediato no trecho cearense, segundo Renan Filho. “Estão na boca do jiqui”, disse ele durante a cerimônia em Pecém, fazendo referência a uma expressão nordestina. Jiqui é um cesto usado para carregar caça e pesca. O trecho inicial dessa retomada, informou o ministro, vai de Quixeramobim a Quixadá, é estimado em 50 quilômetros e vai demandar R$ 750 milhões, sendo R$ 600 milhões oriundos do BNDES.
As obras passam pelo Porto de Pecém e incluem passarela para conectar os navios de carga aos trilhos da ferrovia, segundo informou o presidente da Transnordestina Logística (TLSA), controlada pelo grupo CSN, Tufi Daher Filho.
O executivo afirmou ainda, durante a cerimônia, que o trecho anunciado pode ser apenas o primeiro passo para que a ligação entre Piauí, Ceará e Pernambuco, parte mais audaciosa das próximas etapas das obras, seja concluída antes de 2027, como previsto, e coincida com o fim do atual mandato de Lula, em 2026. “Nós vamos concluir porque o senhor é um obstinado. E eu também”, disse Daher Filho, dirigindo-se a Lula.
Obra nos trilhos com o FIIS
Parte dessa confiança se deve ao novo formato de investimentos criado pelo FIIS. A lei sancionada determina que os recursos virão de dotações orçamentárias, empréstimos com instituições financeiras nacionais e internacionais, convênios com a administração pública e de outras fontes.
O fundo deverá ser administrado por um comitê gestor coordenado pela Casa Civil da Presidência da República, conforme regulamento, e terá como agente financeiro o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
O projeto determina que os recursos do fundo poderão financiar a educação infantil, a educação fundamental e o ensino médio; a atenção à saúde pública primária e especializada; a melhoria da gestão da segurança pública, além de outras atividades definidas pelo comitê gestor.
Segundo a Câmara dos Deputados, para ajudar a financiar a conclusão da ferrovia Transnordestina, o projeto também permite ao Banco do Nordeste (BNB) renegociar termos, prazos e demais condições financeiras de empréstimos cujos riscos são suportados, parcial ou integralmente, pela União, podendo inclusive realizar novos desembolsos.
Estão previstos repasses no valor de R$ 1 bilhão por ano entre 2024 e 2026, e mais R$ 600 milhões em 2027. O dinheiro permitirá a conclusão de mais de mil quilômetros de trilhos que correspondem a três trechos próximos ao Porto do Pecém, e as obras serão tocadas pela concessionária TLSA.
Porto de Pecém beneficiado
O governador do Ceará, Elmano de Freitas, destacou que as novas obras estão interligadas a outro projeto sancionado pelo presidente Lula na última sexta-feira: o Marco Legal do Hidrogênio de Baixo Carbono. Este projeto inclui a adaptação do Porto de Pecém à nova fonte de energia. Parte da produção do chamado hidrogênio verde naquele porto será conectada a outras regiões pela Transnordestina. “O povo do sertão do Ceará vai transformar sol em energia e poder usar essa produção para ter renda”, afirmou o governador.
As obras da Transnordestina retomaram o ritmo acelerado em 2023, com a volta de investimentos federais. O empenho do governo é para que a entrega da Fase 1 da ferrovia ocorra até 2027 e até 2029 a Fase 2. O empreendimento é considerado estratégico para o transporte de grãos, fertilizantes, cimento, combustíveis e minério, principalmente com fins de exportação, alavancando a balança comercial brasileira.
O que é a Transnordestina
O projeto da Transnordestina conta com 1.209 quilômetros de extensão na linha principal, que liga Eliseu Martins, no Piauí, ao porto do Pecém, no Ceará, passando por Salgueiro, em Pernambuco. Também estão previstos 548 quilômetros de trilhos partindo de Salgueiro em direção ao Porto de Suape, em Pernambuco. Este braço da ferrovia havia sido excluído do contrato de concessão na gestão anterior. Em 2023, o governo federal decidiu pela inclusão do traçado no Novo PAC e agora há previsão de que sejam destinados R$ 450 milhões para este ramal.
O Ministério dos Transportes, por meio da Infra S.A., publicou o edital de contratação da empresa que será responsável pelo projeto executivo de engenharia para implantação desse trecho pernambucano em abril deste ano. Uma vez concluída, esta parte da ferrovia vai permitir o escoamento de produtos do Agreste de Pernambuco e da região do Araripe, importante polo gesseiro. O ramal ainda é considerado fundamental para a economia dos estados vizinhos da Paraíba e Alagoas.
Lembrança de Lula
O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, por sua vez, afirmou que a obra entrou em seu radar pessoal em 1989, quando da primeira campanha à Presidência de que participou. Em conversa com o ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes, durante viagem de avião, Arraes teria dito da importância do projeto. “Eu fiquei com aquilo na cabeça”, afirmou Lula, durante o discurso em Pecém. A partir de seu primeiro mandato, lembrou, foram dezenas de reuniões com governadores e parlamentares para dar início às obras, sempre às voltas com interesses e interpretações diferentes. “Era um inferno”, disse. Com o avanço das negociações e com a feitura de marcos legais, com participação do Congresso, Lula viu o projeto ganhar fôlego. “Imaginei que ia ser inaugurada em 2012”.
O presidente da República havia recordado que a história da Transnordestina é longa e, como de praxe na prática política quando os assuntos envolvem mais de um ente federativo, cheia de percalços. O primeiro registro, no século 20, da necessidade de construir a ferrovia foi atribuído a Celso Furtado, em 1956, segundo lembrara o ministro Renan. Pequenos trechos foram construídos, alguns abandonados, desde então.
Depois de deixar a Presidência e da turbulência política que se seguiu a partir de 2016, as obras que estavam em andamento foram paralisadas. Tanto Lula quanto ministros que falaram durante o encontro no Porto de Pecém asseguraram confiança de que, a partir de agora, o projeto vai caminhar para sua conclusão.
*Com informações da Agência Gov
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