O fato de o Recife ter vivenciado um crescimento populacional negativo entre 2010 e 2022, anos dos dois censos mais recentes, e de agora perder duas vagas na Câmara Municipal, é um assunto que pode abastecer a lista de argumentos da oposição ao grupo político que governa a capital, liderado pelo PSB desde 2013.
Até porque isso já foi feito nas eleições de dois anos atrás, quando o Recife e Pernambuco apareciam como localidades que tinham o segundo pior índice de desemprego no país. Na época, esse e outros resultados ruins ajudaram a desgastar a campanha do partido, que não chegou ao segundo turno e perdeu o comando da gestão estadual após um ciclo de 16 anos, culminando na eleição da então candidata de oposição Raquel Lyra (PSDB), atual governadora do estado.
Depois das eleições de 2022, que refletiram dados puxados para baixo pela pandemia de Covid-19, os índices do Recife melhoraram no tocante ao emprego. Em maio deste ano, por exemplo, a cidade foi a responsável por quase 50% dos postos de trabalho gerados em Pernambuco, catapultando os indicadores do estado no ranking nacional.
Recife e seus problemas
A capital, contudo, ainda convive com outros índices ruins, como os que a colocaram como a segunda pior no Mapa da Desigualdade (Instituto Cidades Sustentáveis, 2024), como a que tem o segundo pior trânsito (Traffic Index, 2023) e a que tem o terceiro maior valor de aluguel do país (FipeZap, 2023). Esses dados costumam aparecer na artilharia de vereadores de oposição na Câmara, um indicativo de que podem ser usados na campanha eleitoral deste ano.
A análise sobre a dinâmica populacional em um Recife visto como inchado, verticalizado e sem espaço territorial para crescer, porém, também tem aspectos virtuosos quando se olha o tecido urbano como um todo. As pesquisadoras Maria Ângela de Almeida Souza e Maria Rejane Britto Lyra e o pesquisador Wilson Fusco, do Observatório das Metrópoles, analisam, em artigo divulgado pela entidade, que Olinda, limítrofe ao norte, e Jaboatão dos Guararapes, ao sul, também perderam habitantes, em um movimento percebido ainda em outros municípios litorâneos e que “confirma a tendência de queda na população residente já identificada em censos anteriores”.
Para os estudiosos, isso pode ser explicado, entre outros fatores, pela decisão de investir em outros polos econômicos do estado, o que ajudou a atrair a população para regiões fora da capital. Esses empreendimentos foram conquistados nas gestões do ex-governador Eduardo Campos (1965-2014), o que é apontado por interlocutores do grupo político que comanda a capital como exemplo de como criar novas matrizes econômicas de forma descentralizada, proporcionando a outras regiões ativos para se desenvolver.
Em Goiana, na Mata Norte de Pernambuco, por exemplo, o polo automotivo criado com a instalação da fábrica da Stellantis, em 2015, é avaliado como decisivo para que Itapissuma, município no extremo norte da Região Metropolitana do Recife, tenha visto sua população crescer a uma taxa de 1,30% ao ano entre os censos de 2010 e de 2022. O polo de bebidas da cidade também pode ter contribuído com esse processo, avaliam os pesquisadores.
Já ao sul, Ipojuca, no Grande Recife, onde fica o Complexo Industrial Portuário de Suape, teve índice ainda maior: +1,72% ao ano. Em 2010, a região chegou a contribuir com 14% do Produto Interno Bruto (PIB) do estado, configurando-se como um grande polo de atração populacional e de geração de empregos, ainda que tenha perdido força com a crise econômica de 2014.
Todos esse fatores contribuíram, cada um a sua maneira, para essa migração populacional e consequente redução populacional do Recife.
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