A aplicação de maiores quantidades de calcário no solo do Matopiba (região situada entre os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) para cultivo de soja tem resultado num aumento de até 30% na produtividade da commodity. É o que apontam os resultados de um novo estudo da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Meio Norte. O processo tem incentivado também uma aceleração da correção do solo da região.
As chamadas “altas doses” são até três vezes maiores que aquelas recomendadas nos documentos oficiais sobre fertilidade do solo, do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). Os resultados indicam que aplicações de calcário entre 10 e 15 toneladas por hectare praticamente neutralizam a toxicidade do solo por alumínio, além de aumentarem as concentrações de fósforo e potássio — micronutrientes importantes para a expansão da fronteira agrícola e aumento da fertilidade.
A solução permite que os produtores tenham um retorno financeiro maior mais rapidamente já que a aplicação de calcário no solo permite com que o plantio da soja seja feito sem a necessidade de um plantio de transição, como explica Henrique Antunes, doutor em agronomia e pesquisador da Embrapa Meio Norte.
“Anos atrás, um produtor não iniciava uma nova área de cultivo com o plantio de soja. Antes, era feito o cultivo com uma cultura um pouco mais rústica, como o arroz, até criar um perfil de solo mais fértil que permitissem culturas mais exigentes em fertilidade, como a própria soja.”
Como o preço da commodity compensa a produção mesmo em patamares produtivos não tão elevados, isso influenciou os produtores a aumentarem a calagem do solo nas suas próprias áreas de cultivos. Eles perceberam que se fizessem uma boa correção em termos de fertilidade e já plantasse soja, seria possível obter “patamares produtivos ou rendimentos satisfatórios” já no primeiro ano de cultivo.
O segredo do solo do Matopiba
“Não é que ninguém nunca testou antes essas doses elevadas (de calcário) nas culturas agrícolas”, pontua Antunes, mas a ausência de parâmetros técnicos-científicos para essa aplicação em “altas doses” dificulta o acesso dos produtores ao crédito bancário, “por isso, a pesquisa ajuda a gerar novos critérios que tragam mais segurança para o agricultor.”
A diferença de contexto era o principal problema. O pesquisador relembra que os documentos oficiais sobre fertilidade do solo foram elaborados com base em pesquisas das décadas de 1980 e 1990. E, além das diferenças nos sistemas de manejo do solo, as recomendações e fórmulas clássicas para aplicação de calcário foram estudadas e testadas, principalmente, no Centro-Sul do País, que possui condições climáticas completamente diferentes da região do Matopiba.
“Enquanto no Centro-Sul do Brasil há uma distribuição de chuvas melhor durante o ano, com precipitações que ocorrem antes da janela de plantio, no Matopiba, quando começa a chover, é quando o produtor começa a plantar”, explica o pesquisador apontando para a importância da água no processo de reação do calcário no solo.
O contexto, avalia Antunes, representa um “ponto de inflexão nas práticas tradicionais”, exigindo uma reavaliação de como o calcário é aplicado em solos com características distintas. “Porque eu preciso ter água no solo para que o calcário reaja e, obviamente, faça a correção da acidez.”
“A questão de estarmos fazendo esses testes não é porque ninguém nunca testou ou nunca fez antes, mas porque há uma particularidade na nossa região, onde as janelas de plantio são praticamente no início da quadra chuvosa. Estamos fazendo agricultura em uma região que antes não considerávamos para isso”, completa.
Sobre a pesquisa
A pesquisa teve início a partir de pedidos da Associação dos Produtores de Soja do Estado do Piauí (Aprosoja-Piauí), que identificou, junto a alguns produtores, a utilização de doses de calcário mais elevadas em algumas áreas da região.
Em parceria com a Universidade Federal do Piauí (UFPI), sendo o objeto de pesquisa da tese de doutorado do engenheiro-agrônomo Doze Batista de Oliveira, foi constatada que a aplicação de uma dose de 10 toneladas de calcário por hectare resultou em aumentos significativos na produtividade da soja, com incrementos de 18% e 12% nas safras de 2019/2020 e 2020/2021, respectivamente.
Os bons resultados foram observados por produtores como Diógenes Brandalize, que com aumento das doses de calcário e gesso em sua propriedade de 3 mil hectares em Água Branca, no Piauí, teve crescimento de 20% na produtividade. Enquanto isso, Luís Fernando Devicari, que cultiva soja e milho e cria bovinos e ovinos em 1.020 hectares na Fazenda Barbosa, em Brejo, no Maranhão, mantém um manejo tradicional, aguardando resultados definitivos de pesquisas, e realiza análises de solo anuais para ajustar a aplicação de calcário conforme necessário.
O engenheiro-agrônomo Christofer André Garanhani, de Paragominas, no Pará, destaca a importância dos estudos para orientar os produtores sobre a quantidade adequada de calcário, especialmente em áreas argilosas, indicando a necessidade de doses crescentes para melhorar a qualidade do solo. Para ele, o custo é uma barreira para a adoção de doses mais elevadas, mas entende a necessidade da conscientização dos produtores sobre a eficácia de doses maiores, especialmente para cultivares de alto potencial genético.
Ainda segundo o engenheiro, houve uma adoção gradual de práticas de manejo com doses mais altas entre os produtores, apesar das dificuldades de acesso ao crédito, o que aponta para uma tendência de mudança lenta e gradual na região.
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