Mudanças nos processos de inspeção e liberação para produtos de origem animal mudaram em setembro e, desde então, tempo para a liberação de cargas mais que dobrou, elevando consideravelmente os custos
Por Patrícia Raposo*
Os preços da carne estão elevados e há vários fatores que contribuem para esse cenário, como a alta do dólar que estimula exportações reduzindo a oferta nacional, a inflação, o baixo consumo devido à crise econômica, entre outros. Mas existe um que há pelo menos cinco meses vem impactando fortemente no preço final do produto, em especial para o nordestino. Trata-se de uma mudança imposta pelo Ministério da Agricultura (MAPA) nos processos de inspeção e liberação das carnes importadas.
Até 31 de agosto, o importador registrava a Declaração Agropecuária de Trânsito (DAT) no Sistema de Informações Gerenciais do Trânsito Internacional de Produtos e Insumos Agropecuários (Sigvig). Esse processo era descentralizado, cada localidade de entrada tinha sua equipe de inspeção e liberação para todos os produtos de origem animal.
Quando a mercadoria chegava aos portos, aeroportos ou na fronteira, os fiscais locais faziam a análise da mercadoria, documental e de laboratório. Ao ser liberado, o produto ia para a empresa, onde passava por uma reinspeção feita pelo fiscal do MAPA. Todo o processo levava de 3 a 5 dias.
Mudança
Desde 1º de setembro de 2021, porém, esses processos passaram a ser feitos pelo sistema LPCO (Licenças, Permissões, Certificados e Outros Documentos), uma nova metodologia, integrada com o Portal Único de Comércio Exterior, que permite ao usuário requerer o tratamento administrativo pelo MAPA nas operações de importação. Toda documentação é inserida no LPCO, onde ocorre um sorteio virtual para escolher aleatoriamente um fiscal que cuidará do processo.
Desta forma, a inspeção e liberação de mercadorias que chegam a Pernambuco, por exemplo, passaram a ser feitas por fiscais que podem estar no Rio de Janeiro, Paraná ou Manaus. E vice-versa. Só que agora, o tempo médio para liberação subiu consideravelmente.
“O gargalo está no momento que damos entrada no LPCO. Até fechar o processo, leve uns 15 dias. Já tivemos cargas retidas por 30 dias. Hoje, quando olho aqui no meu sistema, a última análise feita para as mercadorias data de 5 de janeiro”, desabafa um importador de Pernambuco. Ele diz que quando adequação semelhante ocorreu na Agência de Vigilância Sanitária ( Anvisa), o tempo de ajuste não passou de dois meses e com o MAPA era esperado algo semelhante. “Mas já se passaram cinco meses e nesse período nossos custos subiram 70%”, reclama.
Essa alta dos custos impacta no preço final da carne. Alguns cortes já tiveram majoração de 20%. Várias reuniões foram feitas com o MAPA, que prometeu agilizar os processos. “Percebemos que houve um ganho de agilidade nas fronteiras, porque é muito feio ver aquela fila de caminhões aguardando liberação para entrar no Brasil. Nos aeroportos também acelerou um pouco. Mas nos portos, onde ninguém vê a carga porque ela fica retida em contêiner, o processo continua do mesmo jeito. E aqui no Nordeste a situação fica ainda pior, porque não temos fronteira com nenhum país e a lentidão tem elevado nossos custos”, disse o importador.
Tecon
Manter a carga retida em contêiner é realmente um problema, visto que o preço da tabela pública no Terminal de Contêiner do Porto de Suape (Tecon Suape), por onde entra produtos de origem animal importados, praticamente dobrou. Os descontos sumiram e o custo de armazenamento que era de R$114,00 a diária saltou para R$ 380,00. Já o valor do monitoramento à frio, foi de R$ 180,00 para R$ 340,00 por dia.
“O problema é que o Tecon Suape é o único habilitado a fazer processos de reinspeção para importação e exportação. A nossa carga, por ser congelada, precisa de refrigeração, tanto utilizamos o armazenamento quanto o monitoramento de refrigeração”, diz outro grande importador pernambucano, que traz carnes da Argentina, Uruguai e Austrália e pescados da China e Noruega para distribuir na região .
O Movimento Econômico procurou a direção do Tecon Suape. Em nota a empresa respondeu o seguinte: “Os preços praticados pelo Terminal em tabela pública estão em conformidade com o estabelecido pela Antaq e aprovados pelo referido órgão regulador. Eles são competitivos se comparados aos demais terminais de contêineres do Brasil. Além disso o Tecon Suape possui uma excelente infraestrutura, capital humano e certificados para atender de forma satisfatória à demanda, imprimindo necessária fluidez à logística da carga conteinerizada”.
Multas
Mas, além dos custos tarifário e da perda de oportunidade por ter o produto retido, os empresários apontam outro. “Há também a multa que deve ser paga ao dono do contêiner quando excedemos o prazo contratado, que para nós ficou totalmente incerto”, comenta um outro importador, que traz pescados do Chile e carne do Cone Sul. Realmente parece que “os preços subiram de elevador e vão descer de escada”, reclamou um empresário.
A assessoria de Imprensa do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento foi procurada pela reportagem mas até o fechamento desta edição não respondeu aos esclarecimentos.
*Colaborou Etiene Ramos