Estima-se que a produção do etanol seja 9% maior que na safra passada entre usinas do Norte e Nordeste
Por Patrícia Raposo
Mudanças no cenário global estão levando usineiros pernambucanos a repensar o modelo de negócio. A quebra da safra da cana-de-açúcar na Tailândia em 2020 e atualmente no Centro-Sul do Brasil, a possibilidade de venda direta de álcool aos postos de combustíveis no Brasil e a decisão da Índia de adicionar etanol à gasolina são alguns fatores que estão levando os empresários que tradicionalmente produzem açúcar a pensar em concentrar sua produção no etanol.
“Mas não é uma mudança fácil, já que envolve investimentos no parque fabril e mudança no planejamento tributário”, diz o advogado e consultor para área de energia e agronegócio, Pedro Carvalho, advogado do escritório Carvalho, Machado e TIMM, que tem filial no Recife.
O setor sucroalcooleiro, por lidar com uma commodity, sempre passa por oscilações, mas no momento vive uma boa fase no Brasil em função não só do aumento na produção de cana, mas de uma melhora no seu ATR (qualidade) e do uso de novas tecnologias empregadas no processo produtivo. Em Pernambuco, o etanol anidro está oferecendo uma remuneração 4,6% maior do que o açúcar, o que pode gerar uma safra mais alcooleira. Estima-se que a produção do etanol seja 9% maior que na safra passada entre usinas do Norte e Nordeste.
De acordo com a consultoria Stonex, os contratos futuros de etanol na Bolsa de Chicago indicam que a janela de importação do biocombustível do Nordeste esteja aberta entre novembro e maio de 2022, perspectiva relacionada com a quebra da safra no centro-sul. “O cenário anda tão positivo que 25% de toda safra de cana produzida no Brasil para 2023 já foi comercializada no mercado futuro. Existem usinas em Pernambuco que já negociaram 80% do açúcar e do etanol”, diz o Pedro Carvalho. Conforme seus cálculos, nas próximas cinco ou seis safras, o Brasil deve saltar de uma produção de 600 milhões de toneladas para 750 milhões de cana, num cenário favorável internacionalmente.
Açúcar ou etanol
O cenário é bom para ambos os produtos derivados da cana. “O mercado asiático está crescendo muito. China, Índia e Paquistão ainda consomem menos açúcar que EUA, Brasil e Europa. Há mudança nos hábitos alimentares chineses associadas ao crescimento populacional e melhora da situação econômica, que são benéficas ao açúcar”, analisa, lembrando que a Ásia tem comprado açúcar para estocar.
O etanol também passa por fase positiva. Um bom estímulo vem do governo indiano, que tenta fugir da crise no abastecimento de petróleo adicionando etanol anidro na gasolina. No entanto, muitos empresários brasileiros se animam mesmo é com a possibilidade de venda diretamente para os postos de combustíveis, o que tende a tornar o preço do etanol mais competitivo no Brasil perante a gasolina, ainda mais num cenário de alta, considerando que o barril do petróleo deve bater os 70 dólares e taxa de câmbio é uma incógnita. Com a quebra da exclusividade na bandeira dos postos de combustíveis em discussão no Brasil e já adotada por alguns estados, as usinas eliminam as distribuidoras em boa parte das entregas.
Mas há barreiras a um boom do etanol. Uma delas é a capacidade de tancagem. “Muitos produtores precisam vender de imediato sua produção por falta de local para armazenamento” , explica o advogado, lembrando que no Brasil, a capacidade média de tancagem de 17 milhões de metros cúbicos.
Outro ponto são os investimentos necessário para adaptar a produção. Embora muitas usinas produzam tanto açúcar quanto etanol, para um aumento na produção do álcool se faz necessário mudanças nas instalações da usina.
E ainda há uma grande questão, que são os benefícios tributários para o açúcar, que não são ofertados na mesma escala para o álcool. “Essas barreiras fiscais e operacionais (armazenamento) precisam ser superadas para que o negócio se torne de fato atrativo”, analisa Pedro Carvalho.
A recomendação dele é analisar a fundo o real perfil da usina. “Não adianta forçar a produção para o etanol se a empresa e seus empresários têm perfil açucareiro. Os aspectos empresariais precisam ser analisados, sobretudo os contratos que estão vigentes e precisam ser cumpridos”, alerta.