Por Tânia Bacelar*
Infelizmente, o debate eleitoral não deu a ênfase necessária nas mudanças em curso na economia mundial e brasileirae seus desdobramentos em desafios e oportunidades para a construção do futuro em Pernambuco. O foco ficou nas heranças, no passado, em especial na dimensão social e as propostas em políticas de seu enfrentamento. Elas são importantes, posto que a realidade social do estado é desafiadora, mas o projeto de desenvolvimento econômico precisaria merecer maior atenção, pois ele pode reduzir (ou ampliar) a fome, a pobreza, a exclusão, o baixo nível de qualificação da força de trabalho…
No pouco que se discutiu sobre a economia, terminou se passando a mensagem de um estado em crise agônica, o que não encontra respaldo nos dados disponíveis, em especial para o período 2007 a 2019 (para excetuar os anos da pandemia).
Uma das mudanças recentes mais importantes na economia estadual foi o avanço da indústria de transformação, quando a década final do século passado ela mostrava claros sinais de estagnação e mesmo de decadência. Avanço que se deu aqui, ao mesmo tempo em que a indústria brasileira perdia rapidamente peso na economia nacional. O bloco de investimentos captado por Pernambuco teve como uma âncora central a presença do Complexo Industrial Portuário de Suape, obra de vários governos de distintas cores políticas. E Suape, desta vez, não teve protagonismo nos debates e propostas da maioria dos (as) candidatos(as). Mas ele continua sendo protagonista relevante e seu futuro continua estratégico.
Em paralelo, não mereceu o destaque devido a presença do complexo automotivo na Mata Norte e suas articulações com a MOURA e o Porto Digital (em tempos de transição da indústria automotiva para o carro elétrico – cujos componentes principais são softwares e acumuladores), o que coloca em nosso estado o germe da automotiva brasileira do século XXI.
Só para dar um número, Pernambuco ganhou peso na indústria nacional, passando de 1,5% para 2,8% – ou quase o dobro de participação- como se vê no gráfico a seguir apresentado.
Na nova base industrial predominaram a indústria de refino de petróleo, a automotiva, a de fármacos, a química e a de alimentos e bebidas… Base distinta da anterior.
Agora que o debate eleitoral passou, é possível, com serenidade, articular Governo, movimentos empresariais e sindicais e Universidades para fazer Pernambuco ter uma participação ativa na formulação de uma nova política industrial do país.
Nesse contexto, Pernambuco precisa, em especial, evitar retrocessos (na indústria de refino do petróleo, na automotiva – cujos incentivos federais se esgotam em breve – e na indústria de bens de consumo). Em paralelo, nossa base industrial está desfiada a acompanhar as transformações disruptivas em curso no mundo, ao mesmo tempo em que tire proveito de novas oportunidades, como a produção do hidrogênio verde, a produção de equipamentos direcionados a produção de energias limpas, além de buscar protagonismo no complexo econômico da saúde (oportunidade que ficou evidente para o Brasil em tempos de pandemia), posto que aqui está o segundo polo médico do país (em expansão acelerada) e o estado já está atraindo a indústria farmacêutica, com unidades de grandes grupos.
Uma política industrial atualizada e sintonizada com a nacional precisa, assim, estar priorizada na agenda econômica da nova governadora.
A consolidação e expansão de ecossistema construído em torno do Porto Digital também faz parte de uma agenda de futuro, em tempos de transição acelerada para a era digital.
Para não falar do potencial embutido em mudanças recentes de nossa base agropecuária e de oferta de serviços.
Destaque-se que o Governo Paulo Câmara pagou um alto custo político, ao se inscrevendo em tempos de crise nacional, buscar entregar a sua sucessora um estado com as finanças equilibradas e uma boa margem de endividamento. Isso coloca a necessidade de dar um tratamento especial à construção do programa de investimentos que integrará o próximo PPA (plano de médio prazo). Investimentos que devem priorizar além da infraestrutura econômica e social (em especial, a disponibilização de banda larga 5G nas escolas e nas periferias), a de produção de ciência e tecnologia e a formação e a atualização dos recursos humanos, uma de nossas potencialidades e, ao mesmo tempo, uma de nossas fragilidades.
Mas é preciso mais: Pernambuco está desfiado a atualizar seu plano de longo prazo (o PE 2035) como fez recentemente o Ceará, que mirou o horizonte de 2050. E, nesse contexto, estar atento ao ambiente de disrupção em curso, onde a era digital, da nanotecnologia e da biologia dialoga com os desafios da mudança no padrão energético, do novo padrão de relação com o a natureza (em especial com o semiárido) e com a transição para a economia de baixo carbono e circular. Mãos à obra!
*Tania Bacelar de Araujo é economista, Mestre e Doutora em Economia pela Universidade de Paris Panthéon-Sorbonne e sócia-diretora da Ceplan Consultoria Econômica.