
Profissionais com até duas formações superiores diferentes receberam, na tarde desta quinta-feira (17), um diploma de participação em um curso de seis semanas de duração que foi tratado como um troféu e um passaporte para uma nova etapa no ecossistema de tecnologia e inovação. A cerimônia, realizada no oitavo andar da sede do Porto Digital, no Bairro do Recife, marcou a conclusão da primeira formação da Specialisterne no Nordeste.
Sete homens e cinco mulheres, com idades entre 23 e 37 anos, foram os primeiros capacitados em Pernambuco pela Specialisterne Brasil, empresa especializada na inclusão de pessoas autistas no mercado de trabalho. A diversidade do grupo se reflete nas áreas de formação: ciência de dados, letras (inglês), análise e desenvolvimento de sistemas, fotografia, engenharia mecânica, comunicação social, história, medicina veterinária, jornalismo e sistemas para internet.
Toda a capacitação foi oferecida gratuitamente aos alunos. A Specialisterne mantém um banco de talentos com cerca de 30 outros inscritos para futuras oportunidades e busca parceiros para viabilizar financeiramente a continuidade dos cursos.
Sonhos renovados no Porto Digital
Amélia César, 33 anos, formada em Ciências Biológicas e atualmente cursando Enfermagem, recebeu seu diploma com entusiasmo e esperança. “Já conhecia o trabalho da Specialisterne e não poderia perder esta chance. Gostei da área de TI. Se eu não ingressar totalmente, pelo menos tento incorporar o que aprendi às minhas áreas de formação”, afirmou, destacando a preocupação da instituição em criar um ambiente adaptado às necessidades dos autistas.
Outro participante, Bruno Monlevade, também de 33 anos, professor de idiomas e tradutor, viu na formação a chance de se reinserir na área de tecnologia. “Já tinha interesse e vi nesta formação uma oportunidade para abrir novos caminhos profissionais”, declarou.
Durante a entrega dos diplomas, em breves falas espontâneas, outros participantes — cujos sobrenomes foram preservados por respeito à privacidade — também expressaram suas emoções. Gabriela destacou: “Todos foram muito gentis. Quando tive uma crise de ansiedade, fui acolhida. Estou muito feliz por ter feito parte.” Renato falou sobre o fortalecimento da autoestima: “Antes, eu achava que ninguém me aceitaria no mercado. Agora vejo que posso contribuir, que há espaço para mim.” Rebeca celebrou o sentimento de pertencimento: “Eu me sentia sozinha, como se só eu fosse diferente. Aqui vi que há muitas pessoas como eu, com sonhos e capacidades.” Jamerson resumiu o espírito da turma: “Hoje é um dia muito especial. Me sinto mais preparado para o futuro.”
Formação técnica e humana
De acordo com Marcelo Franco, diretor de operações do Nordeste da Specialisterne Brasil, o perfil dos formandos combina qualificação técnica e disposição para enfrentar os desafios do mercado. “Estamos celebrando uma conquista importante, não apenas da Specialisterne ao chegar ao Nordeste, mas principalmente das pessoas autistas que finalizaram essa formação. Esses jovens estão absolutamente aptos a atuarem em empresas de tecnologia. O trabalho da Specialisterne é formar, mas também tornar visíveis talentos que, muitas vezes, são invisibilizados pelo mercado”, afirmou.
Franco lembrou que mais de 80% das pessoas autistas estão fora do mercado de trabalho, mesmo sendo plenamente capazes. “Além de desenvolver habilidades para lidar com colegas, demandas de trabalho, conflitos e lideranças, nós buscamos mostrar ao mercado o potencial do talento na neurodiversidade”, disse.
Empresas abrem as portas para autistas
O esforço começa a dar frutos. Empresas do Porto Digital como Pitang, CESAR e Neurotech já encaminharam propostas para receber profissionais neurodivergentes formados pela Specialisterne.
“Recife é estratégico para a expansão do projeto no Brasil”, disse Marcelo Severiano, diretor da Specialisterne Brasil. “Hoje, cerca de 85% das pessoas autistas que poderiam trabalhar estão desempregadas. Recife, sendo um dos maiores polos de tecnologia do Brasil, pode se beneficiar enormemente do talento neurodivergente, impulsionando não apenas resultados de negócios, mas também uma cultura mais humana e inclusiva nas empresas.”
Infraestrutura para a diversidade
A diretora executiva do Porto Digital, Mariana Pincovsky, ressaltou que o apoio à Specialisterne reforça a estratégia de diversidade do parque tecnológico. “Eles trouxeram todo o know-how de atuação com pessoas com neurodivergência, e nós entramos com a infraestrutura e o ambiente de inovação para apoiar esse programa que consideramos fundamental para o futuro das nossas equipes.”
De acordo com Marcelo Severiano, a meta é realizar novas turmas no Recife e também levar esta capacitação para outras capitais nordestinas, como Fortaleza.
Sobre a Specialisterne
Criada há 20 anos na Dinamarca, a Specialisterne está presente em 26 países e já capacitou e inseriu mais de 10 mil pessoas no mercado de trabalho, sempre defendendo a neurodiversidade como um ativo para inovação, produtividade e transformação dos ambientes empresariais. No Brasil, já foram mais de 500 pessoas encaminhadas, com taxa de retenção próxima de 90%.
O curso no Recife focou não apenas em competências técnicas, mas também em aspectos comportamentais e sociais necessários para a adaptação ao ambiente corporativo, preparando os formandos para enfrentarem desafios profissionais com autonomia e segurança.
Leia mais: Confira os livros que moldaram líderes empresariais