Por Ângela Fernanda Belfort e Patrícia Raposo
Nos próximos anos, o Complexo Portuário e Industrial de Suape deve atrair investimentos da ordem de R$ 37 bilhões. Os recursos envolvem projetos diversos, como geração de hidrogênio verde, ferrovia, terminal de minérios, terminal de regaseificação, entre outros. Mas ainda há pendências que precisam ser administradas para tornar tudo isso realidade. Obras como dragagens, licenciamento ambientais e articulações que devem ser realizadas por quem vai estar à frente de Suape na próxima administração estadual.
Por isso, há uma preocupação no meio empresarial com a continuidade dos processos em curso. Para empresários e gestores ouvidos pelo Movimento Econômico, a mudança de governo já é um fato que por si só gera incerteza, uma vez que não se sabe até onde há interesse em seguir com os compromissos assumidos com a iniciativa privada.
“Percebe-se uma falta de conhecimento mais profundo sobre o que vem acontecendo em Suape. Sem o compromisso da continuidade desse processo, que está colocando Suape noutro nível de profissionalismo, podemos perder boa parte dos R$ 37 bilhões previstos para os próximos anos em investimentos.”, disse um dos stakeholders de Suape, que preferiu o anonimato.
“Deve haver cuidado para não se partidarizar a gestão de Suape, sob risco de retrocesso. Os investimentos privados previstos para os próximos anos só se concretizam se a nova gestão tiver responsabilidade com os compromissos assumidos”, disse um empresário que aguarda finalização de trâmites burocráticos para assinatura de contrato com o porto.
Ambos alertam que os programas de governo precisam trazer uma diretriz. E tanto o de Marília Arraes, quanto o de Raquel Lyra, deixam a desejar sobre Suape na visão desses agentes estratégicos que atuam no território portuário.
O que dizem os programas de governo
O Movimento Econômico consultou os dois programas de governo das candidatas Marília Arraes (Solidariedade) e Raquel Lyra (PSDB) cadastrados no TSE. No de Marília Arraes não há citação ao porto pernambucano, enquanto o de Raquel Lyra fala, pelo menos, cinco vezes em Suape. O programa de Marília registrado no TSE tem 12 páginas e o da candidata tucana, 71 páginas.
Em seu programa, Raquel fala em retomada de “projetos estratégicos”; em tornar o complexo industrial portuário “um polo de desenvolvimento tecnológico e de produção de hidrogênio verde”. Também fala na construção do Arco Metropolitano que ligaria “o polo industrial norte ao complexo” portuário; e na viabilização da Ferrovia do Sertão. A proposta defende a retomada da autonomia do porto pernambucano.
A retomada da autonomia de Suape já aconteceu. Ela foi devolvida pelo governo federal no último dia 03 de outubro, um dia depois da eleição do primeiro turno. A defasagem ocorre porque os programas registrados foram entregues ao TSE quando o porto ainda estava sob a guarda da gestão federal.
Após ser procurada pela reportagem, a assessoria de Marília enviou ao Movimento Econômico um novo programa de governo. O documento foi elaborado após o prazo de registro no TSE. Segundo a assessoria da candidata, o atual plano foi fruto do processo de escuta feito junto à população durante a campanha do primeiro turno.
No ‘segundo’ programa de governo de Marília, que tem 94 páginas, Suape é citado, pelo menos, oito vezes, nos seguintes contextos: “expandir e aumentar a competitividade” do porto, que é o “mais caro” na movimentação de contêineres; “desenvolver um plano de investimento de médio e longo prazo para Suape”, recuperar a autonomia do porto; reduzir o preço das tarifas de movimentação de carga; viabilizar a conclusão da Transnordestina entre Salgueiro e Suape e, por último, incentivar uma interação entre o porto e os polos inovadores do Estado.
Se no primeiro programa da candidata do Solidariedade não aparece qualquer citação ao hidrogênio verde ou às energias renováveis, na segunda versão o tema é tratado com ênfase de tornar Suape um polo para este combustível, que é considerado a energia do futuro.
Já com relação à ferrovia, o programa está desatualizado, porque a Transnordestina não virá mais para Pernambuco. Agora, o ramal será construído pela mineradora Bemisa e chama-se Ferrovia do Sertão , conforme anunciado em setembro do ano passado.
