Fonte: Agência Câmara de Notícias
A Câmara dos Deputados aprovou, nesta quinta-feira (11) emendas do Senado ao Projeto de Lei 2308/23, que regulamenta a produção de hidrogênio considerado de baixa emissão de carbono (hidrogênio verde), instituindo uma certificação voluntária e incentivos federais tributários. O texto segue para sanção presidencial.
Uma das principais mudanças propostas é o aumento da quantidade de dióxido de carbono por quilograma de hidrogênio produzido a partir da fonte de energia utilizada para obter o hidrogênio. Enquanto o texto da Câmara previa um índice igual ou menor a 4 Kg de CO2, o Senado aprovou 7 Kg. Outra mudança retira a previsão de diminuição gradativa desse limite a partir de 2030.
Também foram aprovados o fim de percentual máximo de exportação do hidrogênio para a empresa obter benefícios fiscais; e a fixação em lei de limites máximos de subvenção fiscal para obtenção e comercialização do hidrogênio.
As emendas do Senado contaram com parecer favorável do relator, deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP). Ele ressaltou que a modificação do Senado vai possibilitar produzir hidrogênio a partir de biocombustíveis. “A maior parte do hidrogênio que o mundo produz é a partir de combustíveis fósseis. Toda rota que esta legislação prevê é hidrogênio de baixa emissão de carbono”, explicou.
Arnaldo Jardim afirmou que o Ministério de Minas e Energia concordou em enviar a cada seis meses um relatório da utilização do Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (Rehidro). A pasta também enviará um plano de trabalho do regime em até 90 dias da sanção da proposta.
A deputada Adriana Ventura (Novo-SP), uma das autoras da proposta, agradeceu o acordo com o líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), de garantir o envio de informações pelo Executivo. O projeto também tem como autor o deputado Gilson Marques (Novo-SC).
“O hidrogênio é o combustível do futuro, pode ser usado para várias coisas: para transporte, aquecimento, energia elétrica. E tem avançado muito esse mercado em muitos países. No Brasil estamos plantando esta semente”, disse Adriana Ventura.
Já a deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) lamentou que o texto do Senado tenha aumentado o potencial poluidor da produção de hidrogênio. “A lógica da produção de hidrogênio vai ser usada com fontes poluentes”, disse.
Características do hidrogênio de baixa emissão
De acordo com o texto aprovado, será considerado hidrogênio de baixa emissão de carbono aquele que, no ciclo de vida do processo produtivo, resulte em valor inicial menor ou igual a 7 kg de dióxido de carbono equivalente por quilograma de hidrogênio produzido (7 kgCO2eq/kgH2). O aumento atende principalmente aos fornecedores de etanol.
Esse número representa a intensidade de emissão de gases do efeito estufa e deverá ser adotado até 31 de dezembro de 2030.
Outra emenda aprovada excluiu a determinação de tornar o patamar regressivo a partir dessa data, prevendo apenas a permissão de revisão em regulamento.
Eficiência
Com tecnologias atuais de captura e uso ou estoque do carbono (CCUS, na sigla em inglês), até mesmo o uso do carvão chega a 2 Kg de emissão de CO2 se a eficiência de captura for de 90%. Com o gás natural, a captura garante uma emissão cinco vezes menor, de 0,4 kgCO2.
Os parâmetros variam entre países. Um levantamento da Organização das Nações Unidas (ONU) de 2023 mostra que a União Europeia classifica como hidrogênio verde aquele com produção de menos de 4,4 kg de CO2 para cada 1 kg de hidrogênio (H2). Na Alemanha, esse limite é de 2,8 kg de CO2.
A China, por outro lado, classifica como renovável ou limpa a produção que não ultrapassa os 4,9 kg de CO2. Nos Estados Unidos, essa mesma classificação tem limite de 2 kg.
