Eduardo Campos estava eufórico naquela noite de terça-feira, 12 de agosto de 2014. Durante o jantar, começava a retornar as ligações recebidas e não atendidas durante a hora e meia anterior. Todas eram para parabenizá-lo pela entrevista concedida ao Jornal Nacional, da TV Globo. Então candidato à Presidência da República pelo PSB, ele sabia que ali era o palco perfeito para a virada de campanha rumo ao Palácio do Planalto. Mas a celebração foi efêmera.
Doze horas depois, o que era esperança virou tristeza entre os socialistas. O avião Cessna XLS+ no qual Eduardo, quatro assessores e dois pilotos viajavam chocou-se violentamente contra o solo de Santos (SP), após uma arremetida malsucedida. Dez anos depois, para celebrar a vida de Eduardo Campos, o PSB prepara um ano de homenagens ao líder, iniciado no último sábado (10), quando ele completaria 59 anos, se fosse vivo.
Por sete anos (2007-2014), o líder socialista comandou uma gestão positiva em Pernambuco, que o levou quase a ser unanimidade. Antigos adversários tiveram que se render ao Governo de entregas de Eduardo Campos. Poucos se colocavam como oposição a ele, o que os analistas consideravam um suicídio político. O desempenho no comando do Estado criou bases para que ele alçasse um voo audacioso: conquistar a Presidência da República contra Dilma Rousseff do até então aliado PT.
Em 4 de abril de 2014, em uma cerimônia na frente do Palácio do Campo das Princesas, Eduardo renunciou ao cargo, passando o Governo para o vice João Lyra Neto, e deixou o local dirigindo o próprio carro. Nos meses seguintes, começou a construir a sua candidatura ao Palácio do Planalto. Buscando se colocar no meio da polarização entre Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB), conseguiu sair do isolamento político na disputa nacional com a indicação de Marina Silva para a sua vice.
Nos meses que antecederam as convenções e a campanha, procurou dominar os assuntos que estariam na pauta da disputa, como questões econômicas, propostas de inclusão social e investimento em moradia popular. Tinha que estar pronto para os debates e entrevistas que viriam adiante. Coordenador do programa de governo de Eduardo Campos, o ex-deputado federal Maurício Rands lembra que o aliado estava pronto para qualquer desafio. E ele teria que aceitar todos, para se tornar conhecido em todo o País.
Rands lembra que o ponto de virada começou com um debate promovido pela Confederação Nacional das Indústrias (CNI), em 31 de julho, no qual a entidade ouviu os principais candidatos ao Planalto.
“Ali Eduardo começou a se destacar. Falou muito sobre política industrial, segurança… Foi bem melhor do que Dilma (Rousseff) e Aécio. Eduardo estava dominando todos os assuntos, estava preparado para os debates”, relembra Rands.
Ao lado da família
O líder socialista, mesmo em campanha, buscava estar presente na família, que pouco mais de seis meses antes havia aumentado, com o nascimento de Miguel. E foi isso que ele fez no segundo final de semana de agosto de 2014. Voltou para Pernambuco para passar o Dia dos Pais, que, naquele ano, coincidiu com o seu aniversário de 49 anos.
Depois das comemorações, seguiu com esposa Renata e o pequeno Miguel para São Paulo, onde “treinou” para a entrevista à Globo – que ocorreria na terça à noite -, e de lá para o Rio, onde ocorreu a sabatina. Ansioso, Eduardo ligou algumas vezes para Maurício Rands para bater os números e discutir a linha a ser seguida no principal jornal da televisão brasileira.
“Defendi que Eduardo apresentasse metas concretas. No caso da entrevista na Globo, a intenção era apresentar proposta voltada para questão habitacional, de moradia popular”, destacou Rands, acrescentando que todas as vezes que o candidato socialista ligava, ele gelava, pois temia ser convocado para ir ao Rio. Queria ficar em São Paulo, onde teria dois compromissos importantes no dia seguinte.
“Não vamos desistir do Brasil”
Passava das 18h quando Eduardo chegou aos estúdios da Globo. Em poucas horas iria enfrentar a bancada mais temida em períodos eleitorais, com William Bonner e Renata Vasconcellos. Um bom desempenho, significava entrar de vez no jogo. E o socialista jogou no ataque. Com os dados na cabeça, estava preparado até para rebater a questão de interferência para colocar a sua mãe, Ana Arraes, no Tribunal de Contas da União.
