Onze anos depois de ser implantada, a Parceria Público-Privada (PPP) entre a Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) e a BRK Ambiental, a primeira do setor no país, passará por sua mais profunda revisão. E, diferentemente de outros sete aditivos ao contrato assinados nesse período, a nova repactuação terá um desafio a mais: garantir as condições econômico-financeiras para que haja a universalização do esgoto tratado até 2033, como prevê o Marco Legal do Saneamento Básico, em vigor desde 2020. Significa que terão que ser cumpridos, em menos de uma década, prazos antes sujeitos a serem dilatados ao longo de mais 24 anos de contrato.
A parceria, batizada como Programa Cidade Saneada, foi assinada em julho de 2013, tem duração prevista de 35 anos e abrange os 14 municípios da Região Metropolitana do Recife e Goiana, na Mata Norte de Pernambuco. Apesar do período de contrato, uma das metas iniciais era de que, em 12 anos, em 2025, a universalização pudesse ser atingida. O índice de atendimento de esgoto nessas localidades, contudo, passou somente de 30% para 38%, ou seja, apenas oito pontos percentuais a mais em 11 anos de contrato. E, já na próxima década, conforme a nova legislação, essa taxa precisará chegar a 90% de cobertura, uma marca que não parece atingível se for mantido o mesmo ritmo adotado até aqui.
O presidente da Compesa, Alex Campos, reconhece que o desafio é grande, diz que os números do Recife são melhores – chegam a 50% de cobertura de esgoto tratado – e enfatiza que a repactuação da PPP vai acontecer justamente para alinhar o contrato à nova realidade. “Foi assinado um contrato sob um horizonte em 2013 e agora estamos sob outro horizonte. Precisamos estabelecer quais as tecnologias e as possibilidades para viabilizar que essas entregas aconteçam nesse novo ritmo. O Congresso estabeleceu uma meta ousada e é importante que a gente verta esforços para imprimir um ritmo de investimentos alinhado a essa nova meta”, explica.
PPP já beneficiou 1,4 milhão de pessoas, mas precisa chegar a 6 mi
Pelo contrato, à BRK Ambiental cabem a recuperação, manutenção e operação dos sistemas de esgotamento sanitário, além da elaboração de projetos, implantação e ampliação de 48 etapas úteis de sistemas. Já a Compesa é responsável por implantar 19 etapas úteis, monitorar o desempenho e remunerar a parceira privada. A companhia diz que, nos primeiros anos do Programa Cidade Saneada, foram entregues mais de 200 quilômetros de novas redes coletoras, 33 estações elevatórias e oito estações de tratamento de esgoto.
A PPP viabilizou também o aumento do volume de esgoto tratado de 540 litros por segundo para 1.630 litros por segundo. Além disso, mais de 200 unidades operacionais foram modernizadas e 1,5 mil quilômetros de redes coletoras foram adequados. O número é considerado positivo pela Compesa, já que 1,4 milhão de pessoas foram beneficiadas com esgoto tratado em seus domicílios, o que tem rebatimentos na qualidade de vida e nos custos do Estado com a saúde pública.
Com a conclusão da primeira fase da parceria, voltada à recuperação das estruturas de saneamento existentes, o foco passa à implantação de novos Sistemas de Esgotamento Sanitário. A previsão é de que, após a totalidade das entregas, seis milhões de pessoas possam ser atendidas.
Compesa diz que revisão da PPP focará em ritmo maior de investimentos
Nos últimos anos, sempre que divulgava a assinatura de aditivos ao contrato, o Governo de Pernambuco costumava enfatizar que haveria maior participação da parceira privada nos investimentos. O presidente da Compesa afirma que, no caso da revisão que está para acontecer, o mais adequado não é focar apenas em mais aportes, mas na disposição em dar mais ritmo a eles. Nos primeiros 11 anos de contrato, foram investidos R$ 3 bilhões de uma previsão total de R$ 8 bilhões para 35 anos. Campos cita a retomada recente de obras no setor hídrico como exemplos da disposição da gestão estadual em acelerar as entregas.
“Indiscutivelmente, vamos precisar fazer mais investimentos públicos. Mas, quando se faz uma PPP, o ente público tem a expectativa de captar recursos do parceiro privado. Então, a grande questão é: se o Estado aumenta o ritmo de investimentos, o parceiro privado está disposto a aumentar o dele? Essas são as discussões que a gente está fazendo. A gente precisa discutir a trajetória de investimentos por conta do Marco do Saneamento, trazer para a conta investimentos que a Compesa vai fazer e honrar etapas que o parceiro disse que a Compesa deixou de cumprir no passado, sanando incidentes contratuais que vinham gerando um clima de desconforto”, declara.
Ainda de acordo com o presidente da Compesa, até meses atrás, havia um ambiente de insegurança sobre o equilíbrio econômico-financeiro da PPP por conta da nova legislação do setor. “Quando iniciei esse trabalho, no ano passado, encontrei um ambiente de muita animosidade, com questionamentos de ambas as partes. Os próprios investidores da BRK Ambiental tinham dúvidas sobre os rumos da PPP. Hoje, a relação melhorou muito. Antes, tínhamos de sete a oito dias para que fosse feito um reparo na rede. Hoje, trabalhamos com até 72 horas. Então, estamos na expectativa de que esse processo traga uma oxigenação ao contrato”, afirma.
Governo garante que futura concessão não afetará serviços da PPP
As conversas sobre a revisão da PPP entre a Compesa e a BRK Ambiental começaram no fim do ano passado e não terminarão em 2024. Um grupo de trabalho foi criado como medida preparatória para a assinatura do oitavo termo aditivo ao contrato, que deve ficar para o ano que vem. Antes disso, porém, será pactuado um memorando de entendimentos, considerado um documento prévio à fase mais decisiva das discussões. A ideia é que, nos próximos meses, uma consulta pública também seja feita junto à população.
Segundo a Compesa, um dos consensos que antecedem a revisão da PPP é o de que a concessão de serviços da companhia, em estudo pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e com previsão de tratativas finais para 2025, não vai afetar o território e a modelagem de atuação da BRK Ambiental. Isso porque, diferentemente de outros estados, que concederam à iniciativa privada a distribuição de água e a coleta e o tratamento de esgoto, Pernambuco vem garantindo que deixará de fora, no modelo de concessão, os serviços de esgotamento sanitário na Região Metropolitana do Recife, hoje sob jurisdição da parceira privada.
“A Compesa não vai ser privatizada. O negócio da água é completamente estatizado em Pernambuco. A Compesa opera a produção, o tratamento e a distribuição da água, além da coleta e do tratamento de esgoto. Outros estados pegaram a distribuição de água e a coleta e o tratamento de esgoto e levaram à concessão. Rio de Janeiro, Amapá e Alagoas fizeram isso, e Sergipe está fazendo. E as empresas estatais ficaram, como costumo dizer, com a venda de água no atacado, produzida e tratada”, explica Campos.
Com essa dúvida sanada sobre o modelo de concessão que se pretende adotar em Pernambuco, a expectativa da companhia é de que as discussões sobre a PPP também possam avançar. “Havia uma preocupação do parceiro privado sobre como ficaria sua participação no novo modelo aqui. Há um reconhecimento de que, apesar das dificuldades, houve avanços significativos com a PPP. Então, já está sinalizado pelo BNDES e pelo Governo de Pernambuco que o esgoto ficará decotado dos estudos sobre a concessão e que a área geográfica que hoje é da BRK Ambiental está retirada dessas discussões”, completa o presidente.
Leia também: Compesa abrirá consultas públicas para concessão de serviços