Organização Internacional do Trabalho, Pacto Global das Nações Unidas e Fundação Getúlio Vargas são parceiros do Ministério Público do Trabalho para regularizar as condições de trabalho no Sertão do Araripe de Pernambuco
Etiene Ramos
O polo gesseiro do Sertão do Araripe de Pernambuco, responsável por 90% do gesso produzido no país, ganhou um forte aliado para a promoção do trabalho decente em seu território: o Plano de Desenvolvimento Local Gesso 2030 (PDL Gesso 2030). O documento é resultado da fiscalização mais ostensiva, a partir de 2015, do Ministério Público do Trabalho (MPT), que assegurou a parceria da Organização Internacional do Trabalho (OIT), do Pacto Global das Nações Unidas e da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a fim de mobilizar agentes públicos e privados para melhorar as condições de trabalho e garantir a distribuição da riqueza gerada na região aos trabalhadores.
Para o coordenador do Grupo de Trabalho do Gesso e vice-procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho (MPT) em Pernambuco, Rogério Sitônio, a implementação do PDL começa com a articulação, conscientização e engajamento de todos os atores do polo para acompanhamento e cobrança das ações pelo trabalho decente nas empresas. No lançamento virtual, nesta quarta (26), a participação dos representantes do Sindicato da Indústria do Gesso de Pernambuco (Sindusgesso-PE) e do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Prospecção, Extração e Beneficiamento de Minerais de Sergipe, Alagoas, Pernambuco e Piauí (SindMina), mostrou que há convergência da cadeia produtiva em torno do objetivo.
“O crescimento econômico e social da região passa pelo desenvolvimento e manutenção deste setor produtivo. O sindicato se coloca como um parceiro de toda e qualquer iniciativa que venha somar esforços para melhorar a qualidade das condições de trabalho e garantir a manutenção das empresas do polo gesseiro e o PDL Gesso 2030 é uma importante ação conjunta das instituições”, declarou a presidente do Sindusgesso-PE, Ceissa Campos, em nota enviada ao Movimento Econômico.
As fiscalizações na região eram derivadas de denúncias que chegavam ao núcleo do MPT em Petrolina, maior cidade do Sertão, mas com base neste trabalho embrionário, a partir de 2015, o MPT passou a realizar fiscalizações, sistematicamente, em calcinadoras, mineradoras e empresas que produzem placas. Daí em diante, 288 empresas foram fiscalizadas e o MPT ajuizou 249 acordos. Falta de registro em carteira de trabalho, de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), instalações irregulares com riscos de incêndio e acidentes laborais foram as principais irregularidades encontradas.
“Com o tempo vimos que só ajuizar ações não transformaria um cenário onde havia outros problemas como a poluição causada pelo pó do gesso, o descarte dos rejeitos sem tratamento e o desmatamento da caatinga, na área ambiental; e a subnotificação de doenças decorrentes das más condições de trabalho, mesmo com a alta incidência de problemas respiratórios e acidentes, por desconhecimento dos profissionais de saúde”, declara o coordenador.
Segundo ele, já há um avanço em relação à saúde e segurança do trabalho, inclusive nas empresas de menor porte, onde a informalidade é alta e as irregularidades são mais frequentes, não só pela falta de recursos como de conhecimento do que é preciso fazer. “A melhora só virá com uma mudança de cultura para o trabalho seguro, que não adoeça e traga riqueza para todos. As questões não serão resolvidas em poucos anos. Alguns pontos vêm melhorando com fiscalizações permanentes. Com a pandemia elas estão paradas e esperamos que sejam retomadas assim que for possível”, declara Rogério Sitônio.
Coordenadora do Programa de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da OIT no Brasil, Maria Cláudia Falcão, ressalta que só o diálogo entre todos os atores da cadeia produtiva do gesso, nas esferas pública e privada, pode mobilizar um amplo processo em torno de soluções e que começa agora com o PDL Gesso 2030. “Não são apenas questões sociais, temos que pensar em fatores econômicos, aumentar a produtividade com a melhoria dos Arranjos Produtivos Locais para ampliar os ganhos e garantir melhorias também nas condições de trabalho”, afirma.
Segundo ela, o plano teve apoio e foi validado pelas instituições “que sabem mais do que a gente para dizer o que pode ser feito” a fim de mitigar problemas identificados no polo gesseiro pela OIT em 2017 como o trabalho infantil, até então desconhecido pelo MPT. “Geramos propostas no PDL para que as instituições possam se guiar na hora de lançar projetos e fazer um trabalho articulado. O setor privado e o público não vão resolver sozinhos, cada um no seu quadradinho”, observa.
Para a coordenadora, a segunda etapa, a da implementação, é a mais importante, e a presença da vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos, e do deputado federal Túlio Gadelha no lançamento do PDL, foram interessantes porque o polo gesseiro é uma riqueza que Pernambuco possui e precisa usufruir, em favor de sua população. “Os municípios do polo produzem 90% do gesso nacional e são muito pobres, algo não fecha. Há muita sonegação, que perpassa pela área social, além das questões ambiental e energética que precisam ser resolvidas, por todos”, avalia.