Hidrogênio renovável
Outra emenda aprovada pelos deputados considera, no conceito de hidrogênio renovável, aquele obtido com o uso de fontes renováveis por outros processos produtivos além da eletrólise, seja com o uso de fontes de energia solar, eólica, hidráulica, biomassa, biogás, biometano, gases de aterro, geotérmica, das marés ou oceânica.
A proposta aprovada com as mudanças dos senadores também inclui um conceito de hidrogênio verde como sendo aquele obtido a partir da eletrólise da água com o uso de fontes de energia listadas, desde biocombustíveis até biomassa.
São necessários cerca de 9 litros de água para produzir 1 kg de hidrogênio, produzindo-se 8 kg de oxigênio como um subproduto, que em menor escala pode ser utilizado no setor de saúde ou em maior escala para fins industriais.
Certificação
Apesar de deixar claro que a adesão ao sistema de certificação será voluntária por parte dos produtores de hidrogênio ou de seus derivados, o texto cria o Sistema Brasileiro de Certificação do Hidrogênio (SBCH2).
O certificado atestará a intensidade de emissões de gases do efeito estufa na produção do hidrogênio, devendo os agentes que aderirem cumprirem as regras e a governança.
O sistema contará com uma autoridade competente; uma autoridade reguladora; empresas certificadoras; instituição acreditadora; e gestora de registros.
Enquanto a autoridade competente fixará as diretrizes de políticas públicas relacionadas à certificação, a autoridade reguladora fará a supervisão, estabelecendo padrões e requisitos para a certificação e as responsabilidades e obrigações das empresas certificadoras credenciadas. Essa autoridade também fiscalizará a movimentação do hidrogênio comercializado para verificar sua adequação à certificação.
Como a certificação será concedida por empresas especializadas, a permissão para atuarem (acreditação) será feita pela instituição acreditadora, à qual caberá ainda auditar os certificados de hidrogênio emitidos.
No caso da gestora de registros, ela deverá manter uma base de dados nacional dos certificados emitidos e garantir aos compradores a verificação de sua autenticidade.
Segundo estudo do BNDES, ainda não há um consenso sobre os critérios a serem aplicados nas certificações do hidrogênio verde, renovável ou de baixo carbono, tampouco na forma de medir as emissões no processo de fabricação e distribuição do hidrogênio.
O regulamento deverá especificar quais tipos de emissões de gases do efeito estufa deverão ser considerados; quais etapas do processo produtivo deverão ser abrangidas pelo sistema de certificação (fronteira de certificação); os critérios para suspensão ou cancelamento dos certificados; informação sobre emissão negativa, se houver; e instrumentos de flexibilidade que poderão ser adotados em casos de perda temporária de especificação do hidrogênio.
Por outro lado, a autoridade reguladora deverá prever mecanismos de harmonização junto a padrões internacionais de certificação de hidrogênio, podendo prever regras para reconhecimento de certificado emitido no exterior.
O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) já disciplinou competências e composição do comitê gestor do programa (Coges-PNH2), que conta atualmente com 13 integrantes. O projeto aumenta para até 15, incluindo um representante dos estados e do Distrito Federal; um da comunidade científica; e três do setor produtivo.
Essa autorização poderá ser dispensada por regulamento em razão de volume produzido ou uso do hidrogênio como insumo.
As empresas que produzem o hidrogênio terão prioridade na tramitação de pedidos de autorização para as demais atividades.
Incentivos tributários
O Projeto de Lei 2308/23 estende às empresas produtoras de hidrogênio de baixo carbono incentivos tributários previstos na Lei 11.488/07, concedendo suspensão de PIS, Cofins, PIS-Importação e Cofins-Importação na compra ou importação de máquinas, aparelhos, instrumentos e equipamentos novos e de materiais de construção destinados aos projetos de hidrogênio. O benefício poderá ser usado ainda para os bens alugados.
Esse benefício pode ser usado por cinco anos, contados da habilitação no Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (Rehidro), criado pelo projeto.
Um dos requisitos para habilitação no Rehidro, um percentual mínimo de utilização de bens e serviços de origem nacional no processo produtivo, poderá ser descumprido pelas empresas se não existir equivalente nacional ou quando a quantidade produzida for insuficiente para atender a demanda interna.
