Em semana marcada pela reabertura do Santuário do Morro da Conceição, no Recife, após a tragédia envolvendo o desabamento do teto da igreja, a Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) promoveu audiência pública para discutir o endurecimento da legislação que disciplina a instalação de painéis solares em imóveis. A ideia é que laudos estruturais passem a ser exigidos, mas representantes do setor indicam que a medida impactaria negativamente a cadeia econômica, com aumento de até 30% no custo dos projetos, dificultando o acesso a essa fonte de energia, que hoje está à disposição de apenas 4% da população do estado.
O debate sobre o assunto começou em 30 de agosto, quando o acidente no santuário deixou duas pessoas mortas e 25 feridas. No momento, ocorria a entrega de cestas básicas para fiéis da comunidade. Embora o conteúdo da perícia que pode esclarecer a motivação do ocorrido ainda não tenha sido divulgado, informações preliminares indicam que, uma semana antes do desabamento, o telhado da igreja havia recebido painéis solares. Desde então, o Poder Legislativo estadual passou a discutir a necessidade de normas adicionais de segurança para a instalação desses equipamentos.
Após desabamento em igreja, projeto começou a tramitar no Legislativo
Na Alepe, o Projeto de Lei 2206/2024, de autoria do deputado Joel da Harpa (PL), prevê como obrigatória a elaboração de laudo técnico estrutural para a instalação de painéis solares como forma de viabilizar a “verificação do impacto da carga adicional dos suportes, estrutura de fixação e placas sobre as coberturas”. A matéria, que vai tramitar pelas comissões da casa e ainda não tem previsão de votação em plenário, determina o pagamento de multa de 10% do valor venal do imóvel em caso de descumprimento.
O autor do projeto, que presidiu a audiência pública sobre o tema na Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação da Alepe na segunda-feira (25), disse que o temor de dificuldades no acesso a energias renováveis não deve ser pretexto para não avançar em regras de segurança nos procedimentos envolvidos. “Entendemos a importância de avançarmos no uso de energia solar em Pernambuco, tanto pela questão da sustentabilidade quanto pela economia nas contas de luz da população. Entretanto, isso precisa ser feito de forma segura, para que não tenhamos novas vítimas como as do Morro da Conceição”, afirmou Joel da Harpa.
Setor teme retrocesso em estado onde só 4% usam energia solar
Também presente na audiência, o presidente da Associação Pernambucana de Energias Renováveis, Rudinei Miranda, ressaltou que a segurança é uma preocupação constante de quem trabalha no setor. Ele explicou que a empresa encarregada pela instalação de painéis solares deve possuir um engenheiro responsável e seguir as orientações de normas regulamentadoras da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), como as NBRs 16690, 5419 e 5626. Esses documentos, segundo o representante, listam exigências como proteção contra descargas atmosféricas e procedimentos de montagem, por exemplo.
Miranda, contudo, defendeu que o laudo estrutural só seja exigido se o engenheiro responsável julgar que há necessidade. Ele também demonstrou preocupação com os impactos financeiros sobre as empresas que fazem a instalação e sobre os clientes interessados se a nova exigência for aprovada na Alepe. Um eventual desestímulo ao uso de energias renováveis, segundo o dirigente, seria um cenário indesejado em um estado que está no 13º lugar no ranking brasileiro entre os que utilizam a matriz solar, mesmo situado em uma região marcada pela alta incidência da luz solar na maior parte do ano.
“Nós da associação corroboramos a preocupação com a segurança. No entanto, avaliamos que a exigência do laudo estrutural para pequenas residências vai encarecer o projeto em cerca de 20% a 30%. Isso pode inviabilizar a implantação da energia solar, indo de encontro a uma pauta global de incentivo às energias renováveis”, opinou Miranda, acrescentando que as normativas atuais já são suficientes para regular o setor.
O gerente de Instalações Industriais da Federação das Indústrias de Pernambuco (Fiepe), Abraão Rodrigues, também se posicionou contrário ao acréscimo de mais uma exigência ao setor, temendo que a medida desestimule o avanço da pauta das energias renováveis. “Empresas que querem fazer a transição energética podem ser desestimuladas com a exigência de mais um laudo e, portanto, um projeto mais caro”, avaliou.
Instituições defendem laudo estrutural como medida de segurança
Outras instituições presentes à audiência se manifestaram de forma favorável ao projeto de lei proposto na Alepe. Carlos Calado, representante do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Pernambuco (Crea-PE), defendeu a exigência do laudo estrutural como um elemento a mais para garantir a segurança do cidadão. “A expansão da energia fotovoltaica é importante, mas é necessário que isso ocorra com engenharia e segurança. A placa solar deve trazer soluções, e não problemas”, afirmou.
No mesmo sentido, o presidente do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias (Ibap), Gustavo Farias, disse que “o engenheiro responsável pela inspeção terá condições de analisar se a instalação demandará regras mais simples ou se serão necessárias adequações maiores na estrutura que receberá as placas”. Já o coronel George Farias, do Corpo de Bombeiros Militar de Pernambuco, sugeriu que o projeto de lei especifique para onde irão os recursos provenientes das multas.
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