Por João Badari*
Nas eleições de 2022 as questões previdenciárias estão sendo pouco debatidas e raros são os projetos para um tema tão relevante, que impacta a vida de mais de 36 milhões de brasileiros. A Reforma da Previdência foi muito debatida no ano de 2018, porém após sua aprovação as questões dos aposentados estão sendo deixadas de lado. E isso ficou ainda mais claro nas campanhas presidenciais.
A Reforma, trazida pela Emenda 103 de 12 de novembro de 2019, trouxe novas regras para o acesso aos benefícios do INSS e também aos critérios de cálculo. O Ex-presidente Lula defendeu que irá rever questões que foram trazidas pelo novo texto legislativo e possuem questões constitucionais tratadas pelo Supremo Tribunal Federal.
As duas principais questões sobre os cálculos de benefícios que estão sendo questionados no Judiciário são os da pensão por morte e a da aposentadoria por invalidez (hoje chamada de “aposentadoria por incapacidade permanente”). Estes dois benefícios passaram por severos redutores em seus cálculos, onde a pensão por morte chega a ser 60% menor do que a prevista pela legislação revogada, com a aplicação de até 4 redutores em seu valor inicial. A aposentadoria por invalidez, que era integral, passou a ser iniciada em 60%, só aumentando após o 16º ano de trabalho para mulheres e o 20º ano para os homens.
Tal modificação se mostrou um grande retrocesso social, além de ferir princípios constitucionais, e o Judiciário já possui decisões favoráveis aos aposentados e pensionistas em ambos os temas. A candidata Simone Tebet entende tal redução como acertada, afirmando que ela se aplica a um pequeno número de benefícios, maiores que 1,6 salários mínimos. Esta afirmação não corresponde a realidade, pois de forma prática a diminuição do valor se aplica a todos os casos que sejam superiores a um salário mínimo. Isso se mostra total desconhecimento da matéria tratada.
Outro tema tratado pelo Ex-presidente Lula é o reajuste do salário mínimo acima da inflação, onde seria aplicada a inflação do ano anterior mais o aumento do PIB de dois anos antes. Isso impacta diretamente nos cofres do INSS e assistenciais, pois aumentaria os gastos dos benefícios de prestação continuada e a elevação do piso para aposentadorias, pensões e benefícios por incapacidade.
O candidato Ciro Gomes também se manifestou favorável a reajustes progressivos e acima da inflação com relação ao salário mínimo. Porém, condicionou este tema aos resultados obtidos em reformas fiscais, tributárias e previdenciárias. Sim, ele pretende fazer uma nova reforma previdenciária, incluindo no sistema atual o sistema de capitalização (que não deu certo no Chile e hoje a população colhe os péssimos frutos trazidos).
O aumento do mínimo acima da inflação é um tema complexo, pois deve ser primeiro analisado todo impacto atuarial da decisão, onde este aumento de custo poderia ruir os cofres da autarquia previdenciária, que hoje estão controlados e estáveis para os próximos anos.
Ciro Gomes também defende um tempo menor de contribuição para as mulheres, em razão da dupla jornada laboral (trabalho doméstico somado ao trabalho fora de casa) e a diferenciação por meio de características especiais de cada profissão para antecipar e aumentar o valor das aposentadorias. Ocorre que estes dois temas já estão em prática hoje, onde a mulher se aposenta com redução na idade mínima e existe a possibilidade da aposentadoria especial dependendo da profissão e atividade exercida. Ambos os temas são relevantes, porém precisam de maior profundidade, principalmente sobre os critérios adotados nas concessões.
O presidente Jair Bolsonaro, responsável pelo ajuste trazido pela reforma previdenciária aprovada em seu governo, não trouxe grandes propostas com relação ao direito dos aposentados e pensionistas, apenas considerações sobre o aperfeiçoamento dos atendimentos remotos do INSS. O “Meu INSS” passou por diversas melhorias durante a pandemia, fruto de investimentos tecnológicos do governo, que possibilitaram o cidadão requerer seu benefício sem precisar se locomover a agência. Esperamos que a política de investimentos tecnológicos seja mantida, pois o INSS avançou sensivelmente nos últimos dois anos com relação ao atendimento remoto e pedidos de benefícios de forma digital.
A candidata Simone Tebet, favorável a reforma da previdência, propõe reduzir a contribuição previdenciária para a faixa de um salário mínimo, estimulando a formalização. Ocorre que em um sistema de repartição (como o nosso), para alguém a conta irá sobrar. Será necessário que a empresa ou o governo passem a custear os benefícios, ou todos os trabalhadores que optarem por recolhem sobre um salário mínimo terão uma aposentadoria neste valor, que não custeará os seus gastos na velhice.
A candidata se mostrou favorável a utilização de uma idade mínima na aposentadoria especial, o que entendemos ser mais um retrocesso social, pois muitos trabalhadores que iniciaram sua vida laboral na juventude, deverão trabalhar com insalubridade na velhice para assim conseguir se aposentar. Teremos uma geração de idosos com problemas de saúde em razão do extenuante trabalho exercido. O ex-presidente Lula foi favorável a rever o texto, e não incluir a idade mínima na aposentadoria especial.
E por final, a candidata Soraya Thronicke promete isenção de pagamento do INSS para quem recebe até cinco salários mínimos. Tal proposta se assemelha a da candidata Tebet, e o problema é quem irá custear os benefícios a serem pagos. Mesmo com o custeio realizado por segurados, empregadores e o Estado já precisamos de uma reforma previdenciária, que garantisse a estabilidade do sistema, imagine sem a contribuição de quem recebe até cinco salários mínimos? Hoje essa faixa de contribuinte mantém o sistema. Uma manobra, no mínimo, utópica.
As campanhas presidenciais ainda não terminaram e seria interessante para os cidadãos que os candidatos debatessem mais este tema. As propostas de mudanças na emenda aprovada em 2019 precisam ser mais objetivas, pois assim poderemos avaliar quais os ônus e bônus das revisões a serem buscadas. Observamos que foram traçadas apenas retóricas populistas, com anseio nos votos, mas a realidade da Previdência no Brasil exige e merece um estudo sério e aprofundado.
E mais, não podemos olhar apenas para a frente nas questões previdenciárias e superarmos quem já está recebendo o benefício do INSS, sendo importante também conhecermos as propostas para os aposentados e pensionistas. O que será que os candidatos pensam sobre temas sensíveis, dentre eles os projetos de lei para a desaposentação e o 14º salário, além da revisão da vida toda que está sendo discutida no STF e as questões que possuem discussão de legalidade trazidas pela Reforma da Previdência?.
*João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados