A notícia de que uma usina eólica seria construída no Sertão de Alagoas, na cidade de Mata Grande, vem recebendo diversas críticas por parte de ambientalistas e representantes de comunidades que moram ao redor do local onde poderá ser erguida o conjunto de torres. O Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA) promoveu uma audiência pública esta semana e está analisando o processo de licença prévia para instalação do parque eólico.
O projeto da empresa Casa dos Ventos pretende instalar um Complexo Eólico na zona rural de Mata Grande e será composto por 40 aerogeradores com potência de 264 megawatts (mW).
Antes da realização da audiência pública, ocorrida na última quarta-feira (20), ambientalistas e representantes de comunidades tradicionais chegaram a realizar um abaixo-assinado para tentar cancelar a audiência pública apontando que houve falhas no processo de licenciamento da usina eólica. Eles afirmam que a consulta a povos indígenas e comunidades quilombolas foi realizada pela empresa contratada pela Casa dos Ventos para realizar o estudo de impacto ambiental e que esta etapa deveria ter sido realizada pelo governo de Alagoas, por meio do IMA.
Para João Paulo Diogo, coordenador do Coletivo de Assessoria Cirandas, pelo fato de a aplicação desse artigo da Convenção 169 da OIT ser uma responsabilidade do Estado, a iniciativa de uma empresa, por mais bem-intencionada que seja, não pode ser considerada como uma realização válida da Consulta Prévia, Livre e Informada.
Ele lembra que o Ministério Público Federal também considera uma obrigação do Estado brasileiro “consultar, de forma adequada e respeitosa, os povos indígenas e comunidades tradicionais sobre decisões administrativas e legislativas que possam afetar suas vidas e seus direitos”.
“Trata-se de um direito dessas populações de serem consultadas e participarem das decisões do Estado por meio de um diálogo intercultural marcado pela boa fé”, afirma João Paulo.
Diogo ainda disse que a reunião com representantes dos indígenas e remanescentes de quilombos ocorreu em janeiro do ano passado em Poço Dantas (no município de Inajá, em Pernambuco), uma das três comunidades quilombolas existentes na região, mas sem a presença de representantes do IMA.
A integrante da Associação de Mulheres Rurais do Semiárido Alagoano e do Território Alto Sertão de Alagoas, Maria Ângela Nascimento dos Santos, disse que as pessoas da região não têm ideia do que acontecerá depois que as torres eólicas forem instaladas. “A empresa fala em arrendar as terras, mas não detalha os impactos na saúde das pessoas, nem no meio ambiente, que são coisas comprovadas em outros estados do Nordeste em que a energia eólica já entrou.”
Já a professora da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) Flavia Moura questiona as informações do relatório de impacto ambiental em relação à biodiversidade da região. Ela diz que a quantidade de espécies citada é inferior à existente. “Há pelo menos o dobro de espécies de plantas na área. Levando em consideração que é uma região ainda pouco estudada, esse número aumentaria se houvesse um levantamento mais detalhado”, avalia a pesquisadora.
“Há ainda espécies ameaçadas que não foram citadas. Pelo menos uma planta e duas aves”, afirma Flavia Moura. “São aves do dossel, a parte mais alta da vegetação, por isso são animais que dependem mais da mata.”
IMA não vê irregularidades no processo de instalação de parque eólico
O diretor executivo do IMA, Ives Leão, disse ao Movimento Econômico que o instituto não constatou irregularidades até o momento no processo de licenciamento da Casa dos Ventos.
Ele disse que as consultas a populações próximas a empreendimentos não são uma atribuição do IMA e que cabe ao empreendedor entrar em contato com os órgãos responsáveis pelas comunidades para realizar o procedimento. “Soubemos aqui que não houve retorno desses órgãos e nós iremos oficiar a Secretaria da Mulher e dos Direitos Humanos de Alagoas que cuida dessas comunidades para ciência deles e comunicação com os órgãos competentes”, explicou.
Ivens disse também que essas consultas às comunidades podem ser realizadas em diversas etapas de licença prévia, de instalação e operação. “Não vejo irregularidade nenhuma no processo, até porque ele está no início. A gente ainda não analisou por completo para poder gerar as intimações e os documentos que são necessários, então caso algum ponto precise ser esclarecido, faremos essa intimação”, assegurou.
Audiência pública debateu usina eólica
Durante a audiência pública, representantes da Casa dos Ventos, Instituto do Meio Ambiente de Alagoas, Prefeitura de Mata Grande, pesquisadores e moradores da cidade conheceram o projeto, viram o Relatório de Impacto Ambiental e sugeriram propostas para que o ecossistema local e as comunidades vizinhas não sejam afetadas.
O diretor executivo do IMA, disse que irá se reunir com pesquisadores e especialistas para aprofundar o debate sobre o estudo realizado até o momento.
João Vidal, diretor de Meio Ambiente da Casa dos Ventos apresentou o projeto da empresa e destacou medidas para mitigar impactos tanto na preservação de animais quanto da vegetação local. “A promoção das medidas e projetos aqui propostas, apesar de estarem diretamente relacionadas aos impactos causados, nós também promovemos o resgate e conservação da biodiversidade”, disse.
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