A possibilidade de legalização da atividade mineradora individual, prevista na proposta do projeto de lei que cria o Programa Nacional de Apoio à Mineração de Pequena Escala (PNAMPE), aprovada, no início de julho, pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviço da Câmara dos Deputados, vem preocupando o setor minerário nacional. O projeto levanta a possibilidade de legalização do garimpo, com riscos de danos ao meio ambiente por falta de fiscalização.
“Nós vemos isso com preocupação, pois não se pode criar condições para a mineração individual e atividade de garimpo. Existe uma legislação, é preciso seguir uma série de etapas e regras, por exemplo, como as referentes aos resíduos gerados. Para que médias e grandes empresas possam seguir as regulamentações, elas precisam investir em estruturas, metodologias e tecnologias, tudo para garantir a segurança da atividade mineradora. Como uma pessoa física vai fazer isso? A gente lembra que uma das grandes responsabilidades que a mineração tem com as gerações futuras é o cuidado com a preservação do meio ambiente”, afirma o presidente da Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM), Antonio Carlos Tramm.
O incentivo a mineradores individuais, proposto pelo PNAMPE, segundo ele, pode implicar no desenvolvimento de atividades que causam degradação e danos aos recursos naturais, como o despejamento de substâncias tóxicas nos rios. “É preciso ter cuidado com o uso de produtos químicos e evitar descarte sem qualquer critério. Você não pode usar a justificativa da geração de postos de trabalho e crescimento econômico para permitir o despejo de mercúrio em rios, como ocorre hoje em áreas indígenas, resultado da ação de garimpeiros”, observa, projetando as dificuldades na fiscalização de possíveis autuações individuais.
O credenciamento de mineradores de pequena escala, a viabilização das condições para a legalização de suas atividades econômicas e ações para a legalização minerária e ambiental, também constam do PNAMPE, mas este não é o maior problema. “As pequenas empresas merecem atenção dos legisladores e apoio para adequação às normas e para que possam se desenvolver. A incoerência do programa se concentra na questão da mineração individual”, acrescenta Tramm.
Lentidão da ANM precisa ser tratada com modernização
O setor de mineração sempre precisou de apoios institucionais para o desenvolvimento, com sucesso, da atividade mineradora. A Agência Nacional de Mineração (ANM) é considerada muito importante para o setor mas as queixas sobre a lentidão de processos são frequentes. Empresas tem ido à justiça para obter mandados de segurança e, assim, conseguir que um processo seja analisado pela Agência, até em casos de transferência de título.
Há quase 50 anos, atuando em pesquisa mineral, a CBPM vem guardando emissões de Portaria de Lavra há sete anos. Neste mês de julho, o presidente da companhia solicitou providências ao gabinete do diretor-geral da ANM, Victor Hugo Bicca. Na solicitação foram relacionados três processos que aguardam concessão: um deles para extração de argila, desde julho de 2015 (número 873.160/2005), e dois de areia, sendo que um espera a liberação desde agosto de 2015 (871.960/1992) e o outro desde dezembro de 2021 (873.387/2007).
“Reconhecemos que existe uma grande demanda, mas é preciso modernizar as estruturas para aperfeiçoar os processos. A mineração baiana ocupa o terceiro lugar em produção mineral do país e gera desenvolvimento econômico e social para a Bahia. Todas as nossas reivindicações são motivadas por essa realidade”, ressalta Tramm.
Política sustentável do uso de resíduos na mineração
Com foco no crescimento que o setor minerário pode promover, a CBPM tem realizado uma série de encontros para discutir os usos de resíduos da mineração e atrair investimentos de diferentes setores empresariais – já que os subprodutos podem ser usados na construção civil e na indústria química, além da agricultura – conforme experiências com fertilizantes (remineralizadores). A prática da gestão sustentável é outro ponto importante porque materiais que hoje são descartados podem ganhar utilidade, gerar soluções e agregar valor.
“A partir desse reaproveitamento, ocorre a redução do acúmulo de sólidos no meio ambiente, impactando diretamente na qualidade dos ecossistemas e da população como um todo. Além do apelo ambiental, as empresas também podem obter mais recursos a partir da comercialização de produtos com maior valor agregado comparado aos resíduos que, antes, seriam descartados”, diz a engenheira química Fernanda Torres, pesquisadora e líder técnica do Senai Cimatec.
Ela cita exemplos de algumas aplicações já desenvolvidas para os resíduos da mineração: rejeitos de minério de ferro para uso em siderúrgicas e na construção civil; resíduos finos de rochas ornamentais na produção de argamassas, cerâmicas vermelhas, vidro, tintas, manilhas, corretivos de solo, entre outros; resíduos grossos de rochas ornamentais para fábricas de cimento, brita, areia artificial, artesanato, seixos ornamentais, muros de contenção de talude, pavimentação, filetes para muros, e outros. “O que se pode ver é que o uso dos resíduos promove a formação de uma nova cadeia de negócios, associadamente, a inserção de uma política mais sustentável no campo da mineração”, conclui a pesquisadora.
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