O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, nesta sexta-feira (4), o projeto n° 2308/2023, que cria o marco legal do hidrogênio de baixa emissão de carbono, chamado de hidrogênio verde, que pode alavancar a produção de energia no país a partir de fontes limpas. O ato ocorreu em evento no Porto do Pecém, em São Gonçalo do Amarante, no Ceará.
Ao discursar, Lula ressaltou as potencialidades do Brasil para a transição energética e combate às mudanças climáticas. Ele cobrou novamente que os países mais ricos, que “historicamente” contribuíram mais para o aquecimento global com o uso de combustíveis fósseis e desmatamento, devem arcar com os maiores custos para preservação do meio ambiente.
“Quando eu vejo o pessoal falar de hidrogênio verde, de revolução de energia solar, eólica, biomassa, hidrogênio verde, eu fico pensando qual é o país do mundo que pode competir com o Brasil? Qual é o país do mundo que tem condições de competir com o nosso país nessa questão da transição energética? E nós ainda estamos aprendendo, porque uma das coisas que a gente vai fazer é cobrar do mundo rico que mande o crédito de carbono para nós, porque somos nós que temos floresta para preservar, eles já queimaram a deles, então ajude o que a gente está fazendo sequestrando carbono para o mundo ficar melhor”, disse Lula.
O marco legal do hidrogênio verde institui o sistema brasileiro de certificação do hidrogênio e mecanismos de incentivo para aumentar a atratividade dos projetos para produção de energia. Serão R$ 18 bilhões em incentivos fiscais do governo, em 5 anos, com objetivo de descarbonizar a indústria e os transportes.
Segundo o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, o Brasil tem mais de R$ 200 bilhões em projetos de hidrogênio verde anunciados dentro do Programa Nacional do Hidrogênio (PNH2), do governo federal.
De acordo com o Plano Decenal de Expansão de Energia 2031, elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia, o Brasil tem potencial técnico para produzir 1,8 gigatonelada de hidrogênio por ano, sendo que aproximadamente 90% desse volume com uso de energias renováveis.
“É desenvolvimento tecnológico e industrial na cadeia produtiva do hidrogênio nacional”, disse o ministro Alexandre Silveira. “O senhor, presidente [Lula], torna realidade um projeto histórico, cria uma nova indústria para o Brasil, acende a chama que vai revolucionar a matriz de energia do planeta, fortalece a agricultura nacional, nossa vocação, garante a nossa soberania energética e a nossa segurança alimentar, pois está criando um novo caminho para a produção de amônia, e consequentemente ureia, nossos fertilizantes tão importantes na cadeia da agricultura familiar e do agronegócio nacional”, destacou.
O ministro explicou que a ideia é trazer para o Brasil a tecnologia que associa a indústria de hidrogênio verde à produção de fertilizantes nitrogenados. Os gases nitrogênio e hidrogênio reagem entre si, produzindo amônia. “As plantas de hidrogênio vão fortalecer o setor de fertilizantes e reduzir a nossa dependência de importação”, avalia. “Esse conjunto de políticas vai nos entregar um Brasil mais moderno e consolidar nossa liderança na transição energética global”,acrescentou Alexandre Silveira.
Nitrogênio, fósforo e potássio são largamente usados pelo setor agrícola no país, sendo considerados essenciais para o fornecimento de um ou mais nutrientes para as plantações. O Brasil consome 8% de toda a produção mundial de fertilizantes, avaliada em 55 milhões de toneladas, mas importa 85% do insumo usado pelo agronegócio.
Importância do Nordeste
O Ceará deve se tornar o principal produtor de hidrogênio verde no país, tendo como hub uma usina no Porto do Pecém. No fim do ano passado, a Fortescue, uma das maiores mineradoras do mundo, com sede na Austrália, anunciou investimentos de US$ 5 bilhões em um projeto voltado para a produção de hidrogênio verde no Complexo Industrial e Portuário do Pecém. O projeto tem potencial para produzir 837 toneladas de hidrogênio verde por dia, com o uso de 2.100 megawatts de energia renovável.
Durante o evento, foram assinados documentos ligados à infraestrutura e ao desenvolvimento regional, como a ordem de serviço para o início das obras da Ferrovia Transnordestina, no trecho entre Quixeramobim e Quixadá, no Ceará. A expectativa da concessionária é terminar a obra até 2026, ligando o interior do Piauí aos portos do Pecém, no Ceará, e de Suape, em Pernambuco. O interior do Piauí, junto com as divisas do Maranhão, Tocantins e Bahia, região conhecida como Matopiba, é forte na produção agrícola e será beneficiada com o empreendimento.
O presidente Lula reforçou o seu compromisso com o desenvolvimento do Nordeste. “Quero tornar o Brasil igual, o Nordeste, o Norte do país, o Centro-Oeste ficarem com as mesmas possibilidades dos outros estados, que têm mais tecnologia, que têm mais infraestrutura, que ao longo da vida receberam mais recursos”, disse.
“Muitas vezes, na hora que o governo tem que decidir fazer uma obra, sempre aparece alguém dizendo que custa muito. E por conta desse custa muito, a gente nunca para para pensar o quanto custa não fazer. Quanto que o Nordeste deixou de ganhar de desenvolvimento por conta do atraso de uma ferrovia?”, acrescentou o presidente, lembrando também do projeto da transposição do Rio São Francisco iniciado durante seu primeiro mandato, em 2005.
