Numa Super Quarta sem grandes surpresas na economia, apesar do cenário internacional altamente volátil, o setor produtivo fez críticas severas à “política contracionista” do Banco Central, enquanto os especialistas chamaram atenção para eventuais impactos da inflação persistente e juros altos, nos EUA, sobre o Brasil.
No mercado interno, o Comitê de Política Monetária do BC (Copom) cortou a taxa básica de juros pela 3ª vez seguida, fazendo a Selic recuar para 12,25%. Nos Estados Unidos, o Comitê de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) do Federal Reserve, o Banco Central dos Estados Unidos, decidiu novamente manter os juros básicos da economia do país. A taxa oscila dentro de uma banda entre 5,25% e 5,50% ao ano desde julho.
CNI critica política monetária contracionista
Sobre a decisão do Copom, o presidente da CNI, Ricardo Alban, que acabou de assumir o cargo, cobrou de forma contundente mais celeridade na redução dos juros básicos pelo BC. “Consideramos a decisão do Copom compreensível, mas insuficiente, criticou. Segundo ele, o setor, “mantido o cenário de controle da inflação, espera que sejam realizados novos e mais intensos cortes nas próximas reuniões”.
“A queda atual da Selic não é suficiente para impedir custos adicionais e desnecessários em termos de atividade econômica. Tenho a plena convicção de que a queda de juros não está na velocidade que nós precisamos. Na verdade, estamos em uma armadilha, porque a nossa taxa Selic atingiu um patamar bastante desestimulante”, aponta.
“Entendo que não é possível fazer uma queda abrupta, mas o Banco Central poderia ser um pouco mais desafiador e ter iniciado uma redução mais acelerada, considerando que nossos juros reais, apesar dos cortes da Selic, se mantém em 8,5% ano”, dispara.
Tendências destaca ambiente internacional negativo
Economista sênior e sócio da Tendências Consultoria, Silvio Campos Neto adverte que “o comunicado pós-reunião trouxe como destaque uma avaliação mais negativa do ambiente internacional, que desde a reunião passada apresentou um quadro de juros de mercado mais pressionados e elevação de tensões geopolíticas”.
Por outro lado, “o recente ruído ligado ao tema fiscal não trouxe mudanças no trecho que trata do assunto, com o BC apenas reiterando a importância de se perseguir as metas fiscais estabelecidas”, minimiza.
Guerra gera incerteza na economia
Já o economista Rafael Lima, da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo de Pernambuco (Fecomércio-PE), acredita que “o Copom tomou a decisão correta e esperada, mesmo diante das incertezas sobre os impactos econômicos que poderão ser gerados pela continuidade da guerra entre Israel e o Hamas”.
“Ainda é cedo para avaliar a intensidade dos impactos que o conflito de Israel e Hamas possam ter na economia brasileira. Até porque não sabemos o nível da escalada dos eventos e por quanto tempo mais ele pode durar”, analisa.
“Além disso, a alta do preço do petróleo já ocorria antes mesmo do conflito no Oriente Médio. O que pode ser, no futuro, um obstáculo para novos cortes da Selic. A escalada da violência na região de Israel, de fato, pode pressionar o preço dos combustíveis e alertar para a inflação do ano que vem“, avalia.
Segundo o especialista, a inflação atual nos Estados Unidos é motivo de preocupação para os brasileiros. “Essa persistência pode afetar a economia brasileira por meio de pressões nos preços das commodities, como milho, soja, petróleo e pela manutenção dos juros altos nos Estados Unidos, o que pode ter um efeito negativo no câmbio e nos investimentos dos países emergentes”, aponta.
Sobre os impactos da fala do presidente Lula, descartando o déficit zero nas contas públicas em 2024 que era um compromisso do ministro Fernando Haddad (Fazenda), Rafael Lima destaca que a declaração pode afetar a confiança dos investidores e a credibilidade do governo, levando a uma fuga de capital e a pressões na taxa de câmbio.
“Seria um panorama bastante desfavorável, dificultando o avanço no plano de cortes da taxa de juros do Banco Central, colocando uma redução nesse ritmo. Mas, se a inflação se mantiver em desaceleração pode permitir que o Copom mantenha o ritmo planejado pelo menos até dezembro. Ano que vem já vai ser outra sintonia, difícil de prever no momento”, destaca.
Juros altos nos EUA: sinal de alerta para economia
Felipe Moura, sócio na gestora de investimentos Finacap (Recife), chama a atenção para a previsibilidade dessa nova decisão do Copom, mas também para o sinal de alerta em relação aos Estados Unidos que faz parte do boletim desta quarta-feira.
“O corte de meio por cento já era esperado e amplamente antevisto pelo mercado. No comunicado, também não tem nenhuma grande novidade. Mas vale a pena destacar que o BC pontua o cenário exterior como mais desafiador. E aí claramente interpreto como uma menção às taxas de juros americanas que atingiram os valores mais altos desde a crise de crise financeira de 2007”, adverte.
“Então, obviamente que, nesse momento, não se tem clareza desse cenário, pois a principal taxa de juros global se encontra no patamar máximo das últimas décadas. Mesmo assim, o BC, no comunicado, deixa contratado mais um corte de meio ponto para a próxima reunião, o que deve se concretizar”, afirma.
O especialista destaca que “a dinâmica doméstica melhorou muito com a inflação relativamente comportada nos últimos meses”. “Então, o grande balizador para o que vai acontecer na economia brasileira, em especial, na taxa de juros básica, vão ser as taxas de juros norte-americanas”, finaliza.
PPK vê economia com juros em queda até 2024
Mais otimista, o economista João Rogério Filho, sócio na consultoria PPK, aposta na manutenção da trajetória de queda na taxa básica de juros até o final de 2024. “Os cortes devem se suceder nas próximas reuniões do Copom e serão acompanhados por redução na taxa de juro real”, prevê.
Sobre as instabilidades nos humores do mercado causadas pelas declarações desastrosas do presidente Lula em relação às finanças públicas, João Rogério vê um efeito limitado, sem grande alcance. “Os comentários do presidente da República em relação a déficit fiscal estão muito mais atrelados à verborragia do que a uma mudança na condução da política econômica brasileira”, opina.
“O próprio ministro Haddad fez afirmações bastante contundentes e tranquilizadoras ao mercado financeiro. De forma que, independente do que diz o presidente e da repercussão disso, está mantido o consenso de que a trajetória de queda de juros é muito importante para o reaquecimento da economia, incentivo ao investimento e estímulo ao consumo particularmente nesse final de ano”, conclui.
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