O impacto de Suape…
O presidente da Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco (Fiepe), Ricardo Essinger, afirmou que Suape é um dos principais eixos do desenvolvimento do Estado, porque envolve a política de exportação/ importação para receber navios e mercadorias. “Pela eficiência do porto, passam os menores custos para exportar e importar. O primeiro significa a oportunidade de as empresas entrarem no mercado externo e o segundo de os insumos (da indústria) ficarem mais barato na importação”, comenta Ricardo.
Ele também cita que os projetos que considera prioritários para Suape são a conclusão da Ferrovia do Sertão – justamente aquela que a Bemisa pretende construir em substituição à Transnordestina – , o polo de produção do hidrogênio verde e o terminal de regaseificação. “O preço do gás está elevado devido ao cenário internacional, mas quando acabar a guerra entre a Ucrânia e a Rússia, o preço deve voltar ao normal”, afirma Essinger. A expectativa dele é de que o preço gás chegue a um patamar mais barato com a chegada deste tipo de terminal ao porto.
O consultor em comércio exterior, Maurício Laranjeira, também acredita que o desenvolvimento de Pernambuco passe pelo Porto de Suape. “O Estado precisa de uma fonte escoadora e receptora numa economia que está cada vez mais globalizada. Suape é a grande oportunidade que o pernambucano tem de olhar para fora e traz oportunidades de crescer, receber investimentos”, resume.
Sem fazer crítica a qualquer candidata, o consultor diz que “é importante ter respeito aos compromissos firmados anteriormente. Empresário gosta de clareza e segurança jurídica”.
Gestão técnica
Maurício também defende que é de extrema importância Suape ter um corpo técnico na futura gestão – independente de quem ganhar a eleição – , “porque os técnicos entendem o que é Suape, o seu potencial e como pode funcionar a área de atração de investimento, utilizando isso da melhor maneira para a economia pernambucana”.
“O investimento industrial não é algo ultrapassado, ele traz desenvolvimento econômico com melhores empregos, mais educação”. Para o consultor, merecem atenção, além do polo de hidrogênio verde e da ferrovia, a conclusão da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), o reposicionamento dos estaleiros, incluindo o Estaleiro Atlântico Sul (EAS), que está em recuperação judicial; e o fortalecimento do polo químico.
10 mil empregos
Além de novos investimentos, a entrada em operação de 11 empreendimentos programados para os próximos anos vai trazer, pelo menos, 10 mil empregos na área do complexo industrial e portuário, onde hoje trabalham cerca de 40 mil pessoas. A principal obra de infraestrutura que precisa ser feita é concluir a dragagem do porto externo e fazer a dragagem do porto interno para que o calado chegue a 16 metros de profundidade. A conclusão da dragagem do Porto externo deve ser resolvida na atual gestão, segundo o presidente de Suape, Roberto Gusmão. A atual gestão também deve deixar o projeto executivo da dragagem interna pronta. “O licenciamento ambiental destes empreendimentos é um grande desafio”, diz Roberto.
Confira abaixo, o que pensam as candidatas ao governo do estado sobre Suape.
Marília Arraes
Movimento Econômico – Quais são os principais eixos de desenvolvimento a serem trabalhados na sua gestão?
Marília Arraes – O desenvolvimento econômico não é um fim em si mesmo. Ele é meio para o que realmente importa, a melhoria da qualidade de vida das pessoas. Assim com o combate e erradicação da pobreza, a geração de emprego e renda será prioridade do nosso governo. Para isso, precisamos melhorar o ambiente de negócios, reduzir a carga tributária, desburocratizar a gestão, oferecer crédito a juros baixos, valorizar os empreendimentos com capital pernambucano, fortalecer os arranjos produtivos locais e facilitar o acesso à tecnologia e inovação.
Precisamos corrigir distorções como o longo tempo de espera para obtenção das licenças e alvarás. E vamos fazer isso com a aprovação tácita, que é a emissão de documentos públicos quando o Estado perder os prazos. Também vamos investir na ampliação do ensino profissionalizante, aumentar o número de ETEs e adequando a matriz curricular às demandas das regiões onde estão inseridas, como polo de confecções, bacia leiteira, polo avícola, fruticultura .
M.E. – Quais os principais projetos que serão prioritários em Suape? Por que?