Conhecido por ser um bom frasista, Eduardo guardou para o final a frase que ecoou pelo País nas semanas seguintes e se perpetua até o dia de hoje. Nas suas considerações finais, disparou: “Não vamos desistir do Brasil! É aqui onde nós vamos criar nossos filhos, é aqui onde nós temos que criar uma sociedade mais justa”.
Eduardo estava feliz com o resultado da sabatina. Quando retornou a ligação do amigo de longas datas Luciano Vasquez, transbordava otimismo. “Você teve o seu maior comício hoje. Falou para para mais de 30 milhões de pessoas de uma vez só”, brincou Vasquez.
Na conversa, Eduardo falou sobre o compromisso que teria no dia seguinte em Santos. Luciano Vasquez lembra que chegou a sugerir que desistisse de ir, para dar mais atenção à repersussão da entrevista, Mas Eduardo disse que não poderia, porque já havia cancelado outras duas vezes esse compromisso em Santos, marcado por Márcio França, que era o vice na chapa de Geraldo Alckmin.
No dia seguinte, uma quarta-feira, 13 de agosto, na manhã ensolarada do Rio de Janeiro Eduardo já estava no Aeroporto Santos Dumont às 9h20 para decolar para Santos. Como havia uma consulta marcada do pequeno Miguel em Pernambuco, Eduardo pediu que Rodrigo Molina, seu assessor, acompanhasse Renata e o seu filho até o Recife. Chegou-se a informar que os três estavam no voo do socialista.
Diferentemente do Rio, o tempo em Santos estava muito ruim, sem condições visuais de voo. Uma série de fatores levou o piloto a arremeter na tentativa de aterrissar em Santos. No retorno ao ar, o piloto ingressou numa camada de nuvem e sofreu uma desorientação espacial. Quando pensava estar subindo, estava descendo a toda potência.
Poucos minutos antes das 10h, o avião chocou-se contra o solo, provocando a morte de Eduardo Campos, do assessor de imprensa Carlos Percol, do fotógrafo Alexandre Severo, do cinegrafista Marcelo Lyra, do assessor Pedro Valadares e dos pilotos Marcos Martins e Geraldo Magela. Chegava ao fim o mais ousado voo de Eduardo, justamente no dia em que se completava nove anos da morte do seu avô, Miguel Arraes.
Um ano de homenagens a Eduardo
Para celebrar a passagem dos 59 para os 60 anos de Eduardo Campos, o PSB está preparando um ano de homenagens. A primeira ocorreu no último sábado, quando o líder socialista completaria 59 anos, se estivesse vivo. A Executiva Nacional da legenda teve um encontro no Recife para fazer a sua reunião em memória ao ex-governador na cidade e estado onde ele nasceu.
Nesta segunda-feira, por indicação do deputado estadual Diogo Moraes, a Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) realizou uma sessão solene para homenagear o legado do líder socialista. Também na Alepe, o deputado Waldemar Borges (PSB) deu entrade em um projeto, com relatoria do deputado e presidente estadual do PSB, Sileno Guedes, que insere Eduardo Campos no Livro do Panteão dos Heróis e das Heroínas de Pernambuco.
Nesta quarta-feira (14), às 9h, a Câmara dos Deputados vai realizar uma sessão solene em homenagem ao ex-governador. Proposto por Pedro Campos, o evento em Brasília deve reunir familiares de Eduardo Campos, membros do PSB de todo o Brasil e outras autoridades.
A herança de Eduardo Campos
Quatro anos após a morte do ex-governador, o seu filho mais velho entre os homens, João Campos, disputou e conquistou uma vaga para deputado federal, com votação recorde em Pernambuco, com 460.387 mil votos. Dois anos depois, ele partiu para disputar a Prefeitura do Recife, derrotando a prima do seu pai, Marília Arraes, no segundo turno da eleição. João chega a 2024 como franco favorito na disputa pela reeleição. Mas já mira o Palácio do Campo das Princesas, em 2026.
Outro filho do líder socialista, Pedro Campos, foi eleito deputado federal nas eleições de 2022, mas com um número de votos bem inferior ao conquistado pelo irmão: 172.526.
Por enquanto, são eles que vão levar o legado de Eduardo Campos adiante. Sabem que o sarrafo a ser vencido é bem alto, pois além de o líder socialista ter deixado o Governo de Pernambuco muito bem avaliado, morreu de forma trágica, no momento de ascensão na política. Uma história que o coloca num patamar acima de outros líderes políticos.
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