A Receita Federal aumentou o monitoramento das transações financeiras, como pagamentos por aproximação e Pix em 1º de janeiro. A novidade em relação ao maior controle da fiscalização bancária pegou muitos brasileiros de surpresa, que ainda possuem dúvidas sobre o assunto. Até 31 de dezembro do último ano, a Receita Federal recebia informações de instituições bancárias sobre transações mensais acima de R$ 2 mil realizadas por pessoas físicas e R$ 6 mil para empresas feitos por transferência bancária, TED e cartão de crédito.
Com a chegada de 2025, a lista aumentou e todas as transações financeiras estão sendo levadas em conta, incluindo o pagamento instantâneo (Pix) e por aproximação. Os valores também mudaram: será informado ao fisco movimentações financeiras mensais acima de R$ 5 mil para pessoas físicas e R$ 15 mil para as empresas.
A obrigação do envio das informações — que serão semestrais, respeitando o sigilo bancário e fiscal — cabe às instituições financeiras, e não aos contribuintes diretamente. “De acordo com a IN 2219/2024 da Receita Federal, em seu art. 2º e § 1º, a obrigação acessória e a entrega da e-Financeira não é aplicável diretamente a pessoas físicas ou jurídicas, mas sim às entidades reguladas e supervisionadas, por exemplo, pelo Banco Central (Bacen) e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM)”, explica o conselheiro do Conselho Regional de Contabilidade de Pernambuco (CRC-PE) e sócio da Datacontábil Compliance, Fábio Firmino.
Dessa forma, as instituições financeiras vão reportar a Receita Federal os valores totais que entraram e saíram das contas. Firmino ainda explica que, no total, o órgão receberá detalhes sobre aplicações financeiras dos contribuintes, operações de renda fixa e variável, aquisições de moeda estrangeira, transações com cartões de crédito, débito e private label, além de operações por meio de Pix e outros sistemas de pagamento eletrônico e transferência entre contas.
Quais são as implicações legais para quem não cumprir as novas obrigações acessórias
Muitos usuários estão se questionando sobre o que pode acontecer legalmente caso os valores das transações do envio semestral sejam incompatíveis aos ganhos declarados anualmente no Imposto de Renda.
De acordo com a pós-doutora em Direito Tributário e presidente do Centro Nacional para Prevenção e Resolução de Conflitos Tributários (Cenapret), Mary Elbe Queiroz, a receita pode cruzar os dados com outras informações do contribuinte. “Essas operações serão cruzadas com as declarações que vão ser apresentadas pelas pessoas físicas para ver se o total dos rendimentos informados e declarados são suficientes para cobrir essas operações”, afirma.
“A Receita Federal já tinha competência para fiscalizar essas operações. Contudo, agora haverá um controle específico sobre transações realizadas via Pix e pagamentos por aproximação. Essas operações serão analisadas e, caso haja um cruzamento de informações que mostre inconsistências entre a declaração da pessoa física ou jurídica e a movimentação financeira registrada, pode ser interpretado como indício de omissão de rendimentos”, reitera a advogada.
Mary explica que, caso a falha seja detectada, poderá ser iniciada uma fiscalização. “Caso fique comprovada a omissão de rendimentos ou ganhos não declarados à Receita Federal, o órgão poderá realizar autuações e aplicar penalidades. Caso confirmado, a multa será de 75% em situações sem fraude e de 100% nos casos em que houver comprovação de fraude”, explica.
Cabe defesa administrativa para contribuintes que discordem de autuações feitas pela RF
A presidente do Cenapret explica que, em caso de autuação para cobranças, com a acusação de omissão de receita e aplicação de penalidade, o contribuinte tem o direito de se defender. Ele pode se justificar, apresentando provas de que os rendimentos já foram devidamente declarados. “Há possibilidade de defesa, com a apresentação de recursos administrativos, e, em última instância, a questão pode ser discutida em um processo judicial.”
Para evitar o desgaste e as preocupações em casos com esse, o contador Fábio Firmino sugere que tanto pessoas físicas quanto jurídicas devem manter suas finanças organizadas para evitar problemas.
“Recomendo que essas pessoas mantenham um controle detalhado das movimentações financeiras para facilitar a comprovação em caso de questionamento, além de separar as finanças pessoais e empresariais, especialmente no caso de empresários individuais ou MEIs, respeitando o princípio da entidade”, destaca, indicando também que sejam guardados documentos de suporte, tais como recibos, contratos e extratos bancários.
“Se o contribuinte puder comprovar que os rendimentos utilizados em operações como Pix, gastos com cartão de crédito, entre outros, já foram informados e declarados à Receita Federal, com os devidos impostos pagos, isso não será considerado sonegação”, completa Mary, afirmando que só haverá autuação e aplicação de multa caso não seja apresentada uma justificativa e se comprove, de fato, a omissão dos valores.