M.A. – Aumentar a competitividade do complexo portuário de Suape será a prioridade. E isso passa, necessariamente, pela redução dos custos logísticos e das taxas operacionais. Não é possível continuar convivendo com taxas 30% mais caras em Suape que em Pecém (CE), por exemplo. A chegada de um novo terminal de contêineres vai ajudar a baratear custos, pela própria concorrência. No ponto de vista logístico, precisamos viabilizar a construção do Arco Metropolitano, primeiro no trecho Sul, onde não há polêmicas, e encontrar uma solução para o trecho Norte que preserve a Área de Proteção Ambiental de Aldeia. Também precisamos encarar como prioridade a chegada da ferrovia Transnordestina a Suape, ligando, no trecho pernambucano, o Sertão do Araripe ao porto.
M.E – Como pretende estimular as energias renováveis?
M.A. – Precisamos nos preparar para a abertura completa do mercado de energia, que vai chegar também aos consumidores residenciais a partir de 2026. Nossa proposta é incentivar a energia solar. Principalmente a geração de pequeno porte. Não precisamos de grandes áreas para instalar grandes usinas solares. Ao invés disso, vamos incentivar a geração fotovoltaica nas propriedades da agricultura familiar, cooperativas rurais e assentamentos. Além da geração de energia limpa, o programa vai proporcionar também a geração de renda no interior. Caberá ao Governo do Estado selecionar as empresas que vão implantar as pequenas plantas geradoras no meio rural e viabilizar a oferta de linhas de crédito, seja por meio da Agepe, seja por meio de bancos oficiais, como Banco do Nordeste e BNDES.
Raquel Lyra
Movimento Econômico – Quais são os principais eixos de desenvolvimento a serem trabalhados na sua questão?
Raquel Lyra – No nosso governo vamos promover a retomada do investimento público em projetos de infraestrutura importantes para a promoção da qualidade de vida e da competitividade da economia de Pernambuco. Iremos trabalhar para fortalecer a infraestrutura logística, hídrica e sanitária, com obras como Arco Metropolitano, a requalificação e duplicação da BR-232 até Arcoverde, a Transnordestina, a conclusão de barragens, adutoras e do saneamento, a requalificação dos aeroportos regionais e as melhorias no Complexo Industrial Portuário de Suape. No conjunto de propostas que temos para desenvolver o nosso estado consta o trabalho para atrair investimentos privados intensivos em mão de obra para a geração de emprego e renda nos polos industriais de Suape e de Goiana, bem como nos Distritos Industriais do interior do Estado. Vamos atuar na promoção de uma Economia de Baixo Carbono, com fortalecimento do Porto Digital e de todo ecossistema de Tecnologia da Informação, bem como com a pesquisa, desenvolvimento e ampliação do uso de Energias Renováveis…
ME – Quais os principais projetos que serão prioritários em Suape? Por que?
R. L. – Inicialmente, é assumir de fato a gestão sobre o Complexo Industrial Portuário de Suape, devolvida pelo Governo Federal via Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) em outubro de 2022, buscando melhorias legais e normativas que permitam aumentar a eficiência e atração de negócios. O nosso compromisso é de melhorar a governança de Suape, dinamizando e dando mais transparência à Diretoria Executiva e ao seu Conselho de administração, que seria formado por quadros técnicos. Além disso, também vamos nos empenhar para melhorar a competitividade da operação de contêineres de Suape e a execução do desenvolvimento de um Terminal de Uso Privado (TUP) a partir do cais do Estaleiro Atlântico Sul (EAS). Queremos tornar o Complexo Industrial Portuário de Suape um polo de desenvolvimento tecnológico e produção de Hidrogênio Verde. Trabalhar na implantação do terminal de minérios de ferro da Transnordestina para garantir a viabilidade econômica da ferrovia entre Suape e Salgueiro. Outra ação do nosso governo é a requalificação do acesso rodoviário a Suape, eliminando o gargalo localizado em Jaboatão dos Guararapes, à altura da fábrica da Vitarella.
M. E. – O que será feito para estimular as energias renováveis?
R.L – Vamos trabalhar para incentivar a pesquisa, desenvolvimento, produção, geração e consumo de energias limpas e renováveis (eólica, solar fotovoltaica, hidrogênio verde e biogás, biomassa, bioeletricidade), em substituição às fontes fósseis, aproveitando o grande potencial da Região Nordeste para a geração fotovoltaica e, principalmente, eólica. E, ainda, fomentar e incentivar a adoção de micro e minigeração distribuída de energia solar, além de tornar o Complexo Industrial Portuário de Suape um polo de desenvolvimento tecnológico e produção de Hidrogênio Verde.