Lula também assinou uma medida provisória alterando a lei do Programa Nacional de Mobilidade Verde e Inovação (Mover), que visa a descarbonização da frota automotiva do país. O texto trata da importação de peças, visando incremento da eficiência energética, do desenvolvimento estrutural e da disponibilidade de tecnologias assistidas à direção dos veículos comercializados no país.
O presidente também sancionou a lei que autoriza o governo a criar o Fundo de Investimento em Infraestrutura Social (FIIS), por medida institucional, para o Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O objetivo do FIIS é assegurar recursos para o financiamento de empreendimentos em segmentos como saúde, educação e segurança pública.
Por fim, Lula assinou decreto que aprova o regulamento do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), permitindo a adaptação do regulamento a diretrizes do Novo PAC.
Destaques do Marco Legal de Hidrogênio Verde
Outro destaque do marco legal é o Sistema Brasileiro de Certificação de Hidrogênio (SBCH2), que estabelece a estrutura, a governança e as competências, além de certificação voluntária, por intensidade de emissões, com base em análise do ciclo de vida. O PL também apresenta incentivos à pesquisa, desenvolvimento e inovação para produção de hidrogênio e às diversas rotas de produção de forma a estabelecer neutralidade tecnológica.
O PL também define a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) como a reguladora de hidrogênio e estabelece uma intensidade limite de 7kgCO2eq/KgH2. Isso privilegia o uso de fontes de baixa emissão de carbono, como a eólica, a fotovoltaica e o etanol.
A definição do marco legal-regulatório para o hidrogênio era uma das prioridades do Plano Trienal 2023-2025 do Programa Nacional do Hidrogênio (PNH2). O projeto sancionado nesta sexta-feira conta com contribuições resultantes das discussões realizadas pelo Comitê Gestor do Programa Nacional do Hidrogênio (Coges-PNH2), liderado pelo MME, com ampla participação da sociedade.
Hidrogênio verde
Aprovada em julho no Congresso, a nova legislação estabelece diretrizes para a produção, transporte e uso do hidrogênio verde e, ainda, institui uma certificação voluntária e incentivos federais tributários para essa indústria. Por 5 anos, a partir de 1º de janeiro de 2025, o governo vai suspender a incidência do PIS/Pasep e da Cofins, inclusive na compra ou importação de máquinas, instrumentos e materiais de construção destinados a projetos de hidrogênio verde. O benefício poderá ser usado ainda para os bens alugados.
O hidrogênio é um gás combustível inflamável que ganhou maior interesse em razão do risco de segurança energética pelo qual passou o continente europeu no cenário da guerra da Rússia na Ucrânia, uma vez que boa parte dos países da Europa depende do gás exportado pela Rússia. A produção de hidrogênio requer o uso de muita energia, em especial para retirar, por hidrólise, o hidrogênio que é encontrado na água.
Para ter o selo verde, é fundamental que o hidrogênio seja produzido e transportado sem o uso de combustíveis fósseis ou de outros processos prejudiciais ao meio ambiente. Por isso, é considerado o combustível do futuro.
A denominação hidrogênio verde ocorre quando a eletricidade usada na eletrólise da água vem de fontes de energia renováveis como eólica, fotovoltaica e hidrelétrica. O hidrogênio verde pode ser gerado a partir da produção de biocombustíveis, como etanol ou biomassas (resíduos agrícolas ou florestais); de fontes renováveis (eólica, solar fotovoltaica e hidráulica); de energia nuclear; do sequestro e uso de carbono, pela retirada de gás carbônico da atmosfera para ser transformado em oxigênio; da extração do solo; entre outros.
Infraestrutura de ponta para H2V
O Complexo do Pecém é composto por três grandes frentes: a Área Industrial, que abriga algumas das principais unidades fabris do Nordeste brasileiro; o Porto do Pecém, um terminal offshore de classe mundial; e a Zona de Processamento de Exportação ( ZPE) Ceará, a primeira a operar no Brasil, que possui uma nova área de mais de 1.900 hectares para receber novos investimentos. É nessa área que serão instaladas as empresas que produzirão H2V no Pecém.
Atualmente, o complexo conta com seis pré-contratos assinados, somando cerca de US$ 8 bilhões em investimentos até 2030. Isso deve duplicar a quantidade de empregos diretos e indiretos na região, que atualmente é de 80 mil.
Para receber as empresas que produzirão hidrogênio verde no Pecém, a estrutura do Complexo e do Porto será modernizada. Para isso, será criado um corredor de utilidades por onde circularão os dutos de amônia, gás natural, hidrogênio, água e a rede de energia elétrica. O píer 2 e o terminal de múltiplas utilidades devem passar por adaptações para a operação de amônia e outros derivados do hidrogênio verde.
“Nesse processo de instalação do hub de H2V, estamos nos preparando para produzir e exportar o hidrogênio, enquanto o Porto de Roterdã se prepara para receber e distribuir pelo mercado europeu”, destaca o presidente do Complexo do Pecém, Hugo Figueirêdo. O Porto do Pecém e o Porto de Roterdã constituirão a rota de exportação/importação de H2V mais próxima entre a América do Sul e a Europa.
Cenário do H2V no Brasil
Atualmente, já foram anunciados 57 Gigawatts (GW) em projetos no país, considerando todos os níveis de maturidade. Essas iniciativas estão sendo estudadas em todo o Brasil, com destaque para os estados da Bahia, Ceará, Piauí, Pernambuco e Rio Grande do Norte.
Os projetos de hidrogênio já protocolados no MME, ou seja, que estão em estágios mais avançados, somam R$ 212 bilhões em investimentos. Maioria está nos estados do Ceará e Piauí.
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