Por Gustavo Delgado*
Que lições tiramos do período da pandemia? O que as empresas aprenderam, a duras custas, deste momento recente e tão difícil? Não podemos apenas passar pelas situações, difíceis ou promissoras sem entender o que houve e tirar lições…
Se o devemos fazer para a nossa vida particular, ou ainda na nossa relação com a sociedade, assim precisam fazer também as empresas. E, saibam, elas fizeram e estão fazendo.
Durante o período da pandemia, as empresas ao redor do mundo foram desafiadas a compreender os impactos e a agir de forma estratégica sobre sua gestão de riscos. Uma das primeiras lições aprendidas foi a necessidade de diversificar as cadeias globais de produção, afastando-se da centralização em um único país ou região, como exemplificado pela concentração de 80% dos ingredientes farmacêuticos ativos na China e na Índia, segundo uma consultoria recente da Mackenzie.
Uma eventual crise, quer seja por pandemia, quer seja por questões políticas, ou até mesmo por uma eventual guerra, não pode, novamente, pegar as empresas de surpresa. É importante mitigar vulnerabilidades logísticas em situações de crise. Este movimento rumo à diversificação das cadeias globais de produção é o que está sendo feito hoje no mundo, como disse brilhantemente o economista Eduardo Gianetti, em evento recente na Fecomercio.
Fui pessoalmente testemunha deste movimento, já no final da pandemia. Quantos contatos recebi de empresas, grandes empresas, europeias e americanas, que buscavam no Brasil, em nossas empresas, soluções alternativas ao que consomem daquela região asiática?
Sim, não temos preços tão competitivos. Sim, não temos volume de produção asiático. Sim, temos qualidade em nossos produtos e serviços. Não, não seremos a substituição, a nova China.
Tivemos, e ainda temos, uma grande oportunidade de participar mais estruturalmente da grande cadeia de fornecimento mundial, mesmo que com uma fração apenas. As empresas no mundo precisam, e estão abertas a este novo momento. E esperam de nós este posicionamento e esta capacidade de atendê-los.
Seriam só as empresas brasileiras? Não, é preciso deixar claro que este momento é para as empresas latino americanas como um todo.. O que significa que temos, sim, grandes concorrentes que estão se posicionando fortemente para atender a esta demanda.
No meu trabalho de mais de 25 anos no comércio exterior brasileiro e focando no processo de internacionalização das empresas brasileiras, posso dizer que estamos bem distantes dos nossos concorrentes sul-americanos. Não temos cultura exportadora ou internacional, não olhamos para fora do nosso gigante Brasil. Somos bombardeados por dificuldades e burocracias aqui dentro e imaginamos que lá fora seria ainda pior. Não chegamos nem a pensar para fora do Brasil. E quem pensa, quer um resultado imediato, ou ainda, momentâneo: em favor do dólar favorável à exportação, por exemplo.
Não pode ser assim, é preciso criar uma estrutura, ter uma preparação, um “olhar” internacional, estratégico. Esta oportunidade é, sim, brilhante, mas receio de mais uma vez deixarmos a “onda passar”, por nunca termos feito nosso dever de casa, de não ter, desde o nascimento da empresa, o olhar do mundo, do gigante mercado internacional.
Não menosprezo nem posso deixar de citar o importantíssimo, mas hercúleo trabalho desempenhado há anos pela APEX (agência de promoção à exportação, do Governo Federal). A Apex incentiva e fomenta, dia a dia, este olhar internacional. Inclusive vale o destaque do trabalho fundamental da ADEPE, que historicamente tem enfrentado este desafio de fomentar a cultura internacional com as nossas empresas pernambucanas, este é o foco do projeto EXPORTA PE.
Mas assim como no Brasil, outros países possuem também suas agências de exportação bem ativas. E temos visto o efeito delas em feiras e eventos internacionais. A presença vigorosa de empresas peruanas é um fato constante. As empresas de lá são melhores que as de cá? Os empresários de lá são mais arrojados que os de cá? Certamente ambos são bons e arrojados, mas o que falta aqui é a cultura internacional. O fato de sermos gigantes, um país, continental, nos faz locais.
É fundamental desenvolver uma mentalidade exportadora e internacional, deixando de lado a visão limitada ao mercado interno e trabalhando para criar uma estrutura e preparação estratégica global. Precisamos, portanto, difundir e apoiar a presença mais constante do Brasil e de seus produtos nos mercados internacionais. E, saibam, eles são sempre muito bem vindos e muito bem aceitos!
*Gustavo Delgado é Consultor de comércio exterior e de internacionalização de empresas, Membro de OCCA Olinda Creative Community Action, Coordenador e Professor de MBA em Comércio exterior e Mestre em Economia Internacional.
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