Setor produtivo avalia que o Programa de Regularização do Simples Nacional e o edital de Transação do Contencioso de Pequeno Valor do Simples Nacional não atende a maioria das empresas
Por Juliana Albuquerque
Em meio a repercussão do veto presidencial à criação do Relp (Programa de Reescalonamento do Pagamento no Âmbito do Simples Nacional), a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional editou, nesta terça-feira (11/1), o Programa de Regularização do Simples Nacional e o edital de Transação do Contencioso de Pequeno Valor do Simples Nacional.
Porem, diferentemente do que ocorreria caso o Relp tivesse sido validado pelo executivo nacional, com concessão de descontos sobre juros, multas e encargos proporcionais à queda de faturamento de março a dezembro de 2020 sobre o mesmo período de 2019, a medida editada nesta terça é válida apenas para os empresários optantes pelo Simples Nacional e microempreendedores individuais (MEI) com dívidas ativas inscritas na União.
Segundo informações do Ministério da Economia, 1,8 milhão de empresas estão inscritas na dívida ativa da União por débitos do Simples Nacional, das quais 160 mil são microempreendedores individuais (MEI). O valor total dos débitos do Simples Nacional inscritos na dívida ativa da União é de R$ 137,2 bilhões.
Leia também:
Governo anuncia medidas para regularizar dívidas do Simples após veto
Mais de 195 mil empresários já pediram adesão ao Simples Nacional
Pelo Programa de Regularização do Simples Nacional, microempreendedores individuais (MEI), microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP) optantes do Simples Nacional terão condições de desconto e parcelamento, como entrada de 1% do valor total do débito, dividido em até oito meses. O restante é parcelado em até 137 meses com desconto de até 100% de juros, das multas e dos encargos legais. Esse desconto deve observar o limite de 70% do valor total do débito. Os descontos são calculados a partir da capacidade de pagamento de cada empresa. A parcela mínima é de R$100,00 ou de R$ 25,00 no caso dos microempreendedores individuais.

De acordo com Flávio Cesário, presidente do Sindicato dos Contabilistas no Estado de PE, devido ao fato de que os programas editados nesta terça serem apenas para quem tem dívida com a União, o alcance termina sendo bem inferior do que se a criação do Relp tivesse sido validada.
“Lógico que tem muitas empresas nesse meio que já estão na dívida ativa, mas acredito que a grande maioria do débito do Simples Nacional é na Receita Federal (RF) e não na dívida ativa, que são os débitos mais antigos e bem anteriores ao período da pandemia. E, no caso da RF, o débito só pode ser parcelado em até 60 vezes no parcelamento simplificado”, explica o contador.

Entre as indústrias, o programa não tem grande alcance. Em Pernambuco, por exemplo, 9 mil empresas do setor enquadradas no regime do Simples Nacional (dados de 2018 da Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco), não serão impactadas pela medida de regularização das dívidas da Fazenda Nacional.
“Apesar de as empresas optantes pelo Simples Nacional serem maioria na indústria pernambucana, se o programa não contempla dívidas contraídas pela pandemia, de fato não tem tanto impacto, já que foi na pandemia onde as empresas tiveram as maiores contrações de dívidas nos últimos tempos”, avalia o economista da Fiepe, Cézar Andrade.
“É essencial para o setor um programa que contemple de forma ampla, não individualizada, um prazo maior para pagamento das dívidas acumuladas ao longo da pandemia, o que seria possível com a edição do Relp, o que não ocorreu. Em nosso setor, mesmo com endividamento grande, cerca de 96% dos empreendedores pretendem obter algum tipo de crédito para equilibrar o fluxo de caixa em meio ao aumento dos custos dos insumos, energia, locação, entre outros pagamentos que só aumentaram ao longo desse tempo, enquanto as receitas diminuem”, comenta o presidente da Abrasel em Pernambuco, André Araújo.

Segundo ele, apesar da retomada intensa da movimentação dos bares e restaurantes após a reabertura das atividades econômicas, o ticket médio e a alta da inflação sobre os insumos, além do aumento dos custos com energia, locação, combustível, entre outros, pesa na manutenção do fluxo de caixa e consequente manutenção do pagamento das linhas de crédito requisitadas pelos empreendedores para manutenção dos seus negócios durante a pandemia.
“Estávamos esperançosos com o reescalonamento dos débitos, uma vez que tanto o endividamento quanto o débito do nosso setor se tornaram enormes para que as empresas conseguissem se manter vivas na pandemia, que eliminou 40% das empresas no setor em todo o Brasil”, revela
De acordo com a 13ª pesquisa de Impacto do Coronavírus nos Pequenos Negócios, realizada pelo Sebrae em parceria com a FGV em novembro de 2021, 66% das empresas estão endividadas, sendo que 28% encontram-se inadimplentes. A mesma pesquisa revela que parte significativa dos custos mensais das empresas está comprometida com pagamento de dívidas: 54% dos pequenos negócios têm 1/3 dos seus custos mensais comprometido com esse item.
“A não existência de um programa de refinanciamento de débitos pode impactar um número ainda maior de empresas e acabar afetando a geração de empregos, por exemplo”, ressaltou o gerente de Políticas Públicas do Sebrae, Silas Santiago.