Cuidado redobrado ao emprestar cartões de crédito ou realizar empréstimos
O contador alerta para o empréstimo de cartão de crédito, alegando que evitar a prática é o mais adequado para não ter nenhum tipo de incongruência com a receita. Caso alguém empreste o cartão de crédito para outra pessoa e realize pagamentos sem ter a quantia necessária, é importante que tenha um controle adicional sobre suas finanças.
Nesse cenário, é fundamental ter atenção redobrada ao que é declarado, já que a Receita Federal pode questionar despesas incompatíveis com a renda informada. “Emprestar o cartão não vale a pena, pois coloca em risco sua estabilidade financeira e sua regularidade fiscal”, comenta Fábio, afirmando que essas ações podem gerar sérios problemas financeiros e fiscais, especialmente quando os gastos registrados no cartão são incompatíveis com sua renda. “Por exemplo, alguém que ganha R$ 2.000 e paga R$ 5.000 ou R$ 10.000 no cartão pode ser questionado pela Receita Federal”, complementa.
O advogado tributarista Isaac Valentim comenta que é de suma importância que, ao emprestar cartões de crédito ou realizar empréstimos, tenha como comprovar a origem dos valores movimentados acima do limite estabelecido. “Caso contrário, o contribuinte pode ser autuado pela Receita, que realizará uma fiscalização rigorosa dessas movimentações”, diz.
Novas regras podem impactar trabalhadores informais e MEIs
Isaac chama atenção para os microempreendedores individuais (MEIs) que operam de maneira informal: “em relação à informalidade, muitos MEIs ainda operam de maneira informal, sem uma rigorosa organização fiscal”. No entanto, é importante que esses profissionais fiquem atentos, pois, com a nova obrigação, a Receita Federal estará atenta às movimentações financeiras desse grupo, mesmo que estejam formalizados com CNPJ.
Devido a operações realizadas com cartões de crédito, PIX ou outros meios financeiros, a Receita cruzará informações fornecidas por operadoras de cartão e instituições financeiras. “O MEI, como pessoa jurídica, deverá comprovar que possui receita suficiente para justificar essas transações. Caso contrário, poderá ser excluído do regime simplificado do MEI, sendo transferido para o regime tributário normal, o que implica multas, juros e outras sanções”.
Os trabalhadores autônomos e informais também entram no radar, pois suas transações financeiras podem ser interpretadas como rendimentos tributáveis. Para Firmino, esse público será mais impactado pela fiscalização. “Profissionais como manicures, pedreiros, faxineiras e vendedores de alimentos frequentemente movimentam valores superiores à faixa de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física [R$ 2.259,21 mensais], mas não costumam declarar o imposto devido”, atesta.
Com as instituições financeiras reportando essas movimentações, caso os trabalhadores informais não declarem, a Receita Federal terá dados suficientes para cobrar impostos retroativos a 2026 e aplicar multas. O órgão poderá apresentar declarações pré-preenchidas com base nas informações coletadas, obrigando o contribuinte informal a aceitar, ajustar ou justificar.
“Esse novo cenário exige que trabalhadores informais passem a controlar melhor suas receitas e despesas, guardar comprovantes das movimentações financeiras e avaliar a formalização de suas atividades por meio da abertura de um MEI, a fim de evitar problemas futuros com o Fisco”, alerta o contador.
Informações acerca da taxação do Pix são falsas
Nesta sexta-feira (10), a Receita Federal emitiu um alerta sobre uma nova tentativa de golpe que está circulando na web, com criminosos utilizando indevidamente o nome da instituição para dar credibilidade à fraude.
“Atenção! Não existe tributação sobre PIX e nunca vai existir, até porque a Constituição não autoriza imposto sobre movimentação financeira”, começa o comunicado. “A Receita Federal, portanto, não cobra e jamais vai cobrar impostos sobre transações feitas via PIX. O que está ocorrendo é apenas uma atualização no sistema de acompanhamento financeiro para incluir novos meios de pagamento na declaração prestada por instituições financeiras e de pagamento”, explica.
Tirando proveito da desinformação gerada pelas recentes fake news sobre a fiscalização das transações financeiras, os golpistas têm enganado vítimas com falsas promessas de cobranças.
Segundo denúncias, os criminosos informam às vítimas que a Receita Federal está cobrando taxas sobre transações realizadas via PIX que superem o valor de R$ 5 mil. Além disso, eles ameaçam bloquear o CPF do contribuinte caso o pagamento não seja efetuado. Para tornar a fraude ainda mais convincente, os golpistas utilizam os logotipos oficiais, as cores e os símbolos da Receita Federal.
Um exemplo desse tipo de tentativa fraudulenta é uma mensagem que circula nas redes sociais, na qual os criminosos pedem o pagamento de um boleto no valor de R$ 845,20, alegando que esse pagamento impediria o bloqueio do CPF da vítima.
Após a disseminação e conhecimento do golpe, a Secretaria de Comunicação Social do Governo Federal também está desmentindo informações falsas sobre tributos ou taxações em relação ao Pix.
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