A geração hidrelétrica está perdendo espaço no debate público sobre transição energética no Brasil. O alerta é de Charles Lenzi, presidente-executivo da Abragel (Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa). Segundo ele, o país utiliza apenas 30% do seu potencial para instalação de hidrelétricas de médio e pequeno porte.
No entanto, de acordo com a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), o Brasil tem potencial identificado para geração de 23.000 MW (megawatts), embora conte com uma produção limitada em 6.500 MW.
Em entrevista ao Poder360, Charles Lenzi disse que o Brasil não pode “perder o estado da arte” de projetos de geração de energia. Para o executivo, o país se tornou referência em “energia limpa” justamente por causa dos investimentos feitos em hidrelétricas em anos passados.
Modismo renovável
Lenzi ressalta que o primeiro ano do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi marcado por uma vontade do governo em incentivar a geração de energia renovável, mas houve pouquíssimos movimentos de fomento a projetos de hidrelétricas.
Para o executivo, as fontes eólica e solar dominam o vocabulário do governo quando se fala sobre transição energética “porque são discursos importados de países europeus”, que não tem o mesmo potencial brasileiro para desenvolvimento de fontes hidráulicas.
Lenzi afirmou que é importante investir nesses projetos intermitentes, que trazem consigo também o desenvolvimento tecnológico, mas é ainda mais necessário que o Brasil priorize a exploração do seu potencial hidrelétrico antes de acelerar os investimentos em outras fontes. “A solução não vai ser só eólica e solar, não tem como. A gente precisa ter uma fonte que dê a sustentabilidade à nossa geração elétrica”, declarou.
“Não foi um ‘jabuti’”
O PL (projeto de lei) 11.247 de 2018, que tem como principal objetivo regulamentar a exploração de energia eólica nas costas marítimas brasileiras, foi aprovado na Câmara em 29 de novembro de 2023 com um dispositivo que obriga a contratação de 4.900 MW de energia produzida por PCH (Pequenas Centrais Hidrelétricas).
Na época, esse foi um dos dispositivos apontados como “jabuti” (trecho que não têm relação com o texto original). Porém, na visão de Lenzi, esse trecho foi um dos poucos movimentos do congresso na direção de uma política pública para o desenvolvimento dessas matrizes.
Além disso, o dispositivo funciona como um ajuste do mercado e mais um avanço na transição energética, pois essa energia contratada substituiu a produzida por térmicas.
O projeto agora tramita no Senado. “Esse projeto definiu uma política pública para o segmento de pequenas hidrelétricas e a gente acompanha com muita expectativa e muito otimismo que agora no Senado também seja referendado. O projeto traz a contratação de pequenas centrais em substituição a fontes de geração térmica e isso traz um benefício para o país no sentido de transição energética”, disse Lenzi.
Retomada das hidrelétricas
O especialista também disse que o Congresso e o governo deveriam se debruçar na retomada de projetos de usinas hidrelétricas com reservatórios. A última usina com reservatório significativo que entrou no sistema elétrico foi a de Serra da Mesa, em 1998.
Depois o país priorizou usinas a fio d’água, que geram energia apenas com o fluxo natural do rio, sem ocorrer o armazenamento em grandes lagos. Para o executivo, os empreendimentos com reservatórios são essenciais para assegurar a segurança energética do país em meio à entrada cada vez maior de fontes intermitentes no sistema. Ele explicou que as usinas de fio d’água são mais suscetíveis a épocas de seca, o que tem provocado problemas no sistema elétrico periodicamente.
“Devemos voltar a investir em hidrelétricas com reservatório, pois isso é muito importante, não só para o setor hidrelétrico, mas para o país, para que a gente possa inclusive expandir nossa matriz usando fontes intermitentes de uma maneira robusta”, disse
Lenzi.
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