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José Carlos Cavalcanti: Inflação é um fenômeno monetário ou fiscal? Ambos, mas não somente!

Se você compra um título de um ano, você dá ao governo R$ 1,00 hoje, e o governo lhe dará R$ 1,00 mais juros, por exemplo, R$ 1,05, em um ano.  Logo, o governo deve imprimir dinheiro para resgatar títulos a vencer, o qual pressiona a inflação. 
José Carlos Cavalcanti
José Carlos Cavalcanti

Por José Carlos Cavalcanti*

“Inflação é sempre e em qualquer lugar um fenômeno monetário” – Milton Friedman

“Inflação persistente é sempre e em qualquer lugar um fenômeno fiscal” – Thomas Sargent

A Teoria Monetária em Economia tem consistido em várias escolas de pensamento, mais do que um simples modelo unificado.  Cada uma dessas escolas enfatiza diferentes forças que guiam questões de natureza econômica, como por exemplo o fenômeno da inflação, e recomenda uma resposta de política distinta.

No século passado duas derivações conceituais dessas escolas ganharam proeminência: a) uma protagonizada pelo Professor Milton Friedman (Prêmio Nobel de Economia de 1976), cuja obra passou a ser associada à frase acima; e b) e outra destacada pelo Professor Thomas J. Sargent (Prêmio Nobel de Economia de 2011), que passou a ser lembrado por trabalhos relacionados com a frase acima referida.

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A partir do final do século 20, e mais especificamente, depois da Grande Crise Financeira de 2008, a Teoria Econômica evoluiu para considerar as interações entre a política monetária e a política fiscal, dando surgimento às hoje conhecidas políticas macro prudenciais. Tal evolução não tem sido simples, e mais recentemente se constata, com mais contundência, a necessidade de incorporar políticas inovadoras de estabilidade financeira.

No território das políticas monetária e fiscal, os economistas as classificam como ativas e passivas. Se o Banco Central aumenta a taxa de juros mais do que um-para-um em resposta à taxa de inflação, a política monetária é dita ser ativa. Se o Banco Central aumenta a taxa de juros menos de um-para-um em resposta à taxa de inflação, a política monetária é dita ser passiva.  Se a autoridade fiscal (Governo) toma emprestado para financiar um arbitrário curso de gastos e impostos, a política fiscal é dita ser ativa. Se a autoridade fiscal ajusta seus gastos e as taxas de impostos para assegurar solvência fiscal para todos os cursos possíveis da taxa real de juros, a política fiscal é dita ser passiva.

Numa das escolas de pensamento da Economia, a unicidade do equilíbrio econômico requer, de um lado, que a política monetária seja ativa e a política fiscal seja passiva, ou, por outro lado, que a política monetária seja passiva e a política fiscal seja ativa.  O fato de que uma política monetária passiva seja combinada com uma política fiscal ativa, levando a um único nível de preço, é referido hoje como a “Fiscal Theory of Price Level” (FTPL), ou seja, a Teoria Fiscal do Nível de Preço.

Depois da crise financeira global de 2008, o Federal Reserve System dos EUA, o Banco Central Europeu e o Banco da Inglaterra mantiveram políticas de taxas de juros passivas atreladas a uma taxa nominal de juros constante por mais de uma década.  Quando o Banco Central atrela a taxa de juros, a teoria econômica padrão prevê que o nível de preço é indeterminado.  Advogados da FTPL defendem que o nível de preço é, no entanto, unicamente determinado mesmo quando a taxa de juros é atrelada.  O argumento deles repousa numa reinterpretação da equação de acumulação de dívida pelo governo, a qual é vista não mais como uma “restrição orçamentária”, mas sim como uma “equação de valoração de dívida”.

Como defendido pelo Prof. John H. Cochrane, autor do recente livro intitulado “The Fiscal Theory of Price Level”, a FTPL expressa que a inflação se ajusta de forma que o valor real da dívida do governo equivale ao valor presente dos superávits primários. Para ele a lógica econômica é a mesma que o modo básico como pensamos preços de ações e de títulos.  O preço da ação ou do título se ajusta de modo que o valor da ação ou do título é igual ao valor presente descontado esperado dos dividendos ou cupons.  Títulos de governo, segundo ele, repagos por superávits, são efetivamente investidos no governo.

A mecânica é explicada pelo Prof. Cochrane da seguinte forma.  Primeiro, o governo também gasta e transfere dinheiro para as pessoas.  Logo, o dinheiro é absorvido pelos superávits do governo, i.e., o excesso de impostos sobre gastos, e não somente por impostos. Em segundo lugar, os governos também vendem títulos.  Se você compra um título de um ano, você dá ao governo R$ 1,00 hoje, e o governo lhe dará R$ 1,00 mais juros, por exemplo, R$ 1,05, em um ano.  Logo, o governo deve imprimir dinheiro para resgatar títulos a vencer, o qual pressiona a inflação. 

O governo pode produzir déficits, um superávit negativo, ao vender títulos. Mas o governo não pode manter a rolagem da dívida para sempre, emitindo novos títulos para pagar títulos velhos.  Eventualmente, todo o dinheiro pendente hoje e todo o dinheiro prometido por dívida pendente de governo deve ser absorvido pelos superávits.  Assim, os preços de ajustam até que o valor real de toda a dívida de governo, incluindo dinheiro, equalize o valor presente dos superávits presentes e futuros.

Pode parecer complicado, mas o que nos interessa mostrar, de forma breve, é que não estamos mais em um mundo onde se escolhia uma política macroeconômica em detrimento de outra (política monetária ou fiscal).  Hoje sabemos que há interações complexas entre estas duas políticas que precisam ser mais compreendidas, incorporando novas interações, como aquelas que dizem respeito à arquitetura do sistema financeiro. E em relação a estas últimas, precisamos também compreender como incorporar as noções de finanças corporativas às práticas das políticas de governo, tais como as indicadas pela nova FTPL.

Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre políticas macroeconômicas contemporâneas, não hesite em nos contatar!

(A figura da newsletter foi gerada a partir do Dall-E 2, um sistema de IA que cria imagens realistas e arte a partir de uma descrição de linguagem natural)

*José Carlos Cavalcanti é economista e professor na Universidade Federal de Pernambuco

** Os artigos não expressam necessariamente a opinião do Movimento Econômico

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