Também deverá haver investimento mínimo em pesquisa, desenvolvimento e inovação.
As empresas, inclusive as já atuantes na produção de hidrogênio de baixo carbono, contarão com os benefícios do Rehidro por cinco anos, contados de 1º de janeiro de 2025.
Adicionalmente, poderão ser consideradas co-habilitadas as empresas que atuam nas seguintes áreas:
- acondicionamento, armazenamento, transporte, distribuição ou comercialização de hidrogênio de baixa emissão de carbono;
- geração de energia elétrica renovável para a produção desse tipo de hidrogênio; ou
- produção de biocombustível (etanol, biogás ou biometano) para a produção de hidrogênio de baixa emissão de carbono.
Por outro lado, as empresas optantes pelo Simples Nacional não poderão aderir ao Rehidro, e aquelas que usufruírem dos incentivos deverão manter regularidade fiscal.
Programa
Outra fonte de recursos para incentivar o setor será por meio do Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (PHBC), instituído pelo texto.
Sua finalidade será bancar a transição energética a partir do uso de hidrogênio de baixa emissão de carbono. Entre os recursos previstos estão:
- dotações orçamentárias;
- recursos de doações de entidades nacionais e internacionais, públicas ou privadas;
- empréstimos de instituições financeiras nacionais e internacionais;
- percentual de lucros excedentes das agências financeiras oficiais de fomento do exercício anterior, a ser definido em regulamento.
Total de subvenções
A Câmara aprovou ainda emenda do Senado definindo em R$ 18,3 bilhões o total de subvenções na forma de crédito fiscal a ser concedido pelo governo federal às empresas beneficiárias do Rehidro ou que comprem o hidrogênio produzido por elas.
Esse montante terá limites anuais de 2028 a 2032:
- R$ 1,7 bilhão em 2028;
- R$ 2,9 bilhões em 2029;
- R$ 4,2 bilhões em 2030;
- R$ 4,5 bilhões em 2031; e
- R$ 5 bilhões em 2032.
Para acessar o crédito fiscal, a emenda aprovada prevê um procedimento de concorrência, seguindo critérios como:
- necessidade de relação do valor do crédito com a diferença entre o preço do hidrogênio e o preço de bens substitutos, já que o hidrogênio é mais caro;
- exigência de apresentação de garantia vinculada à implantação do projeto de produção ou ao consumo de hidrogênio de baixa emissão de carbono e seus derivados;
- aplicação de penalidades, inclusive pecuniárias, pela não implementação do projeto;
- prioridade para projetos que prevejam a menor intensidade de emissões de gases do efeito estufa na produção do hidrogênio; e
- prioridade para os que possuam maior potencial de adensamento da cadeia de valor nacional.
Por outro lado, em relação ao PHBC continua no texto a previsão de subvenção econômica na comercialização de hidrogênio de baixa emissão de carbono e seus derivados.
Igualmente, para ter acesso a essa subvenção, as empresas produtoras de hidrogênio de baixo carbono interessadas devem participar de uma concorrência com regras propostas pelo comitê gestor do PHN2. Mas o prazo dessa subvenção poderá ser de dez anos.
Segundo o texto, a política de investimentos do PHBC pretende garantir a rentabilidade, a segurança e a liquidez de suas aplicações e assegurar sua sustentabilidade econômica e financeira para o cumprimento dos objetivos da política de hidrogênio de baixo carbono.
A depender da energia utilizada, da fonte de onde se extrai o hidrogênio, das técnicas empregadas e da existência ou não de captura do carbono, a produção do hidrogênio pode apresentar grande diferença de custo final.
Por fim, para facilitar a desapropriação de áreas nas quais passarão linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica de interesse restrito de agente outorgado para suprir produtores de hidrogênio de baixa emissão de carbono, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) poderá declarar o terreno como de utilidade pública.
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